Com tal objetivo, durante este período, vai procurar:
• aumentar o número das escolas primárias – quadruplicou entre 1850-1910 –, de forma a permitir um mais amplo acesso das crianças ao ensino, incluindo as raparigas, e a reduzir as elevadíssimas taxas de analfabetismo – 82,4% em 1878, 78,6% em 1900, 70% em 1910;
• alargar e especificar os conteúdos das disciplinas;
• criar condições para reforçar e atualizar a formação dos professores, através das escolas normais e de habilitação;
• concluir a rede de liceus que, a partir de 1849, passou a cobrir todas as capitais de Distrito, e iniciar a instalação de liceus femininos;
• lançar o ensino técnico e profissional – agrícola, comercial e industrial.
De que forma é que o Município de Bragança acompanhou as transformações que então se fizeram sentir no Reino, a nível do ensino primário e secundário? Quanto ao ensino primário em Bragança, durante a segunda metade do século XIX e primeira década do século XX, a primeira observação que importa fazer é a que diz respeito ao alargamento substancial da rede escolar do Município. Entre 1839-1910, lançaram-se, pelo menos, 39 escolas públicas de primeiras letras, das quais, 29 para meninos, seis para meninas e quatro mistas (Quadro n.º 58).
Por 1893, já 40 das 49 freguesias do Município de Bragança estavam dotadas com escolas primárias.
A Junta Geral do Distrito e a Câmara Municipal, durante todo este período, fazem da instrução pública, juntamente com os transportes públicos, o seu principal combate.
Em 1850, este órgão solicita o estabelecimento definitivo das escolas regimentais nos corpos militares aquartelados em Bragança, defendendo que nenhum soldado deveria abandonar o serviço militar sem saber ler, escrever e contar – entre 1850-1856, existiam em todo o Distrito, com perto de 310 freguesias, 57 cadeiras de instrução primária, com igual número de professores, ensinando “bem ou mal”.
As populações, desprovidas de escolas, não arriscavam mandar as crianças “em tenra idade” para as escolas existentes noutros lugares, em virtude das longas distâncias a percorrer em caminhos inóspitos, das intempéries climáticas, e da sua repugnância em mandar os filhos à escola, que desde tenra idade ajudavam os pais nos trabalhos agrícolas e na vigilância de rebanhos.
A Junta Geral de Bragança, consciente desta dramática situação, defende em 1850 que a inexistência de escolas na maior parte das freguesias podia ser resolvida se os membros do clero fossem obrigados a garantir o funcionamento das escolas de primeiras letras, nas freguesias em que exerciam o seu múnus, apesar de, “desgraçadamente”, “grande parte dos párocos” não estar preparada para dar as aulas da “simples instrução primária, porque a não possuem”. Esta solução era até compatível com a faina do campo, na qual as crianças e os jovens participavam, podendo as aulas ter lugar “a horas mortas do trabalho” – bem ou mal, o clero continuava a ser o grupo social mais culto do Reino, justificando-se, assim, como lembra António Nóvoa, que uma parte importante do corpo do ensino primário fosse constituída por sacerdotes. Apesar da insistência desta sugestão em vários relatórios, a verdade é que o Governo nunca optou por tal solução.
Outra preocupação da Junta Geral e da Câmara Municipal de Bragança tinha a ver com a escolaridade feminina. Na década de 1850, em todo o Distrito, havia apenas uma escola pública para meninas, instalada na Cidade, em casa particular, com uma mestra. Por outro lado, as meninas só a podiam frequentar até aos 11 anos, uma vez que, a partir de então, “a falta de recato obsta à frequência delas”.
Considerava então o Governador Civil de Bragança que, enquanto os ordenados dos professores de instrução primária fossem inferiores aos de um oficial mecânico ou jornaleiro agrícola – 6 750 réis –, não era possível ter docentes competentes. Como resultado desta situação, os professores encarregavam os filhos, os alunos mais antigos, ou os amigos a tomarem conta das aulas, enquanto eles iam “tratar dos seus negócios”, aparecendo na escola “um dia por semana, ou meia hora por dia”.
Por outro lado, quando os exames para professores se tornavam exigentes, as cadeiras iam a concurso várias vezes sem encontrar candidatos. O professor, mal remunerado, “absurdamente classificado na hierarquia social”, considerado como “um empregado de classe subalterna”, não tinha qualquer motivação para melhorar a sua formação e dedicar-se ao ensino.
Para resolver esta limitação, a Junta Geral propôs o estabelecimento de “um colégio de educação para o sexo feminino”, no convento das religiosas de Bragança, comprometendo se a dar ao mesmo uma verba anual de 200 000 réis.
O colégio não avançou. Mas aquelas entidades continuaram a desenvolver esforços para alargar a instrução do sexo feminino, “inteiramente descurada, se não totalmente esquecida”, obtendo, assim, uma outra cadeira para meninas, na Cidade, em 1857; e dez anos mais tarde, serão uma dezena.
A situação da instrução primária no Município, em 1857, era a seguinte: em Bragança, duas cadeiras de primeiras letras públicas para meninos, duas cadeiras de primeiras letras e trabalhos de costura privada para meninas; e nas freguesias do Concelho, dez escolas públicas e uma particular para rapazes. Isto é, apenas 20% das 50 freguesias dispunham de escolas. Frequentavam as 12 escolas masculinas públicas 457 alunos (Quadro n.º 59).
