Tenho para mim que não há ninguém no mundo que não tivesse sido, pelo menos uma vez, tocado pelo fascínio do poder. Quer seja o poder na sua concepção mais ancestral ou seja o poder como capacidade de construir algo, de implementar qualquer coisa quer seja o poder na sua concepção mais usual ou seja o poder como forma de impor ideias, procedimentos ou comportamentos. Este último impõe-se por via das razões económicas, políticas, sociais mas também se consegue pela sedução e pelo convencimento.
Se dos primeiros é redundante dar exemplos já dos segundos basta lembrarmo-nos dos fundadores da nossa democracia, Álvaro Cunhal, Mário Soares, Sá Carneiro e Freitas do Amaral que, com o seu poder de sedução inebriaram claques, arrastaram multidões que depois, com as razões que cada razão conhece, se tornaram simpatizantes partidários, militantes ou simples politizados e assim se construiu o edifício político da nossa sociedade. É o “poder da palavra” de que fala Adriano Moreira tão enfaticamente. E não há dúvida que esta é uma forma de poder inegavelmente bonita.
Mas não é de poderes mais ou menos abstratos que quero falar mas sim de poderes concretos, efetivos como o poder do patrão, do chefe, do diretor, do presidente e sobretudo do presidente da Câmara que é um poder suficientemente próximo para lhe sentimos os efeitos e ao mesmo tempo distante quanto baste para não se sentir a personalização desse poder. É este poder, misto de abstrato e de concreto, que faz com que praticamente todos, em sonhos, desejos ou simples exercício académico, nos questionássemos sobre a sua aplicação caso o detivéssemos. Já as razões de pretender esse poder são as mais díspares uns acham-se melhores que os que lá estão; outros pelo elevador social que a Câmara empresta; poucos acham que ser autarca é um dever cívico a que se sentem obrigados; outros ainda porque pensam ter o “Santo Grall” para o município; alguns porque pensam concretizar uma vingançazinha; ainda aqueles que querem fugir ao emprego que têm; também os há que pensam nos negócios que o estatuto pode facilitar; e outros há. Tenho, como todos os munícipes, uma ideia sobre o que faz falta, o que é supérfluo, o que é prioritário e o que não se deve fazer.
Claro que esta opinião será diferente da do vizinho e haverá até tantas quantos os vizinhos mas isso, longe de ser mau, é óptimo. Sendo assim direi que se fosse cometido dos amplos e discricionários poderes de Presidente da Câmara investiria, até ao limite do razoável, na proteção e bem estar dos idosos, porque somos uma terra de velhos. Concomitantemente tudo faria no sentido da criação de mecanismos e ferramentas que promovessem a formação holística das crianças, porque somos uma terra de velhos (estes dois itens aqui enunciados de forma muito genérica, a sua concretização não cabe neste artigo, marcam a forma absolutamente prioritária que o autor lhes atribui).
Falando agora de coisas mais prosaicas direi que promoveria uma guerra sem tréguas e sem quartel aos mecos e ao rachão. Mecos são aqueles pequenos postes colocados na beira dos passeios que não têm outra serventia senão amolgar as portas dos carros quando as abrimos inadvertidamente. Criam, além disso, constrangimentos ao trânsito quando, por exemplo, uma ambulância tem de recolher um acamado. Criam dificuldades de manobra aos carros dos bombeiros como foi patente no incendio da casa da Dr.ª Aurora (ninguém aprendeu nada com a Rua do Carmo). Fazem lembrar as baias usadas para fazer circular os animais num trajeto previamente definido. É, antes de tudo e além de tudo, um atestado de menoridade cívica a todos os cidadãos. Só de vê-los somos acometidos de um sentimento de rejeição, o mesmo que levou o poeta a dizer: ”…só sei que não vou por aí”.
Já agora conto uma história para uma pergunta jocosa: Eça de Queiroz foi embaixador em Havana. Detestava a cidade pelas temperaturas, as humidades e talvez mais ainda por aquela forma de vestir “négligé” e pelo informalismo característico dos climas tropicais. Numa carta a um amigo dava-lhe conta do seu desconforto e descrevia Havana, entre outros mimos, como “…este charco de suor, este depósito de tabaco, este paliteiro de palmeiras…”. A pergunta é: que diria Eça de Queiroz de Bragança se visse este acervo de palitos? (sem contar com este reforço que acaba de chegar à rotunda Norte) Rachão. Pavimento feito com pedra irregular com o mesmo nome que foi colocado na zona do antigo mercado e que há quase 20 anos somos obrigados a assumir ou como forma de martírio ou como perversidade do projetista.
