Um grupo de indianos está na União das Freguesias de Quirás e Pinheiro Novo, no concelho de Vinhais, a fazer trabalhos de reflorestação mas vive em condições indignas e, pelo menos, alguns dos homens não recebem salário.
Os trabalhadores vivem numa Casa do Povo, em Pinheiro Novo, mas dormem em três ou quatro colchões, no chão. Não têm como tomar banho, já que o local onde estão alojados tem casas de banho, mas apenas dispõem de sanita e lavatório para as mãos. O banho é feito numa agueira. Cozinha também não há. Preparam as refeições num barracão, atrás da casa. É ali, naquele espaço sem portas e já antigo, que fazem fogueiras e põem as panelas ao lume. Jaswinder Singh é um dos indianos nestas condições. Foi contratado pela Turma Rústica LDA, a 17 de Fevereiro, mas conta que ainda não recebeu. “Estou em Portugal. Vim de Itália para Portugal de avião. Estou cá há dois meses. Aqui não há água e não me pagaram. Quero ir embora, para outro trabalho, para o Porto ou Lisboa”.
O trabalho de reflorestação está a ser feito desde Dezembro. Alguns trabalhadores chegaram a ser levados pela GNR, depois de terem pedido ajuda a uma moradora da aldeia, que apesar de não querer ser identificada, contou como tudo aconteceu. “Disseram que precisavam de ajuda para sair daqui, que tinham fome e que o outro (patrão) lhe batera. Traziam um telemóvel, porque não falam português, para eu traduzir à GNR a ajuda que precisavam. Primeiro dei-lhe de comida, porque me acenavam para a horta de casa e eu vi que eles estavam débeis das pernas. Estavam cheios de fome e disse para o meu marido que lhes ia dar de comer, porque o meu coração estava partidinho a ver aquelas pessoas”.
Contactámos a GNR que confirmou ter estado no local no dia “15 de Fevereiro”, depois de uma denúncia. Depois encaminhou os oito indianos através do Centro de Acolhimento de Vítimas da Tráfico de Seres Humanos das Equipas Multidisciplinares Especializadas (EME) do Norte e reportou os factos ao Tribunal de Bragança e aos serviços do Alto Comissariado para a Imigração.
A casa de Armindo Pais é imediatamente ao lado do local onde os indianos estão alojados. Vive em Lisboa, mas vem passar férias à aldeia. Quando chegou percebeu que a casa tinha sinais de arrombamento. Não sabe quem terá sido, mas desconfia, uma vez que o seu bidon e mangueira estavam na Casa do Povo a ser usado pelos indianos. Contou ter ido à GNR, mas não apresentou queixa, queria apenas dar conhecimento do que está acontecer na aldeia. “Estou revoltado porque isto não é sítio para alojar ninguém, para viver, porque não tem condições de habitabilidade. Basta olhar para lá e não vemos chaminé e se não tem chaminé não tem cozinha, se não tem cozinha as pessoas não podem viver lá. E têm colchões, mas que os vizinhos puseram lá”.
Ovídeo Alves Ferreira, residente em Pinheiro Novo, garante que os indianos vivem mal e que têm fome. Por isso, já os tentou ajudar, dando-lhes de comer. “Esta gente está a viver muito mal. Não têm comida. Não têm nada. Não têm fogão. Não têm onde tomar banho. Ainda outro dia fiz cinco quilos de moelas. Agradeceram e ficaram todos contentes. eles não se metem com ninguém”.
Inicialmente, a presidente da União das Freguesias de Quirás e Pinheiro Novo, Zélia Diegues, mostrou-se disponível para explicar a situação. Contudo, depois de várias tentativas telefónicas, nunca mais atendou as chamadas.
Ainda assim, na visita à aldeia, o tesoureiro da união de freguesias, Manuel Borges, confirmou que a casa foi cedida pela junta, mas lava as mãos de culpas. “Pediram ajuda porque não tinham onde ficar alojados e decidimos que era melhor ficarem aqui do que numa tenda na rua. Quem nos pediu foi o presidente dos baldios do Pinheiro Velho e o engenheiro responsável pelo projecto de reflorestação. Nós cedemos o que tínhamos. Quando dei a chave de casa avisei logo que isto não tinha todas as condições necessárias e eles disseram que não havia problema. Foi o patrão que anda com eles que disse que as condições eram com eles. Já os vi em condições piores. Não são sempre as mesmas pessoas. Eles trocam. Muitos vêm para aqui enganados. Chegam aqui e não gostam do trabalho”.
Tentámos contactar a empresa responsável pelos trabalhos, a Turma Rústica LDA, com sede em Vila Verde, no distrito de Braga. Kuldeep Poonia é o homem que o indiano nos indicou como patrão mas, inicialmente, quem prestou declarações foi Sara Moreira, do departamento financeiro. Quando questionada sobre as condições de habitabilidade do grupo referiu que não prestava explicações a jornalistas. Pediu apenas que nos entendêssemos com a junta.
Clarificou ainda assim que a polícia já a contactara e que cedeu toda a informação, nomeadamente contratos, e estava tudo bem.
Disse que os trabalhadores reportam à empresa que estão bem e no que toca a trocá-los vincou apenas que “eles vão e vêm” porque “são nómadas”. Já no que toca a salários referiu que apenas emite recibos e que os homens seriam pagos.
Numa segunda tentativa conseguimos chegar à fala com o alegado patrão dos indianos. Kuldeep Poonia confirmou os trabalhos no concelho de Vinhais mas questionado sobre as condições em que os seus trabalhadores vivem disse não compreender a questão. Acabou por desligar a chamada e não voltou a atender após ser questionado sobre pagamentos e de haver, pelo menos, um empregado que nunca recebera um cêntimo.
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