sábado, 18 de maio de 2019

História e Conhecimento

Por: António Orlando dos Santos 
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")

A decifração e entendimento dos enigmas históricos foi sempre algo que me ocupou a imaginação pois desde miúdo sempre tive alguma curiosidade em entender como, distantes nos séculos, houve sempre gente capaz de decifrar como, porquê e por quem haviam sido construídos, castelos, conventos, igrejas e até pontes e portos de mar.


Era objecto do meu fascínio tudo o que se pode ver dentro de igrejas, que possuindo uma semelhança evidente eram no entanto diferentes entre si e, soube-o já bastante mais tarde que os experts sabiam designar o estilo e por este determinar a era em que os vário edifícios haviam sido construídos.
Parece-me que no concernente às igrejas o mais antigo será o Românico e ao qual se foram sucedendo outros até às construções nossas contemporâneas que não tendo ainda um estilo definido se nos apresentam num modo mais liberto do pesado floreado que recoberto a ouro, denotava um ar de coisa rica ao cenário magnífico dos altares do Barroco português que, ironia do destino, tem na cidade brasileira da Baía de Todos os Santos o esplendor da arte dos entalhadores minhotos, que criaram e produziram autênticas maravilhas no país do jacarandá.
Sendo certo que em Bragança não há uma única Igreja que em esplendor se possa comparar com outras, bastantes, que se encontram espalhadas por todo o território metropolitano e também no que foi o nosso território ultramarino, possui algumas que não sendo obras monumentais, contêm elementos dignos de referência quando entendidos e descritos por gente que sabe de arte sacra e de história do Reino e muito mais.
Ora, para alguém como eu, que sou um leigo em tais cavalarias, sempre que encontro um texto sobre este tema à mão de semear, em vez de fazer a sementeira faço a colheita, pois o meu tempo vai encurtando e se quero saber como e porquê, aproveito a sapiência de quem sabe do assunto mais do que as chamadas vedetas que às vezes anunciadas pelas trombetas da fama nos dizem pouco ou coisa nenhuma.
Assim tendo sido até há uns poucos anos atrás, aconteceu que eu tivesse comprado uma obra em dois volumes escrita e dada ao prelo pelo Bragançano Dr. Luís Alexandre Rodrigues meu conterrâneo e amigo de longa data. Sublinho que a nossa amizade era baseada muito no facto das nossas famílias terem uma relação de amizade antiga. Mas, dado que eu estive emigrado em Inglaterra quase trinta anos, a carreira do Alexandre que eu sempre associei à baliza do G D B, no Velho Campo do Toural, passou-me quase despercebida por ausência minha e mutismo dos meus pares que não me deram novas dele até à leitura que fiz aos dois volumes da pequena obra prima que tem o título de Bragança no Século XVIII. Sem procurar decifrar mais do que a curiosidade, moderada activada por algo, misto de ignorância e superficial saber decorrente do meu palmilhar as ruas da cidade milhentas vezes, quando garoto, comecei a leitura e na terceira página já tinha a certeza que mesmo que nada encontrasse de substantivo estava a manusear o livro que me dava o prazer indescritível de ler as frases mais bem escritas em português nos últimos trinta anos.
Só o Padre António Vieira nos Sermões, o Cónego Abílio Miguel nos Editoriais que escreveu para O Mensageiro de Bragança e o Dr. Vaz Pires que foi Director Escolar, quando escrevia para o dito Mensageiro artigos dignos de serem compilados e publicados em livro, me deram igual prazer de ler português de altíssima qualidade.
Bom, passemos adiante e não será redundante dizer que me tornei um admirador do Dr. Alexandre e que logo que me foi possível fui ouvi-lo falar de História ao Arquivo Distrital na comemoração do 1º centenário desta Instituição, no Convento de S. Francisco. Estava assim ultrapassado o meu desconhecimento imperdoável desta brigantina figura. Há na escrita deste autor um ritmo cadenciado e melódico que pode iniciar-se em "Adágio" mas que subtilmente vai decorrendo suave, descrevendo realidades e fantasias em ritmo de "Moderato" para em registo de "Allegro ma non troppo" nos transportar para o espaço etéreo e de seguida nos fazer regressar à terra, com um ritmo "Alla Marcia" que se deterá num ponto final galante e triunfador, como uma "Marcia Triunfalle". Será esta a forma comparativa que o meu fraco conhecimento de línguas, incluindo a musical me permite. Prosa clara que descreve, trabalho, compromisso, arte, sentimento, cobiça, prestígio, ambição e até honra e desonra com a fluidez das águas correntes dos rios e regatos desta terra transmontana que alguém definiu como Reino Maravilhoso. 
A minha admiração por este autor que me parece não estar a ser apreciado devidamente, quiçá , por intenções menos nobres da crítica regional , e, até nacional numa atitude acrítica para assim não suscitar elogios merecidos que as invejas,  já mencionadas por Camões, continuam qual atavismo deplorável a fazer parte do nosso A D N, dizia eu, a minha admiração foi crescendo com as leituras feitas aos seus escritos que recomendo a todos os que gostam de ler português de lei.
Terminarei este meu apontamento que é quase uma confissão que se tornou para mim uma necessidade fazer, mesmo que sem ter implícita a obrigação da recitação do Ato de Contrição que a Menina Maria dos Prazeres (Chavasca) me ensinou quando me deu lições de Catecismo na Sé onde paroquiava o Senhor Cónego Ruivo. Daqui se infere que em Bragança e na senda de gente da estaleca do Abade de Baçal e muitos homens menos conhecidos, mas, dignos de menção por se proporem a tarefas que dignificam as letras nacionais, há homens e mulheres que sabem usar a pena para com a clareza como a de um dia de sol que se destaca no firmamento limpo e brilhante deste céu Bragançano, nos dão notícia das suas investigações e no-las transmitem para memória futura. Cabe aqui citar o Poeta que escreveu o verso que diz: -Ditosa Pátria que tal filho teve! (Camões-Os Lusíadas-Canto VIII.)

Obrigado Alexandre!





Londres, 16/05/2019
A. O. dos Santos
(Bombadas)

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