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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

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COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite, Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues, João Cameira e Rui Rendeiro Sousa.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 23 de dezembro de 2025

O Natal era mesmo diferente no Nordeste… «Galhofas», «Loas», «Pandorcas» e «Pastoradas»…

Por: Rui Rendeiro Sousa
(Colaborador do "Memórias...e outras coisas...")


 Como já por aqui venho trazendo, as celebrações natalícias, pelas bandas nordestinas, eram muito diferentes, até ao século XIX, misturando-se práticas milenares de origem pagã com as equivalentes religiosas. Práticas estas que não eram exclusivas do Povo, também eram comuns no seio do Clero!

Desde recuadas épocas, a Igreja procurou erradicar os costumes pagãos que se mantinham entre os cristãos, nomeadamente aqueles que se relacionavam com este período do ano. É surpreendente verificar a forma como, desde os primórdios, surgem essas tentativas. Por primórdios se entendendo que já os primeiros teólogos, ainda no século III, se pronunciavam contra o enraizamento das «Saturnálias» ou das «Festas das Calendas» entre as comunidades de cristãos! Críticas que se vão acumulando nesses primeiros séculos do Cristianismo, quer por parte de entidades eclesiásticas, como Bispos, ou até o próprio Papa, quer por parte de eminentes teólogos, como são bons exemplos São Jerónimo ou Santo Agostinho. Quem se der ao trabalho de investigar essas épocas recuadas, no que à História da Igreja se refere, deparar-se-á com inúmeras referências a críticas ao «modus operandi» das comunidades, particularmente no que aos jovens dizia respeito. Jovens que, neste período natalício, entravam em cerimoniais de fecundidade, com uma enorme carga erótica, por exemplo se disfarçando com peles ou chifres de animais, o que era considerado imoral. 

No que ao território actualmente português diz respeito, desde o século VI, quer através do emanado pelos Concílios realizados em Braga, quer, especialmente, por intermédio da acção de São Martinho de Dume, são condenadas todas as práticas enraizadas no Povo, nomeadamente aquelas que conduziam a ajuntamentos, como o eram as já então comuns refeições comunitárias por esta época (as que permanecem vivas na «Mesa de Santo Estêvão»!!!), que eram epitetadas como «culto ao diabo», ou a manutenção dos festejos das «Calendas», que eram considerados «perversos». Parece, no entanto, que estas sucessivas condenações não surtiram efeito, permanecendo os festejos arreigados nos costumes populares. Ainda no século VII, Santo Isidoro de Sevilha nos deixa uma valiosa descrição acerca da forma como eram festejadas as «Calendas», por esta época.

Continuariam, todavia, através do emanado por diversos Concílios, por Capítulos de Visitação, ou através de Pastorais dos Bispos, a ser condenados estes festejos. Sendo incrível que as «condenações» se prolonguem, consecutivamente, até ao século XIX! O que significa que o Povo, neste aspecto em particular, não se amedrontava com os «castigos divinos», com as «multas pecuniárias» ou com as «censuras», através dos quais era ameaçado. Sendo surpreendente que a sequência de escritos relativos aos festejos desta época natalícia, abranja um vasto território, aí incluídas algumas dioceses espanholas, aqui se destacando a mais próxima de Zamora, onde os costumes eram idênticos. No caso particular do Nordeste, a documentação relativa a este tema apenas começa a surgir a partir da elevação de Miranda do Douro a Diocese, que até ao século XVI esta região era demasiadamente excêntrica em relação ao Arcebispado de Braga, que apenas pretendia os rendimentos que daqui advinham… 

Incrível sendo que, desde o século XVII, até ao final do século XIX, ou seja, ao longo de mais de 200 anos (!!!), se vão acumulando as «proibições», por parte de diversos Bispos de Miranda (e posteriormente, de Bragança), relativamente aos festejos que ocorriam por esta época. Festejos esses que, para lá das «Festas de Santo Estêvão» e das «Mascaradas», incluíam… «Galhofas», «Loas», «Pandorcas» e «Pastoradas».

Já cá as trarei amanhã, para isto não ficar muito longo, e para terminar esta superficial abordagem às tão nossas «Festas de Inverno», «Mascaradas de Inverno», «Festas dos Rapazes» ou «Festas de Santo Estêvão», reminiscências de cultos de imemoriais tempos… 

É tão fascinante o tanto que somos e temos! Mais fascinante sendo o diferente que somos, não melhores, nem piores, mas muito diferentes… E tenho tanto orgulho nisso! 

(Foto: Aníbal Gonçalves)


Rui Rendeiro Sousa
– Doutorado «em amor à terra», com mestrado «em essência», pós-graduações «em tcharro falar», e licenciatura «em genuinidade». É professor de «inusitada paixão» ao bragançano distrito, em particular, a Macedo de Cavaleiros, terra que o viu nascer e crescer. 
Investigador das nossas terras, das suas história, linguística, etnografia, etnologia, genética, e de tudo mais o que houver, há mais de três décadas. 
Colabora, há bastantes anos, com jornais e revistas, bem como com canais televisivos, nos quais já participou em diversos programas, sendo autor de alguns, sempre tendo como mote a região bragançana. 
É autor de mais de quatro dezenas de livros sobre a história das freguesias do concelho de Macedo de Cavaleiros. 
E mais “alguas cousas que num são pr’áqui tchamadas”.

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