Em 1865, a Junta Geral abriu em Bragança uma cadeira noturna de ensino primário para os “artistas e criados de servir”, iniciando assim o ensino para adultos.
Em 1869-1870, no Município de Bragança, existiam, quanto ao ensino público primário, 15 escolas masculinas e uma escola feminina, frequentadas por 475 alunos e 80 alunas. Na Cidade, funcionava uma escola noturna, subsidiada pela Junta Geral, com 25 alunos. Registavam-se ainda escolas em Alfaião, Parâmio e São Pedro de Sarracenos, da responsabilidade da Câmara Municipal; e uma escola feminina em Izeda, garantida pela Confraria das Almas. No Concelho tínhamos, assim, 34 freguesias sem escolas.
Na década de 1870, o número de escolas em Bragança e no Distrito continuou a crescer a bom ritmo. Em 1872, no Município registam-se 25 escolas de instrução primária, nas quais trabalhavam outros tantos professores – 18 mestres e duas mestras, do Estado; e sete de corporações particulares. Em todas elas aprendiam 673 alunos. A Câmara Municipal sustentava ainda quatro escolas municipais do sexo masculino nas freguesias de Nogueira, Parâmio, Alfaião e São Pedro de Sarracenos. Em todo o Distrito, menos de 50% das freguesias dispunham de escolas.
Em 1876, existiam no Distrito de Bragança 156 escolas de instrução primária, sendo 129 do sexo masculino e 27 do sexo feminino. Destas, 150 eram sustentadas pelo Estado – 124 do sexo masculino e 26 do sexo feminino –, cinco por outras “corporações” e ainda o Asilo Duque de Bragança, a funcionar no edifício do atual Arquivo Distrital. Isto é, 154 freguesias do Distrito ainda não tinham qualquer estabelecimento de ensino. Neste ano, quanto ao Município de Bragança, tínhamos 28 escolas – 23 do sexo masculino e nove do sexo feminino, incluindo o Asilo da Infância Desvalida (Asilo Duque de Bragança) – frequentadas por um total de 860 alunos – 650 meninos e 210 meninas. Neste Concelho, sabiam ler e escrever 3 310 homens e 1 015 mulheres, num total de 4 325 indivíduos – 15,8% da população do Município e 24,2% das 17 841 pessoas que no Distrito de Bragança estavam na mesma condição.
Ainda em 1876, o Governador Civil de Bragança vai solicitar a criação de uma Escola Normal de Ensino Superior no Distrito, ambição que só irá concretizar-se duas décadas mais tarde...
Finalmente, quanto ao ensino primário, importa aludir, para além das escolas regimentais que já referimos, às escolas móveis que começaram a funcionar em finais do século XIX, desconhecendo nós contudo, o impacto que estas últimas tiveram em Bragança.
Registe-se ainda, quanto ao ensino primário, durante todo o século XIX e primeira parte do século XX, que as escolas funcionavam, regra geral, em casas particulares, muitas vezes, a própria casa do professor, como por exemplo, em Frieira, Mós, Sendas e Sanceriz – nesta última localidade, a escola funcionou em casa alugada até 1958. Na Cidade de Bragança, por 1862, referia-se que algumas das escolas estavam localizadas em ruas imundas e instaladas em casas pouco arejadas, escuras e não adequadas aos rigores do clima.
É neste contexto que importa valorizar a Escola do Conde de Ferreira, construída em Bragança no ano de 1868, graças à generosidade daquele titular, a qual representava para a Cidade um grande avanço, quando comparada com todas as outras escolas do ensino primário no Município, pois é o primeiro caso de normalização arquitetónica de uma rede de escolas não tuteladas pela Igreja. Lamentavelmente, como esclarece Florinda Reis, a Câmara Municipal de Bragança decidiu demolir o edifício, em 1948, para, no lugar dele instalar o Tribunal Judicial. E assim se perdeu um elemento histórico valioso, o único que, no final do século XIX, teria edifício e traça arquitetónica próprios. E a memória dos homens atraiçoou mesmo o nome do benemérito, porque trocou o nome da rua, de Conde de Ferreira para Avenida João da Cruz.
Conde de Ferreira, benemérito que legou à Cidade de Bragança uma escola primária |
Outro edifício escolar-tipo, no final da Monarquia, foi a Escola Adães Bermudes, constituída por dois corpos de salas de aula, para rapazes e para raparigas, unidos por um volume central destinado à habitação dos professores.
Deste tipo, no Concelho de Bragança, foram construídas as escolas de Bragança, Izeda, Outeiro e S. Pedro de Sarracenos, as três primeiras “com duas torres anexas, uma em cada entrada, e a terceira com uma torre lateral”. Infelizmente, a de Bragança, construída em 1908, foi semidemolida, ampliada e adaptada, a partir de 1943, a Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Bragança. Está completamente descaraterizada. E nem o nome de Adães Bermudes tem a escola do 1.º ciclo que a Santa Casa da Misericórdia ali instituiu, a partir de 1991.
Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa
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