Número total de visualizações do Blogue

Pesquisar neste blogue

Aderir a este Blogue

Sobre o Blogue

SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues, João Cameira e Rui Rendeiro Sousa.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 8 de outubro de 2025

A Matança de Outeiro - Capítulo V – A Batalha da Matança


 O amanhecer trouxe um silêncio estranho sobre Outeiro, como se a própria aldeia prendesse a respiração. O vento frio soprava pelas ruas de pedra, e cada folha caída parecia sussurrar alertas de que o dia seria decisivo. As tropas castelhanas aproximavam-se com força total, trombetas e cascos ecoavam pelo vale, anunciando que a aldeia enfrentaria o seu maior desafio.

Tomé ajustou a espada na cintura, sentindo o peso do metal frio contra o seu corpo. Os músculos estavam tensos, e o seu coração batia acelerado. Ao seu lado, João posicionava os arqueiros nos pontos altos da colina, enquanto Maria distribuía remédios e palavras de coragem aos feridos da primeira investida. O velho Tiago percorria o perímetro, organizando a defesa com uma experiência que vinha de décadas de observação e memória ancestral.

- Hoje, cada um de nós é responsável pela vida de alguém. Gritou Tiago, com a sua voz a ouvir-se em toda a aldeia. Lembrem-se do que estamos a defender, as nossas famílias, as nossas casas, a nossa história!

O primeiro choque foi imediato e em força. Flechas cortaram o ar, pedras e troncos voaram das muralhas improvisadas, enquanto os castelhanos avançavam com determinação. O chão tremeu sob os cascos dos cavalos, e o cheiro de ferro e pólvora misturava-se com a terra húmida.

Tomé sentiu o primeiro confronto de perto. Um inimigo avançava diretamente contra ele. Desviou-se de um golpe, contra-atacou e derrubou o soldado, mas logo outro surgiu. Todos os movimentos exigiam rapidez, força e concentração. Sentiu o medo, mas também a coragem que Tiago tinha ensinado, a coragem não é a ausência de medo, mas a ação apesar dele.

João coordenava os ataques surpresa, guiando os jovens pelos trilhos da colina. As emboscadas eram calculadas. Flechas certeiras atingiam os inimigos desprevenidos, enquanto pedras e barris rolavam sobre os que tentavam avançar pelo terreno mais íngreme. A confusão e o medo espalharam-se entre os castelhanos, mas a sua força e os seus números ainda eram muito grandes.

Maria movia-se entre os combatentes. Tratava dos feridos e encorajava os jovens. Um menino caiu, assustado, e ela o levantou-o do chão, murmurando palavras suaves de conforto enquanto o sangue lhe escorria pela roupa.

- Segure firme, meu pequenino! Disse ela, com os olhos cheios de determinação. Não vamos deixar que nada, nem ninguém, nos vença!

O velho Tiago enfrentava inimigos mais fortes, mas não recuava. Cada golpe, cada comando, cada gesto transmitia segurança e experiência. Gritou ordens para reorganizar a defesa, e garantiu que nenhum ponto crítico fosse abandonado.

A batalha durou horas intermináveis. O sol subiu e começou a declinar, mas o confronto parecia não ter fim. Aldeões e castelhanos caíam, alguns mortos, outros feridos, mas a determinação do povo de Outeiro era inabalável. Pequenos atos de heroísmo surgiam a cada instante. Um jovem salvou uma criança, uma mulher pegou numa lança para proteger uma casa, um homem, já ferido, levantando-se para voltar a enfrentar o inimigo.

Tomé, exausto e coberto de sangue e suor, percebeu alguma coisa que mudaria para sempre a sua visão do mundo, a verdadeira força da aldeia não estava apenas na arma ou na estratégia, mas na união de todos. Todos os aldeões contribuíam com coragem, inteligência e compaixão. Formavam um escudo invisível que nenhum exército podia romper e vencer.

Quando o último castelhano caiu ou recuou, um silêncio pesado tomou a colina. A aldeia tinha vencido, mas a vitória tinha um preço alto. Muitos corpos jaziam espalhados, o chão estava manchado de sangue, e o cansaço pesava nos corpos e nas mentes.

Tomé caiu de joelhos sobre a terra manchada, respirou com dificuldade. Ao seu lado, Maria segurava a sua mão, e João limpava o suor e o sangue do rosto. O velho Tiago observava a colina, com olhos marejados, mas cheios de orgulho:

- Conseguimos… murmurou, a voz rouca. Mas nunca se esqueçam, a memória da Matança deve viver para sempre. Cada vida que se perdeu aqui não foi em vão.

A aldeia respirou aliviada, mas sabia que aquela vitória seria apenas a primeira de muitas provas. O sangue derramado permaneceria na memória de todos para testemunhar a coragem do povo de Outeiro.

Ao anoitecer, os aldeões reuniram-se à volta das fogueiras. cuidavam dos feridos, confortavam os que choravam e compartilhavam as histórias da batalha. O espírito de Outeiro permanecia intacto, fortalecido pelo sacrifício e pela união. E, enquanto o vento frio soprava sobre a colina da Matança, cada um dos aldeões sentiu que, embora exaustos, tinham feito parte da defesa da sua terra, de sua memória e da sua gente.

Continua...

N.B.: Este conto tem como base a "Lenda" de Outeiro "A Matança". A narrativa e os personagens fazem parte do mundo da ficção. Qualquer semelhança com acontecimentos ou pessoas reais, não passa de mera coincidência.

HM

Sem comentários:

Enviar um comentário