Nas encruzilhadas cantam, dançam e folgam pela noite fora e, quando o Diabo está presente — o que acontece com frequência — cumprem o negro ritual de lhe beijar o traseiro.
A certa altura, veio à baila a vassoura ou o vassouro de varrer o forno, que, segundo a tradição, são o meio de locomoção usado pelas bruxas. Como veremos, algumas contas fazem-se eco disso. Mas nenhum dos informadores acredita que as bruxas se desloquem montadas em vassouras.
− Isso é uma fantasia – disse a Tia da minha Mulher. – Nunca ninguém as viu a voar na vassoura.
− Pois – contrapôs outra. – Mas então como é que vão lá para as festanças que armam lá longe? De carro?
E esta pergunta acabou por dividir as opiniões. E convenhamos que, de facto, é caso para isso.
O Diabo e as bruxas são muito unha com carne, na expressão de um dos meus informadores. Ele, o Diabo, é que é o capitão das tropas e a mando dele é que as bruxas andam cá neste mundo a empecer e a botar maus-olhados. E o informador — aliás uma mulher — prosseguiu (cito as suas palavras de memória):
− Eu nunca vi, mas diz quem viu que as bruxas de cada concelho se ajuntam, todas as terças e sextas, à noite, onde houver areia ou então nas encruzilhadas dos caminhos, em grandes saricotés e descantes. Às duas por três aparece também o Diabo para a folia, e no fim todas têm de lhe dar um beijo no cu, em sinal de respeito e obediência.
E aqui surge oportunidade para a primeira conta sobre bruxas. Conta com o seu quê de pícaro, como se vai ver.
| Uma vez, um sapateiro ia duma aldeia para outra, já noite escura, e pelo caminho calhou passar por uma encruzilhada onde andavam as bruxas em grande festança. No meio delas, andava o Diabo, todo satisfeito, como vilão em casa de seu sogro. E ao sapateiro começou-lhe a pular o pé e então ele resolveu entrar também na folia. Mas quando soube que no fim da dança as bruxas tinham de dar o beijo no rabo do Diabo, disse para com os seus botões: ‘Omessa! Então também tenho de lhe beijar o traseiro ao Barzabum? Desse mal, está ele bem livre!’ E, quando chegou a sua vez, em vez do beijo, pega na sovela do ofício, que trazia no nolso,e espeta-lhe uma valente sovelada no traseiro.
O Diabo largou uma carvalhada e disse:
− Tu! Com que é que me picaste? Ah, és um homem... Pois bem: para a seguinte vez vê se trazes a barba mais bem feita, que eu não estou para que me piques segunda vez o cu!’ |
A graça está, naturalmente, no facto de alguém ter conseguido lograr o Diabo. Mas também está, parece-me, no facto de o Diabo confundir uma sovela com uma barba mal feita.
Com a conta tínhamos entrado numa segunda fase da conversa, que aliás eu estava morto por que começasse. Era como se, depois da teoria, passássemos à prática. A seguir a esta, logo saiu outra conta. Desta vez são dois corcundas a contracenar com as bruxas.
| Diz que uma terça-feira, à meia-noite, um marreco passou por uma encruzilhada, onde andavam as bruxas a cantar e a bailar, como é uso delas. Em vez de se assustar, o marreco, que era destemido, saltou para o meio delas e pôs-se também a dançar e a cantar a cantiga delas, que era só assim:
Às terças e sextas,
Às sextas e terças!
De forma que, no fim, todas satisfeitas com o marreco, disseram as bruxas:
− E então que prenda é que lhe habemos de dar ao marreco, que cantou e bailou connosco tão bem?
− Tira-se-lhe a marreca!
E assim fizeram.
Na manhã seguinte, o marreco apareceu no povo muito listo e desempenado, e toda a gente se admirou.
Havia na aldeia outro marreco, que ficou todo invejoso e quis saber como tinha sido aquele milagre. O primeiro contou-lhe, e disse:
− Sexta-feira, vai lá tu e faz como eu.
E ele assim fez. À distância, já ouvia cantar as bruxas e nem lhe cabia um chícharo no cu de contente, só de pensar que se ia ver libre da marreca e ficar escorreito. Chegou-se ao perto e, cuidando que mais depressa se via livre da marreca, não esteve com meias medidas, saltou logo para o meio delas e disse:
− Ó minhas santas, a mim tanto se me dá que seja às terças, como às sextas, como em todos os dias que vós quiserdes!
E disseram-as as bruxas, todas arreliadas:
− Bô! E então quem é este arreguiço?
− É outro marreco!
