Após a noite em que Tomás ouviu o som do tear e vislumbrou a figura luminosa da princesa, o rumor sobre Castramouro espalhou-se silenciosamente pela aldeia. Alguns diziam que eram apenas histórias antigas, inventadas para assustar crianças. Outros juravam que tinham ouvido o sussurro do tear ou visto luzes que dançavam sobre a fraga ao cair da noite. Mas poucos tinham a coragem de se aproximar.
Tomás, entretanto, não conseguia tirar da cabeça a imagem da princesa. Cada vez que fechava os olhos, via o dourado dos novelos, a delicadeza de seus dedos a moverem o tear, e sentia a melancolia que emanava dela. Um desejo silencioso cresceu dentro dele, queria tocar, sequer por um instante, aqueles fios de ouro, entender o que escondiam e talvez libertar a princesa de sua solidão eterna.
Numa noite de lua cheia, mais brilhante do que qualquer outra, Tomás decidiu voltar à fraga. Aproximou-se devagar, sentindo as pedras sob os pés e o ar pesado que carregava um perfume antigo, como se lembrasse de flores esquecidas nos jardins do castelo. O som do tear começou novamente, suave, como um canto que acariciava os sentidos.
E então viu a princesa Moura, de rosto iluminado pela lua, tecendo incansavelmente. O ouro nos novelos parecia brilhar com uma luz própria, refletindo histórias de batalhas, fugas e segredos guardados há séculos. Tomás, tomado pela curiosidade e pelo fascínio, deu um passo adiante.
- Não deves tocar, disse a princesa, com a voz doce, mas firme. - Cada fio é uma memória, cada ponto é uma vida. Quem os toca sem merecer, arrisca-se a perder-se entre eles.
Mas o coração de Tomás estava cheio de desejo e coragem. Aproximou a mão, hesitando apenas por um instante. Quando os seus dedos tocaram o primeiro novelo, algo extraordinário aconteceu, uma luz intensa surgiu da fraga, envolvendo-o como uma tempestade dourada. Sons de risos e lágrimas, vozes de tempos antigos, enchiam o ar. O jovem sentiu-se puxado para dentro da tecelagem, como se o tear não fosse apenas de ouro, mas de tempo, memórias e destinos.
A princesa Moura parou e ergueu-se, sua figura radiante e imponente:
- Vês, mortal, o que desejas não é simples curiosidade. O tear guarda o passado e o futuro de Outeiro. Quem ousa tocá-lo deve carregar o seu peso.
Tomás, aterrorizado e maravilhado, viu imagens de soldados a invadir o castelo, da fuga desesperada da princesa, das lágrimas da aia, e de aldeões desconhecidos cujas vidas se entrelaçavam com aquelas memórias. Os fios de ouro pulsavam com histórias que ele nunca poderia imaginar, mas agora compreendia que eram preciosas demais para qualquer toque humano.
Com um gesto delicado, a Moura afastou a sua mão e o jovem foi lançado suavemente para trás, sobre as pedras da fraga. Ele olhou para ela, agora serena, mas os olhos brilhavam com uma tristeza infinita.
- Lembra-te, Tomás, disse ela, enquanto a névoa começava a envolvê-la novamente - nem todo tesouro é para ser possuído. Alguns existem apenas para serem lembrados, sentidos e respeitados.
O som do tear diminuiu até tornar-se quase inaudível, misturando-se ao murmúrio da água. Tomás voltou à aldeia, com o coração carregado de mistério, mas também de reverência. Desde aquela noite, ninguém se atreveu a tocar nos novelos de ouro. Mas quem se aproxima da fraga ainda pode ouvir o ritmo suave do tear, sentindo a presença eterna da princesa Moura, que guarda o seu segredo e tece, noite após noite, os fios dourados de uma história que jamais termina.
continua...
N.B.: Este conto teve como base a Lenda de Outeiro "A Moura Encantada" e a colaboração, na construção do "esqueleto", da IA. A narrativa e os personagens fazem parte do mundo da ficção. Qualquer semelhança com acontecimentos ou pessoas reais, não passa de mera coincidência.

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