Projecto-piloto com painéis fotovoltaicos flutuantes na barragem do Alto Rabagão, perto de Montalegre, visa combinar a produção da energia hídroeléctrica com a energia solar.
A EDP está a produzir energia eléctrica solar em Trás-os-Montes, na barragem do Alto Rabagão, desde o final de Novembro. O facto não seria invulgar, não fosse o caso de os 840 painéis fotovoltaicos estarem assentes numa plataforma flutuante de 2500 metros quadrados. Vista de longe, do muro da barragem, a estrutura faz lembrar uma gigantesca peça de lego a boiar sobre a mancha azul.
Mas não há que enganar, a plataforma do primeiro projecto-piloto europeu que quer combinar produção hidroeléctrica e produção fotovoltaica está presa, e bem presa, ao solo granítico da barragem com oito pontos de ancoragem. Foram precisos dois meses de obra e 13 empresas (sendo a fornecedora principal a francesa Ciel & Terre) para que ganhasse forma este investimento de 450 mil euros, que começou a ser pensado em meados de 2015.
Quem olha para a aparente placidez da albufeira num dia atípico de Inverno naquelas paragens, com sol brilhante e sem vislumbre de nuvens no céu, nem suspeita que foi escolhida como local de teste por ter condições das mais adversas entre todas as albufeiras da EDP: profundidade de 60 metros nas zonas mais fundas, oscilações de 30 metros no nível da albufeira, ventos muito fortes e ondulações que podem chegar a um metro. “O Alto Rabagão foi escolhido porque do ponto de vista técnico é o mais desafiante; se funcionar aqui, funciona em qualquer albufeira”, afirmou o director da EDP Produção que coordena o projecto, Miguel Patena, num encontro com jornalistas.
E isso também pode significar cruzar o Atlântico. Segundo Patena, a EDP concluiu que “era muito fácil” chegar aos 200 megawatts (MW) de capacidade no Brasil, “porque as albufeiras são gigantescas, com condições melhores do ponto de vista técnico” e o efeito escala faz diluir os custos mais pesados, que são os da amarração. Porém, antes sequer de pensar na extensão do modelo a outras barragens em Portugal ou na sua exportação, será preciso demonstrar a viabilidade técnica e económica.
Miguel Patena explicou que os parques solares flutuantes não são novidade e ganharam grande fôlego no rescaldo do desastre de Fukushima, precisamente porque no Japão a concorrência pelos terrenos é grande e havia a vantagem de serem instalados em reservatórios de água potável onde, ao fazerem sombra, também reduziam o aparecimento de algas e a evaporação. Além disso, por uma questão de inclinação, as soluções flutuantes, têm a vantagem de serem mais compactas do que as terrestres, ocupando menos espaço para capacidades de produção equivalentes.
Nesta “parceria inédita” entre EDP Produção, EDP Comercial e EDP Renováveis, o que é “novidade” é precisamente a combinação solar/hídrica. “Queremos demonstrar que é possível uma utilização óptima do ponto de vista económico e ambiental da energia solar com a energia hídrica”, diz o director da EDP Produção. “Quando há sol, há energia fotovoltaica e menos hídrica, e quando há chuva, há mais hídrica e menos fotovoltaica, isso é óbvio”, argumenta.
Mais produção
Aproveitando toda a infra-estrutura que já existe na central, e como “os electrões não têm certificado de origem” e para o cliente é irrelevante se vêm do solar ou do hídrico, a empresa procurará definir a solução técnica que permita despachar as duas fontes, sem que uma compita com a outra. Com isso, no futuro, a EDP poderá maximizar o investimento que tem sido feito na hídrica e aumentar o peso de renováveis no seu portefólio, com menor pegada ambiental (porque não é preciso, por exemplo, construir novas linhas para escoar a produção). Trata-se, assim, de uma nova abordagem ao fotovoltaico, que representa apenas 1,5% da produção em Portugal, e onde a EDP só tem a funcionar um parque de 2 MW em Estarreja, ainda a beneficiar de tarifas garantidas.
O piloto, registado como Unidade de Pequena Produção, com capacidade de 220 kilowatts e vida útil de 25 anos, “não é viável”. Ainda assim, a EDP espera conseguir recuperar 60% do investimento com a venda da energia à rede (nos primeiros 15 anos com tarifa fixa de 95 euros/MWh conseguida em leilão e em mercado nos restantes dez).
Com ele, a EDP quer comprovar “durante pelo menos um ano” que o rendimento da produção flutuante é superior “entre 10% a 15%” ao da produção em terra (há mais produção por cada watt instalado na solução flutuante), pelo efeito de arrefecimento dos painéis, o que torna estas soluções mais atractivas do que investimentos idênticos em terra. A empresa está “bastante optimista” face aos valores que foram recolhidos, diz Miguel Patena.
“Todos os ingredientes se combinam e parecem fazer sentido do ponto de vista económico e do ponto de vista ambiental”, agora “é preciso que tudo seja demonstrado”, conclui o coordenador do projecto.
Jornal Público
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