− E antão que castigo é que lhe havemos de dar por nos vir estragar a festa?
− Põe-se-lhe a marreca do outro!
E o desinfeliz não teve outro remédio senão voltar para o povo com duas marrecas em vez duma!
− Isso é uma fantasia – disse a Tia da minha Mulher. – Nunca ninguém as viu a voar na vassoura.
− Pois – contrapôs outra. – Mas então como é que vão lá para as festanças que armam lá longe? De carro?
E esta pergunta acabou por dividir as opiniões. E convenhamos que, de facto, é caso para isso.
O Diabo e as bruxas são muito unha com carne, na expressão de um dos meus informadores. Ele, o Diabo, é que é o capitão das tropas e a mando dele é que as bruxas andam cá neste mundo a empecer e a botar maus-olhados. E o informador — aliás uma mulher — prosseguiu (cito as suas palavras de memória):
− Eu nunca vi, mas diz quem viu que as bruxas de cada concelho se ajuntam, todas as terças e sextas, à noite, onde houver areia ou então nas encruzilhadas dos caminhos, em grandes saricotés e descantes. Às duas por três aparece também o Diabo para a folia, e no fim todas têm de lhe dar um beijo no cu, em sinal de respeito e obediência.
E aqui surge oportunidade para a primeira conta sobre bruxas. Conta com o seu quê de pícaro, como se vai ver.
| Uma vez, um sapateiro ia duma aldeia para outra, já noite escura, e pelo caminho calhou passar por uma encruzilhada onde andavam as bruxas em grande festança. No meio delas, andava o Diabo, todo satisfeito, como vilão em casa de seu sogro. E ao sapateiro começou-lhe a pular o pé e então ele resolveu entrar também na folia. Mas quando soube que no fim da dança as bruxas tinham de dar o beijo no rabo do Diabo, disse para com os seus botões: ‘Omessa! Então também tenho de lhe beijar o traseiro ao Barzabum? Desse mal, está ele bem livre!’ E, quando chegou a sua vez, em vez do beijo, pega na sovela do ofício, que trazia no nolso,e espeta-lhe uma valente sovelada no traseiro.
O Diabo largou uma carvalhada e disse:
− Tu! Com que é que me picaste? Ah, és um homem... Pois bem: para a seguinte vez vê se trazes a barba mais bem feita, que eu não estou para que me piques segunda vez o cu!’ |
A graça está, naturalmente, no facto de alguém ter conseguido lograr o Diabo. Mas também está, parece-me, no facto de o Diabo confundir uma sovela com uma barba mal feita.
Com a conta tínhamos entrado numa segunda fase da conversa, que aliás eu estava morto por que começasse. Era como se, depois da teoria, passássemos à prática. A seguir a esta, logo saiu outra conta. Desta vez são dois corcundas a contracenar com as bruxas.
| Diz que uma terça-feira, à meia-noite, um marreco passou por uma encruzilhada, onde andavam as bruxas a cantar e a bailar, como é uso delas. Em vez de se assustar, o marreco, que era destemido, saltou para o meio delas e pôs-se também a dançar e a cantar a cantiga delas, que era só assim:
Às terças e sextas,
Às sextas e terças!
De forma que, no fim, todas satisfeitas com o marreco, disseram as bruxas:
− E então que prenda é que lhe habemos de dar ao marreco, que cantou e bailou connosco tão bem?
− Tira-se-lhe a marreca!
E assim fizeram.
Na manhã seguinte, o marreco apareceu no povo muito listo e desempenado, e toda a gente se admirou.
Havia na aldeia outro marreco, que ficou todo invejoso e quis saber como tinha sido aquele milagre. O primeiro contou-lhe, e disse:
− Sexta-feira, vai lá tu e faz como eu.
E ele assim fez. À distância, já ouvia cantar as bruxas e nem lhe cabia um chícharo no cu de contente, só de pensar que se ia ver libre da marreca e ficar escorreito. Chegou-se ao perto e, cuidando que mais depressa se via livre da marreca, não esteve com meias medidas, saltou logo para o meio delas e disse:
− Ó minhas santas, a mim tanto se me dá que seja às terças, como às sextas, como em todos os dias que vós quiserdes!
E disseram-as as bruxas, todas arreliadas:
− Bô! E então quem é este arreguiço?
− É outro marreco!
− E antão que castigo é que lhe havemos de dar por nos vir estragar a festa?
− Põe-se-lhe a marreca do outro!
E o desinfeliz não teve outro remédio senão voltar para o povo com duas marrecas em vez duma!
(Continua.)
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