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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues, João Cameira e Rui Rendeiro Sousa.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 30 de outubro de 2025

Dizem que está a “tchigare” o… “Á-lou-uine”… “Ou lá c’mo catantcho le tchamum a essa cousa”…

Por: Rui Rendeiro Sousa
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")


 (Apenas para quem com vontade esteja de absorver uma visão diferente acerca do período de «Todos os Santos», e de o mesmo coincidir com o «Halloween». E outras “cousas” curiosas...)

A antítese soando, para quem tanto valoriza a genuinidade, sou imensamente grato ao Halloween! Esse evento que me obrigaria, quase em modo compulsão, a procurar entender a razão para haver “uas cabaças c’ua luze drento”. Equivocadamente, cheguei a crer que se tratava, mesmo, da importação de uma «americanice». Mais uma, semelhante à que me tinha roubado o Menino Jesus, trocando-o pelo São Nicolau travestido de marca de refrigerante, com “ua pança infiada num fato, c’um garruço brumelho” e a pronunciar um «ôh-ôh-ôh»… E lá se acabou o fascínio de deixar o sapato “ó pé do tchupão”, à espera das prendinhas do Menino Jesus, substituído que foi por renas e por um “home pançudo” que saía sempre imaculado da chaminé...

Cresci com o «respeitinho» pelo Dia de Todos os Santos, feriado que, em efectivos termos, substituía o conceito do seguinte Dia de Finados, pois correspondia a todo um cerimonial de homenagem aos entes queridos que já não estavam, fisicamente, entre nós. Depois, havia o «Magusto dos Santos», no qual se “porbabum nos bilhós”, nos “infurretábamos uns ós outros” e, já mais crescidote, passei a ter direito a provar jeropiga e um “tantinho de pinga”. Não passava disso a ritualização do dia… 

Haveria de ser pai, confrontando-me com as influências daquilo que se assemelhava a um Entrudo fora de época, com os catraios a “tchatiarim-me” por causa dos trajes assustadores do tal de “Á-lou-uine”, tendo aí aprendido a expressão «doce ou travessura», que com os filhos aprendizagem também temos. Nessa época, ainda não tinha chegado às influências celtas, ao «Samhain», ou ao facto de o tal de «Halloween» representar a abreviatura de «All Hallows’ Eve», em Inglês, ou seja, «Véspera de Todos os Santos», na tradução para Português. 

Entenderia que essa coisa do «Halloween», mesmo soando a «americanice», afinal se tratava de uma «re-importação», pois quem criou o fenómeno nos «Iu-Ésse-Ei», no século XIX, foram os europeus, maioritariamente os irlandeses que emigraram para os Estados Unidos. E isso de irlandeses “tcheirou-me a sturro”, que os “homes” muito dados são a celtismos, a fogueiras e a druidas. Posteriormente, também entenderia que aquela coisa do «doce ou travessura» já por cá tinha reminiscências nalgumas zonas, através do mais genuíno «Pão por Deus». Outras coisas tendo percebido… Quer saber mais um “tantinho”? 

Recuando no tempo, haveria de perceber que, afinal, à custa do tal de «Samhain», a celebração do final do ano celta, que acontece a 31 de Outubro, as manifestações pagãs ao mesmo associadas, haveriam de ser cristianizadas. E quem muito me ajudou a perceber isso, entre outras coisas, até foi um padre, o insubstituível Abade de Baçal. “Ó depeis, andando ó pa tráse”, fui descobrindo outras coisas na imensa documentação que por aí anda solta. Como, por exemplo, que esta “cousa das cabaças c’ua luze drento” não é uma importação das «américas». Porque os nossos antepassados, num tempo de que já ninguém “s’alembra”, já escavacavam umas abóboras (inicialmente até eram nabos!), dando-lhes uma configuração «assustadora», com luz no seu interior. Tal como retratado na “belhinha” foto que acompanha estas humildes palavras. 

Ritual esse que era uma representação de reminiscências dos nossos ainda mais antepassados, os quais, na noite de passagem de ano celta (31 de Outubro), colocavam caveiras, iluminadas por velas, na entrada das suas casas e nos caminhos, para alumiar a passagem dos mortos por esta Terra. Que isto de celebrar os mortos nestas datas não é coincidência… Sempre com o fogo purificador presente… Por isso temos a tradição das velas… Ou a da grande fogueira do «Magusto dos Santos». Magusto, o «magnus ustus», a grande fogueira onde se queima ou, em alternativa, o "magus ustus", o mago que queima. 

E também existe a tradição do «Pau das Almas», mantida em algumas aldeias, também chamada «Canhoto». Tal como o resgatar de uma antiquíssima tradição, a da «Festa da Cabra e do Canhoto», mais conhecida em zonas mirandesas como «Festa da Machorra». Diziam os mais antigos que «quem no canhoto não se aquecer e da cabra não comer, um ano de azar vai ter». Sempre o fogo e a luz presentes... Parece, também, que no tempo dos avós dos nossos avós, tal era o respeito pelos mortos e as crenças arreigadas de que eles voltavam à Terra nestes dias, até se faziam magustos perto dos cemitérios ou locais de enterramento, e se deixavam castanhas nas campas para não passarem fome nessa sua passagem. E há tanto mais quando se “scarafuntcha” documentação antiga… Que isto do «Halloween», a «Véspera de Todos os Santos», originalmente não era para ser assustador, mas sim purificador… 

A terminar, que já vai longo o testamento, não é puro acaso haver dois grandes magustos de seguida, o dos Santos e o de São Martinho, separados por dez dias. Tudo porque, num ano do século XVI, o Papa Gregório XIII, para ajustar o tempo aos equinócios, retirou dez dias ao calendário! E assim terminou o Calendário Juliano, substituído pelo Gregoriano que hoje utilizamos. E, basta fazer as contas, os atrasados nas notícias nessa época, deitaram-se no dia 31 de Outubro, e acordaram no dia 11 de Novembro. Ora, se não havia o magusto do dia 1 de Novembro, fez-se no dia 11… Curiosidades… Outras tantas mais havendo que me vão fazendo entender o tão diferentes que éramos (e ainda somos). Já por aqui as irei partilhando, com os que interesse tiverem nestas “tchalotices”…


Rui Rendeiro Sousa
– Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer. 
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas. 
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana. 
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros. 
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.

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