É a questão que me ocorre lançar no momento, de revolta e repulsa, em que nos confrontamos com a notícia de mais dois lobos abatidos, um no concelho de Montalegre e outro no de Arcos de Valdevez, ambos na região que circunscreve o nosso único parque nacional. Como é hábito, é relevado o facto de se tratar de uma espécie protegida.
Protegida como? Porque existem leis criadas para o efeito, convenções internacionais no mesmo sentido que Portugal é obrigado a respeitar? Sim, assim seria se a legislação em causa fosse cumprida, se o que ela estipula fosse efetivamente executado. Para tal impunha-se averiguar até às últimas consequências cada um dos actos perpetrados contra a espécie. Temos instituições do Estado responsáveis pela vigilância, pelas ações de mitigação de conflitos, pela compensação dos lesados relativas aos danos que são atribuídos ao lobo, pela investigação dos crimes, por assegurar que os seus responsáveis sejam levados à justiça e finalmente por garantir que aquela é feita, no estrito cumprimento da legislação que diz protegê-lo. As notícias que dão conta dos abates também referem, invariavelmente, o rápido envolvimento no terreno das autoridades ambientais e policiais, que se impõe. Tal confirmou-se neste último atentado.
Mas e depois disso, o que se passa? O que se sabe dos sucessivos atentados que regularmente nos dão conta do abate de lobos-ibéricos, dessa espécie muito ameaçada… e protegida? Quantos criminosos foram identificados, quantos actos ilegais foram levados a tribunal, quantos responsáveis foram punidos e de que forma? Igualmente importante, para atacar as causas destes comportamentos ilícitos, é saber que motivações têm levado a que cidadãos continuem a perseguir lobos até à morte. Conflito de interesses relacionados com a exploração pecuária, com o não pagamento de indemnizações? Com a caça? Prazer em matar tudo o que de selvagem se move nos nossos montes? Ou pura insanidade mental, também alegada para impedir que a punição por danos causados ao Estado seja aplicada?
Na imensidade de processos judiciais – alguns de enorme dimensão e de extrema gravidade – em que sabemos não ter sido feita justiça, dir-se-á que o abate de lobos é irrelevante, não tem importância. É um facto que à medida que se sobe na hierarquia do Estado, a retórica prevalece sobre a prática. Pronunciam-se intenções inflamadas, nos momentos dos crimes, para logo a seguir tudo ser esquecido. Por isso, quem realmente sofre com a perseguição movida pelo homem contra o lobo aponta todas as baterias às entidades responsáveis, aos poderes político e judicial, acusando-os de inoperância, de incumprimento da lei. Faz sentido e devemos exigir que os nossos impostos, a nossa contribuição para que as estruturas do Estado criadas para o efeito possam cumprir a sua missão, sejam aplicados também naquilo que para nós é relevante.
Mas serão só os representantes do Estado que não dão importância à salvaguarda dos lobos, quando se ficam pelos discursos, quando não disponibilizam os meios necessários para que a lei seja efetivamente cumprida? Sinceramente, acho que não. O poder político acaba sempre por ser obrigado a atender às exigências da sociedade quando ela, suportada em maiorias, reivindica mudanças. Quantas causas, pequenas e grandes, venceram por pressão da opinião pública? Ocorre-me neste contexto evidenciar o facto de a proteção dos lobos e de muitas outras espécies selvagens que também com eles convivem, da natureza em geral, não moverem as mesmas multidões que ainda recentemente vimos manifestarem-se (mais uma vez) em defesa dos animais de companhia.
Estranho e lamento que o mesmo empenho com que se defendem os animais de estimação não mova a opinião pública em geral, entidades públicas e privadas, incluindo organizações políticas com especial vocação, em defesa da vida selvagem. Esta é para mim a causa profunda que explica que continuemos a assistir ao vil, injusto e ignorante abate de lobos. Porquê? Neste confronto de atitudes importa evidenciar que os lobos são seres (especialmente) importantes para a natureza. E não apenas para o homem.
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