Em 1977, a NASA lançou dois discos em cobre banhado a ouro com 30 centímetros de diâmetro, contendo gravações de risos de crianças, batimentos cardíacos e chamamentos de aves. Estará o seu tempo no espaço a chegar ao fim?
Em 1977, a NASA lançou as naves Voyager 1 e 2 de Cape Canaveral, no estado da Flórida, para o espaço, a fim de embarcarem numa grandiosa viagem até aos confins do nosso sistema solar. A bordo de cada sonda, havia um disco em cobre banhado a ouro com 30 centímetros de diâmetro – uma “mensagem dentro de uma garrafa” cósmica, contendo gravações de vistas, sons e retratos da vida na Terra, conhecidos colectivamente como os Discos Dourados – tendo em vista a ínfima probabilidade de alguma civilização extraterrestre distante os descobrir. No novo filme animado Elio, que estreou recentemente, é exactamente isso que acontece quando a personagem principal, Elio, encontra extraterrestres que pensam que ele é o líder da Terra.
“Foram feitos para serem uma espécie de carta de apresentação a qualquer cultura que pudesse encontrar a sonda”, diz Bethany Ehlmann, cientista planetária do Instituto de Tecnologia da Califórnia e Exploradora Emergente da National Geographic em 2013, sobre os Discos Dourados originais. Embora estas saudações banhadas a ouro se destinassem parcialmente a um público extraterrestre, eram sobretudo uma mensagem para os seres humanos do nosso pequeno berlinde azul. “É uma carta de amor para a Terra e tudo aquilo que atravessámos até chegarmos ao ponto em que somos capazes de enviar estas sondas para conhecer o nosso Sistema Solar.”
Mas onde andam os Discos Dourados – e quanto mais tempo irão durar no espaço? Falámos com os especialistas, incluindo Ehlmann, para descobrir.
A gravação compilada pela humanidade
Quando foi encarregado de decidir os conteúdos da gravação intergaláctica que iria viajar a bordo das sondas Voyager, o famoso astrónomo Carl Sagan reuniu uma equipa de cientistas, artistas e engenheiros. A fim de apresentar um bom retrato da vida na Terra a bordo do emissário físico mais distante da humanidade, a equipa incluiu uma variedade de sons associados com a vida quotidiana e a natureza, como chamamentos de aves, canções de baleias-jubarte, riso de crianças, passos, batimentos cardíacos, exames de ondas cerebrais e um beijo. O disco também continha 90 minutos de música, incluindo composições clássicas ocidentais de Mozart, Bach, Beethoven e Stravinsky, música de percussão senegalesa, canções aborígenes australianas e “Johnny B. Goode” de Chuck Berry.
O disco, cuidadosamente concebido para a resistir a uma viagem especial durante milhares de milhões de anos, também inclui saudações em 55 línguas vivas e mortas, bem como 115 fotografias analógicas codificadas da Terra e dos seus habitantes.
Na capa destes discos, figura um mapa que ajuda a encontrar o caminho para a Terra a partir de núcleos densos e pulsantes de estrelas chamados pulsares, que existem nas nossas proximidades. Os discos também contêm diagramas de um átomo de hidrogénio – o elemento mais comum do universo – e instruções para a sua reprodução. Cada disco está protegido por uma capa de alumínio banhado a ouro e acompanhado por um cartucho e uma agulha, para reproduzir os seus conteúdos.
“A nave espacial só será encontrada e o disco só será reproduzido se existirem civilizações itinerantes no espaço sideral”, escreveu Sagan, líder do projecto Voyager Golden Record. “Mas o lançamento desta ‘garrafa’ para o ‘oceano’ cósmico diz algo muito esperançoso sobre a vida neste planeta.”
Uma viagem cósmica até locais distantes
Ao longo dos anos, as sondas Voyager voaram junto aos quatro planetas mais distantes do Sistema Solar a uma velocidade de 56.327 km/h, enviando-nos vistas pormenorizadas de Júpiter, Saturno, Úrano e das suas luas. A passagem da Voyager 2 por Úrano e Neptuno foi a única ocasião em que humanidade viu esses mundos de perto.
Depois de concluírem as suas missões principais de sobrevoar os quatro planetas exteriores em 1989, as sondas gémeas continuaram a avançar, rumo aos confins do Sistema Solar. As Voyager 1 e 2 saíram do Sistema Solar e entraram no espaço sideral em 2012 e 2018, respectivamente.
Actualmente a mais de 24.000 milhões de quilómetros da Terra, a Voyager 1 tornou-se o objecto de fabrico humano que se encontra mais distante de nós, no espaço. A Voyager 2 ocupa o segundo lugar, encontrando-se agora a cerca de 21.000 milhões de quilómetros de distância. O ambiente interestelar onde estão é uma sopa de gás, poeiras e raios cósmicos. As sondas Voyager estão equipadas com peças resistentes à radiação, mas o ataque de partículas carregadas na zona onde se encontram actualmente continua a representar uma ameaça para os seus componentes electrónicos envelhecidos.
Ambas as Voyager ainda estão a recolher e enviar dados de volta, actualizando os seres humanos sobre as suas aventuras intergalácticas, embora devagar: estes sinais demoram quase 20 horas a chegar à Terra devido à enorme distância que têm de percorrer.
As missões Voyager estão quase a terminar pois as baterias de plutónio das sondas gémeas estão prestes a ficarem sem energia. A equipa da Voyager está a tentar prolongar o seu tempo de vida ao máximo, desligando instrumentos não-fundamentais, como aquecedores, para poupar energia. “Mais de 47 anos de missão depois, resta pouquíssima energia”, diz Suzanne “Suzy” Dodd, actual gestora de projecto das missões Voyager. “O objectivo da missão é chegar aos 50 anos.”
Mesmo depois de a missão terminar, os Discos Dourados continuarão, calmamente, a afastar-se cada vez mais no abismo cósmico, provavelmente durante milhões ou até milhares de milhões de anos. “Muito depois de perdermos a comunicação com a nave espacial, ela continuará a viajar com o Disco a bordo – uma cápsula do tempo”, diz Dodd. Ela comenta que é excitante “pensar num bocadinho de nós, num bocadinho daquilo que a Terra e a humanidade são, viajando pelo centro da nossa galáxia para ser encontrado por qualquer ser que possa existir lá fora”.
No entanto, Dodd realça as enormes distâncias físicas e cronológicas envolvidas no processo. As sondas vão demorar cerca de 40.000 anos a entrarem nos arredores de outro Sistema Solar, quando a Voyager 1 passar a 1,6 anos-luz da estrela Gliese 445. Por volta da mesma altura, a Voyager 2 estará a 1,7 anos-luz da estrela Ross 248.
O legado dos Discos Dourados
Os Discos Dourados deixaram um enorme impacto cósmico. Segundo Ehlmann, a maioria das naves espaciais lançadas depois da missão Voyager inclui algum tipo de mensagem do nosso lar terrestre. “As pessoas pensam na ciência como uma actividade fria e calculista, mas, na verdade, é a expressão da curiosidade e do espanto”, diz ela. “É uma maneira de deixarmos a nossa marca no universo.”
E quase 50 anos após o seu lançamento, o nosso par de emissários robóticos enviados para as estrelas continua a fazer a viagem mais longa alguma vez empreendida no espaço.
“Quem sabe? Talvez daqui a milhão de anos, as sondas Voyager vão parar a algum museu extraterrestre”, diz Ehlmann. “É excitante imaginar isso.”

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