quinta-feira, 23 de março de 2023

Uma bondade (quase) perfeita

Por: José Mário Leite
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)

Em 2016 o escritor transmontano, Ernesto José Rodrigues editava na Gradiva mais um romance que, com o título “Uma Bondade Perfeita”, haveria de vir a receber, em 2017, o Prémio Narrativa do PEN Clube Português. No último dia de março de 2016, na vetusta livraria Ferin, no Chiado, o autor, como é seu costume, apresentou a obra, na primeira pessoa, onde discorre sobre a dramática história de refugiados entre os quais surge Ágata a quem confere a capacidade de atingir os cimos da bondade citando Séneca: «Sabes o que eu chamo ser bom: ser de uma bondade perfeita, absoluta, tal que nenhuma violência ou imposição nos possa forçar a ser maus.»
A Bondade Perfeita existe, portanto, nas palavras do filósofo romano e na criatividade literária do autor de Torre de Dona Chama mas, em meu entender, modesto, quiçá, realista, não é verificável na prática. Não conheço ninguém que, em concreto, tenha atingido esse estado ideal, embora saiba de várias pessoas que muito dele se aproximam. Pese embora a suspeição que sobre mim caia, por causa dos laços familiares, não posso deixar de incluir nesse pequeno e restrito grupo o, recentemente falecido, padre Joaquim da Assunção Leite, meu tio.
Foi, tanto quanto me recordo e me testemunham tantos quantos com ele conviveram, um homem bom, procurando sê-lo sempre, de forma singular e solidária.
A sua vida ficou marcada pela entrega, de corpo e alma, à missão de contribuir para a melhoria material e espiritual de todas as comunidades por onde passou, desde a remota aldeia da Lousa, Torre de Moncorvo, onde começou a atividade pastoral, passando pelos agrestes campos de guerra, em Angola, pelos bairros desfavorecidos dos arredores de Lisboa, pelo apoio à comunidade lusitana emigrada em Paris, com passagem pela formação espiritual de jovens seminaristas em Bragança e terminando no lugar onde tudo começou, Vila Flor em dedicada atividade pastoral, auxiliando o novo bispo auxiliar de Braga, D. Delfim Gomes.
Na hora da despedida muitos foram os paroquianos que, em última homenagem, vinham testemunhar o seu espírito missionário e de serviço comunitário, lembrando, os mais idosos, o tempo ido de há várias décadas onde igualmente servia quem o procurava, por trás do balcão do comércio do senhor Taninho.

José Mário Leite
, Nasceu na Junqueira da Vilariça, Torre de Moncorvo, estudou em Bragança e no Porto e casou em Brunhoso, Mogadouro.
Colaborador regular de jornais e revistas do nordeste, (Voz do Nordeste, Mensageiro de Bragança, MAS, Nordeste e CEPIHS) publicou Cravo na Boca (Teatro), Pedra Flor (Poesia) e A Morte de Germano Trancoso (Romance), Canto d'Encantos (Contos) tendo sido coautor nas seguintes antologias; Terra de Duas Línguas I e II; 40 Poetas Transmontanos de Hoje; Liderança, Desenvolvimento Empresarial; Gestão de Talentos (a editar brevemente).
Foi Administrador Delegado da Associação de Municípios da Terra Quente Transmontana, vereador na Câmara e Presidente da Assembleia Municipal de Torre de Moncorvo.
Foi vice-presidente da Academia de Letras de Trás-os-Montes.
É Diretor-Adjunto na Fundação Calouste Gulbenkian, Gestor de Ciência e Consultor do Conselho de Administração na Fundação Champalimaud.
É membro da Direção do PEN Clube Português.

Sem comentários:

Enviar um comentário