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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues, João Cameira e Rui Rendeiro Sousa.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 14 de outubro de 2025

Dizem que é tempo de “chuba”. Ou de “tchuba”, será?...


 Incorrecta não estando a genuína pronúncia. Tempo sendo, igualmente, de resgatar o “sombreiro” ou, versões outras, o “chuço”. Quer dizer, o “tchuço”! E se o frio apertar, retira-se a “samarra” do armário, ou a “casaca”, sendo óptimo que tenha “garruço”. Provavelmente, alguns começarão a usar “ciroulas”, em vez dos “truzes”, bem como “miotes” grossos.

Até poderia ter escrito o parágrafo anterior respeitando, na íntegra, a referida genuína pronúncia. Porém, soaria a estranho aos menos familiarizados com uma forma de falar à qual designaram como «língua charra», “tcharra” se faz favor, em contraponto à «língua fidalga». Aprecio ambas, em simultâneo nelas tendo imenso orgulho. Ou “proa”! Talvez por isso saia esta “galdromada” linguística…

Que aqui trago por causa da “tchuba” e de muitas outras palavras com o dígrafo [ch] escritas, o qual em Língua Portuguesa, a «língua fidalga», é pronunciado com o som equivalente ao [x], na «língua charra» sofrendo um fonológico fenómeno que possui o curioso nome de africada. Fenómeno esse que, na esmagadora maioria das palavras que contêm o referido dígrafo [ch], a pronúncia é substituída por um som forte assemelhado a [tch]. Muitos o reconhecerão de imediato, tenho a certeza.

Quando catraio, influências milenares, também dizia “tchuba”, por entre muitas outras particularidades muito nossas. Nos iniciais anos de ensino, ao ser confrontado com as primeiras professoras, tal como acontecia com a maioria dos meus colegas, éramos corrigidos, porque «chuva» não continha nenhum [t], e era [v] ao invés de [b]! Convencidos íamos ficando de que falávamos mal. Ingenuamente, contestava, dizendo que, quando ia para a aldeia, era assim que se falava. Obtendo como resposta que não estávamos na aldeia, mas sim na vila. E era a incontestável “Sôra Prussôra” que o afirmava! Agravada situação pela chegada ao então «Ciclo Preparatório», no qual passámos a conviver com imensos colegas provindos das aldeias, que “tchuba” também diziam. Corrigidos que eram pelos “Sôs Prussôres”, «que isso não é Português», o diziam. E foi o estigma criado…

Nessa época desconhecia que havia Línguas Ásturo-Leonesas, muito menos sabendo que existia o Mirandés, o Sendinês, o Riodonorês ou o Guadramilês. Apenas tínhamos de «enfiar a cartilha» dos Reis de Portugal, das Dinastias e afins. E nunca ninguém nos ensinou que éramos uma região diferente. Muito diferente! Não apenas pelo «Português mal falado», mas também pela História, que muito influenciou esse muito nosso «Português mal falado». Mas isso são contas de outro rosário…

Talvez, estigmas criados, muitos ainda acreditem que falamos mal. A verdade, porém, é que somos poliglotas! Parece, até, que conseguimos falar o ramo do Galego-Português, conjuntamente com o ramo do Ásturo-Leonês. Por isso, «falamos mal Português». Mas falamos «tão mal Português», como um Galego ou um Catalão, nos seus ancestrais idiomas, «falam mal Castelhano». A diferença dos Galegos e dos Catalães, em relação a nós, é que eles têm orgulho nos seus idiomas, que até antecederam o Castelhano. E até falam ambos!

Temos algumas particularidade fonéticas e lexicais que, contrariamente ao veiculado, não são arcaísmos do Português, nem representam o «falar mal». Pelo contrário, são representativos do idioma que aqui falavam os avós dos nossos avós, muito antes de o Português aqui se ter implantado. Hoje, trago aqui a africada [tch], que, afinal, não é nenhum erro. Pelo contrário, é algo que nos distingue.

Talvez muitos nunca tenham pensado que não aplicamos o [tch] por acaso. Só o fazemos em palavras muito específicas, particularmente aquelas que derivam dos étimos latinos que começados eram pelas formas [pl], [fl] ou [cl]. Querem ver? A tal de «chuva», que “tchuba” se pronuncia, deriva de «pluvia». Assim como a «chave», a nossa “tchabe”, originada foi em «clave». Ou a «chama», que “tchama” se diz, que provém de «flamma». Ou o «cheio», “tchêo» pronunciado, que de «plenus» vem, tal como «chamar», o nosso “tchamare”, que de «clamare» é oriundo. Até a cidade de Chaves, “Tchabes” dita, originada foi em «[Aquæ] Flaviæ». Tudo palavras latinas iniciadas pelas formas enunciadas. Não há coincidências…

Depois, há outras, com distintas origens, que acabaram por ver o [ch] em [tch] transformado, como “tchouriço”, “tcharco”, “tchiculate”, “tchotcha”, “bitcho”, “patchorra”, “farragatcho” ou “fitchare”, muitas mais havendo. Palavras às quais aplicação tem a dita africada. Fenómeno fonológico que não se aplica às palavras com [x], como «xadrez» ou «enxada». Pegando neste último exemplo, uma “aixada deixa ua mão intchada”. E, no dito xadrez pode dar-se um xeque, mas há pagamentos que eram feitos em “tcheque”. Nada acontece por acaso, nem nas excepções, como é bom exemplo «bolacha», que “bolatcha” não se diz, mas sim “bolaixa”. Porque em Mirandês, idioma Ásturo-Leonês, é assim que se diz e escreve…

Reconheço que poderei ser “tchato” com estas coisas, todavia “tchega” uma altura em que orgulho nas origens e na distinção devendo ter, não deveríamos ter vergonha de termos “tchítcharos”. Ou boa “tchitcha”, ou umas boas “coubes-trontchas”. Parece “tchabasco”, ou “tchaloto”, mas não é. E agora, à genuinidade recorrendo, em modo de exclusiva pronúncia, “bá, atão bou-me a tchiz’care uns lumes ó fogão, pra le butare ua tchaleira cum auga pra fazere um tchá”. É um “bô tchamarize pr’ó narize”, com fiolho ou limonete, para terminar, em beleza “ua neite”, ou “noute”, “im antes d’ire à deita”.

Fico todo “contcho” e “tchêo de proa” por poder partilhar o tanto que nos distingue. Nomeadamente este fenómeno da africada. Mas há mais, que coincidências não são. “Bem m’ou finto” que não haja pessoas que sintam o mesmo orgulho...

Rui Rendeiro Sousa

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