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SOBRE O BLOGUE:
Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço.
A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)
(Henrique Martins)
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N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.
terça-feira, 13 de março de 2018
A MODA DAS CALÇAS ROTAS...
O garoto de socos e calças rotas
Num dia de chuva, a dezoito de Abril de 1946, em plena Primavera, chegava mais um habitante a esta terra. Só que minha mãe pariu-me quase morto, chamaram o carpinteiro para fazer o caixote a contar que eu já não escaparia pois até chamaram o tio Francisco Esbarriga que era o sacristão, na altura, para me sopiar e mandar-me para os anjinhos. Mas talvez por sorte ficou a viagem adiada, era o meu primeiro dia de vida. O tempo foi passando e fui crescendo. A primeira coisa que aprendi logo de pequeno foi a ser boieiro. Antes de aprender a ler já sabia guardar vacas, quando chegava o Verão era uma grande chatice, ainda vinha o dia não sei onde e ouvia-se uma voz lá no outro canto da casa:
– Filho levanta-te, são horas de ir com as vacas para o lameiro.
Ora como eu gostava muito de dormir, era uma tortura de sono, depois adormecia no lameiro. As vacas iam fazer mal e no dia seguinte lá estava o tio Artur a bater à porta:
– Oh Zé Emílio, chega aí. O teu filho deixou-me comer a horta.
– E como é que você sabe?
– Sei porque conheci o rasto dos socos.
– Oh homem, as minhas vacas não calçam socos nem sapatos.
– Pois não, mas o teu filho é muito esperto, andou com um pau a tapar o rasto das vacas.
E eu por detrás da porta, a ouvir esta conversa. Quando o meu Pai chamou por mim, o meu coração batia que parecia um motor de rega, pois já sabia o que me ia acontecer. Nesse dia levei um enxerto que nunca mais me esqueceu.
Naquela altura o trabalho infantil era muito importante, pois até se ouvia dizer com frequência “o trabalho do menino é pouco, mas quem o perde é louco”. A palavra exploração infantil não tinha fundamento algum, além de necessário, logo desde muito tenro, era quase obrigatório aprender a fazer tudo quanto dizia respeito à agricultura. No meu caso concreto, depois de ter feito a quarta classe, além de aprender a lavrar e a fazer outros trabalhos, também fui pastor. Era necessário ajudar os meus pais a ganhar algum dinheiro porque a vida era muito difícil. Ainda bastante jovem passei muitas semanas sem poder vir a casa, especialmente durante a Primavera e o Verão. Hoje sinto grande saudade daquelas noites de luar, quando dormia na minha cabana, à beira do meu rebanho, respirando o perfume dos montes floridos e assistindo ao romper do dia, quando acordava com as melodias das cotovias. Era a beleza da natureza ali tão perto de mim, enquanto as Primaveras iam passando pela Primavera da minha vida, sempre com a esperança num futuro melhor e muito atento às mudanças dos tempos. A era moderna estava muito próxima e eu até já andava na moda sem saber: não precisava de comprar calças rotas como agora fazem, mas as minhas calças rotas eram muito mais bonitas. A perfeição dos remendos era tal que pareciam quase bordadas e o que lá estava escrito, sem letras, só eu conseguia ler: “AMOR DE MÃE”.
Das minhas calças rotas ninguém sabe, mas guardo essa recordação. O armário é a saudade e eu tenho a sua chave no coração.
Belmiro dos Santos
Grijó de Parada (Bragança)
Tio João
in:jornalnordeste.com
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