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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues, João Cameira e Rui Rendeiro Sousa.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quarta-feira, 15 de outubro de 2025

A Matança de Outeiro - Capítulo VI – O Preço da Vitória


 O sol nascente iluminava Outeiro, mas a aldeia parecia menos viva. As ruas de pedra, normalmente cheias de sons de vida, estavam silenciosas. O vento trazia um cheiro estranho de ferro, fumo e terra remexida, lembrando a todos que a batalha tinha deixado marcas que não desapareceriam facilmente.

Tomé caminhava lentamente pelas ruas, observando o chão marcado pelas marcas da luta. Lembrava os amigos que não voltariam. O peso da vitória misturava-se à dor da perda. Parou em frente de uma casa parcialmente destruída e viu que uma família ainda chorava sobre os escombros, agarrando, com força, as mãos de quem não sobrevivera.

Maria passava de casa em casa, cuidava dos feridos e confortava os que tinham perdido familiares. As lágrimas que ela enxugava não eram só de dor, eram também de alívio. Cada habitante vivo era uma pequena vitória dentro do caos.

- Tomé… Chamou ela, e segurou na sua mão. - Temos que continuar. Precisamos reconstruir, mesmo que seja só um passo de cada vez.

- Eu sei… Respondeu ele, com a voz embargada. - Mas é tão difícil aceitar que alguns dos nossos não voltam…

Enquanto caminhava, Tomé encontrou João, sentado sobre uma pedra. Olhava para o horizonte, ainda tenso, como se esperasse que os castelhanos voltassem a qualquer instante.

- Quase todos estão vivos… pelo menos a maioria, disse João, tentando acalmar-se. - Mas o que vimos… nunca vamos esquecer.

- É isso que significa a Matança, respondeu Tomé. - Não basta vencer. É preciso pagar o preço da vitória.

As crianças, muitas delas ainda assustadas, corriam entre as casas, ajudando como podiam. Carregavam água, pequenas ferramentas e cuidavam de animais feridos. Era a primeira lição de que mesmo os mais jovens precisavam de se envolver, compreender que a vida e a aldeia dependiam da coragem de todos.

O velho Tiago, com passos lentos, percorreu a aldeia. Falava com os aldeões sobre a importância de honrar os mortos e aprender com a batalha:

- Cada um dos canhões, cada memória… é um professor silencioso, disse ele, olhando para o canhão sobre o cavalete. - Não podemos esquecer os que caíram, nem o que defendemos.

Nos dias que se seguiram, Outeiro tornou-se uma aldeia em reconstrução. As casas foram reparadas, o cansaço físico e emocional dos aldeões era evidente. O martelo do ferreiro soava mais lentamente, cada golpe fazia lembrrar a luta que travaram. As crianças aprendiam sobre coragem e responsabilidade, acompanhando adultos em pequenas tarefas vitais.

Tomé, Maria e João passaram a liderar grupos de reconstrução. Tomé coordenava as reparações na oficina e nas casas, Maria organizava mantimentos e cuidava da saúde dos feridos, e João supervisionava a vigilância dos arredores, prevenindo qualquer surpresa de novos ataques.

Na praça central, à noite, os aldeões reuniam-se ao redor de fogueiras, partilhando comida, histórias e lembranças. As conversas eram interrompidas por silêncios e emoção, lembrando que a vitória, embora conquistada, tinha um preço que todos carregariam para sempre.

- Conseguimos proteger Outeiro, disse Tiago, a voz firme mas suave. Mas nunca se esqueçam que a coragem é um fardo tão pesado, ou mais, do que a vitória. Cada um de nós tem de carregar essa recordação, para que o sacrifício dos nossos nunca seja em vão.

Enquanto o vento soprava sobre a colina da Matança, a aldeia permanecia unida, tentando transformar a dor em força, o medo em sabedoria e coragem, as perdas em memória. A vitória tinha sido alcançada, mas o verdadeiro desafio começava agora. Reconstruir, honrar e manter viva a memória da Matança.

Continua...

N.B.: Este conto tem como base a "Lenda" de Outeiro "A Matança". A narrativa e os personagens fazem parte do mundo da ficção. Qualquer semelhança com acontecimentos ou pessoas reais, não passa de mera coincidência.

HM

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