O rachão é uma pedra sem forma definida com dimensões aprox 20 cm e cuja face que oferece ao pisoteio não é plana mas ligeiramente convexa, o que dá imenso jeito para torcer os pés e fazer adornar os carrinhos de bébé de forma agressiva.
A Câmara, que fez passeios novos em S. Lourenço, onde não passa ninguém até porque não há, podia ter dado mais atenção à nossa “miglia d`oro”. Claro que a nossa milha de ouro só tem 50m mas mesmo assim merece mais que os tropeções com que a brindamos. (será que a intenção era por Bragança “on the rocks”?) Mas ali mesmo, na capital do rachão em Portugal, duas obras urgem: uma é um novo acesso ao parque de estacionamento para os carros que chegam à Praça da Sé vindos da parte oriental da cidade. Seria, naturalmente, feita pela viela do Novais. É uma obra que está na ordem do dia porque contribuiria para a redução das emissões de CO2, ainda por cima em Cidade, pois retiraria da circulação carros que vagueiam, poluindo, atrapalhando o trânsito e cujo único objetivo é entrar no parque de estacionamento que não encontram; outra é a requalificação daquele terreiro imenso, que era a praça do mercado, hoje sem qualquer serventia e onde aquele ressalto, lembrando uma gigantesca pedra tumular, parece querer dizer-aqui jaz o que outrora teve vida, cor e alegria. Talvez um concurso de ideias, pois a ideia em curso manifestamente não serve.
Um aspeto que mereceria a minha atenção é a singularidade da orgânica do terminal rodoviário. Tirar o bilhete de um lado para ir embarcar longe dali muitas vezes com chuva e malas pesadas não tem absolutamente jeito nenhum. Além disso, com todo aquele espaço envolvente e não há onde por um carro!? Retirar, da utilização humana, espaços com elevado potencial de utilização para esse fim e entregá-los para a exuberância de mato atípico não parece curial em ambiente citadino. As consequências vêem-se quando da espera de passageiros: os carros todos amontoados na ponta dos terminais ou em alternativa a parasitar o parque do Lidl. O parque de campismo foi um erro. E por várias razões.
Passo a historiar: quando eu era jovem, Bragança tinha dois sítios balneares. Um era o Rebôlo e o outro era a Elevatória. Para o Rebolo íamos a pé donde regressávamos com as cuecas molhadas que para secarem eram esticadas por dois paus colocados em cruz ou em alternativa colocadas na cabeça em jeito de barrete. Não havia calção de banho. A Elevatória era mais elitista porque era longe e tínhamos de arranjar boleia. Além disso era quase obrigatório o uso de calção, por pudor, pois havia gente mais velha. A presa do Rebolo foi derrubada, não sei porque motivos, e na Elevatória foi feito um parque de campismo. Resumindo: Bragança que já era pobre em matéria balnear, passou a zero. Salvam-se as piscinas. E em matéria de campismo pouco ganhou. A zona não tem requisitos mínimos para fazer um parque para passar férias. O rio não ajuda, é ir vê-lo agora às poças e cheio de mosquitos, as margens são muito estreitas e o resto é encosta. Acresce que a partir do desastre de Andorra é desaconselhado fazer campismo no leito de cheia. Não tendo equipamentos mínimos para passar férias o parque é frequentado por turistas de passagem, o que não deixa de ser um mercado interessante. Chegam, dormem e no dia seguinte demandam outras paragens. Mas para este turista, Bragança devia ter um parque em Bragança. Era uma maneira de lhe mostrar Bragança de o obrigar a “gastar” Bragança e de o tentar cativar de forma a prolongar a estadia.
De qualquer forma a zona ribeirinha seria devolvida à fruição das gentes de Bragança que sempre passearam ali bem. (já noutros sítios ponho as minhas reticências. Tenho como verdade sociológica que ninguém passeia quando o “mandam passear”.) O campismo de uns não pode impedir um direito quase ancestral de outros. Além disso o que está feito é ilegal. Quanto ao Rebôlo diria que comigo a reconstrução seria uma certeza não só pelo custo ridículo que a obra implicaria mas sobretudo pela alegria que iria gerar em centenas de concidadãos.
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