Albino Lopo, autor da primeira monografia sobre Bragança |
Após a implantação definitiva do Liberalismo em Portugal (1834) e até ao Estado Novo (1926-1974), verificamos paradoxalmente que as principais famílias e políticos que detinham o poder em Bragança e seu Distrito não eram naturais da Cidade e seu Concelho.
Assim, os Pessanhas (progressistas) e os Charulas (regeneradores), que tiveram grande influência política no Nordeste Trasmontano, quer como deputados, quer como governadores civis, e que chegaram a unir-se por casamento, eram grandes proprietários dos concelhos de Macedo de Cavaleiros e de Mirandela.
Adrião Martins Amado, Governador Civil e Presidente da Comissão Executiva Municipal |
Júlio do Carvalhal de Sousa Teles, Governador Civil de Bragança por duas vezes (1846 e 1856), deputado entre 1860 e 1871, em cujas funções se notabilizou pela defesa dos interesses económicos de Trás-os-Montes e da absoluta necessidade da criação de uma rede viária na região, era de Valpaços.
Pedro Campilho, que por mais de 50 anos arvorou a bandeira do Partido Progressista no Distrito de Bragança, era de Vinhais.
Jerónimo Barbosa de Abreu Lima, Governador Civil de Bragança por duas vezes, entre 1861-1863 e 1870-1871, deputado entre 1861 e 1871, assim como os seus dois filhos, que também foram deputados, eram de Alijó e Vila Real.
Adriano José de Carvalho e Melo, Governador Civil de Bragança (1873-1877), que criou na Cidade, em 1876, um corpo de polícia civil, era do Marco de Canaveses.
Artur Lopes Cardoso, várias vezes deputado e ministro |
Albino dos Santos Pereira Lopo, o primeiro autor de uma monografia sobre Bragança, a sua Bragança e Benquerença, de 1898, nasceu no Mogadouro.
Álvaro de Mendonça Machado de Araújo, Governador Civil de Bragança entre 1904-1906, e Presidente da Câmara Municipal de Bragança entre 1893-1896, em cujas funções, segundo Francisco Manuel Alves, “prestou relevantes serviços”, era de Mirandela.
Adrião Martins Amado, Presidente da Câmara Municipal, Governador Civil do Distrito, e reitor do Liceu de Bragança durante 18 anos – aquele que esteve mais tempo no exercício destas funções –, era de Vimioso.
João José de Freitas, o primeiro Governador Civil republicano de Bragança, assim como seu irmão, António Luís de Freitas, que também exerceu as mesmas funções em 1911, eram de Carrazeda de Ansiães.
Artur Lopes Cardoso, deputado e ministro por várias vezes entre 1915 e 1925, membro do Partido Republicano Português, depois, do Partido Reconstituinte e, finalmente, chefe do Partido Nacionalista no Distrito de Bragança, a quem se deve a fundação da Escola Industrial de Bragança, como seu irmão António Lopes Cardoso, que também foi deputado, pertenciam a uma família de Moncorvo, apesar de um e outro aí não terem nascido.
Oriundos de Bragança e do seu Município, entre 1834 e 1926, ou seja, durante o Constitucionalismo Monárquico e a Primeira República, tiveram protagonismo local João António Pires Vilar, os irmãos Sá Vargas (a família Vargas após 1834, com a venda dos bens nacionais adquiriu “os melhores prédios rústicos e urbanos vinculados em Bragança”) e Abílio Beça.
João António Pires Vilar, além de reitor do Liceu Nacional de Bragança, deputado entre 1880 e 1890 e fiscal da Câmara Municipal – não foi Presidente do Município, ao contrário do que afirma Francisco Manuel Alves –, esteve por trás da criação do Asilo Duque de Bragança e da publicação, em 1864, do primeiro Código de Posturas Municipais para a Cidade de Bragança e seu Concelho, o qual se manteve até 1891, quando se publicou um novo Código de Posturas Municipais do Concelho de Bragança.
José Marcelino de Sá Vargas, corregedor da Comarca de Bragança em 1834, cabralista na primeira fase da sua vida política e mais tarde regenerador, deputado e ministro por várias vezes entre 1834 e 1874, par do Reino a partir de 1875, assim como seu irmão Diogo Albino de Sá Vargas, Governador Civil de Bragança (1871-1872), notabilizaram-se também na defesa da Cidade e do Distrito a que pertenciam.
João José de Freitas, primeiro Governador Civil de Bragança após o 5 de Outubro de 1910, e seu irmão, António Luís de Freitas, que exerceu as mesmas funções imediatamente a seguir |
Em 1888, tomou a direção do jornal O Brigantino, e acabado este, fundou a Gazeta de Bragança, semanário regenerador que manteve até à sua morte, vítima de um acidente do comboio pelo qual tanto lutara.
Foi Presidente da Câmara Municipal de Bragança (1896-1897 e 1908-1910), deputado (1894-1910) e Governador Civil de Bragança (1900-1904).
Defensor intransigente dos interesses da Cidade e do seu Distrito, insurgiu-se em 1898 1899 contra a transferência da alfândega de Bragança para Quintanilha e a retirada das unidades militares da Cidade; criou numerosas escolas de instrução primária em Bragança e seu Distrito, e a escola do Magistério Primário de Bragança; mandou construir o palacete destinado ao Governo Civil e, mais tarde, no seu rés-do-chão, ali alojou a polícia; obteve os meios necessários para a construção de vários edifícios escolares, e para a reparação e abertura de novas estradas no Distrito e impulsionou a construção da ponte internacional sob o Rio Maçãs, Quintanilha, em 1904-1905.
Francisco Manuel Alves refere que Abílio Beça “tinha a religião do civismo e a intuição clara dos melhoramentos que a podem afervorar”; que era “incansável em promover o engrandecimento desta região”, quando o seu partido, o Partido Regenerador, estava no poder, mas que, quando se encontrava na oposição, era “o primeiro na vanguarda a sugerir o que convinha”, acima dos interesses partidários. Marcou de tal forma a vida de Bragança na viragem do século XIX para o século XX que, mais tarde, Águedo de Oliveira irá referir-se a esse tempo como a “Bragança de Abílio Beça”.
Refira-se ainda que Abílio Beça teve três irmãos que também contribuíram para o seu protagonismo regional e para a defesa dos interesses de Bragança: Adriano Beça, oficial do Exército (monárquico, chegando a general com o Sidonismo) e deputado em 1906; José António Ferro Madureira Beça, engenheiro, deputado (1901-1902) e que esteve ligado à construção da linha férrea de Mirandela a Bragança; e Celestino Jacinto de Madureira Beça, oficial do Exército, que exerceu o cargo de Administrador do Concelho de Bragança (e de outros concelhos do Distrito), e primeiro comandante dos Bombeiros Voluntários de Bragança. Era ainda primo de Desidério Augusto Ferro de Beça, que foi Governador Civil de Bragança (1919).
Com a morte do conselheiro Abílio Beça, em 1910, no mesmo ano, aliás, em que morreu o irmão Celestino de Madureira Beça, a família Beça deixa de ter o relevante protagonismo político que manteve em Bragança nas últimas três décadas da Monarquia.
Com o Estado Novo, a liderança política local e regional passou a ser exercida por delegação do “chefe”, ou seja, de Oliveira Salazar, uma vez que era ele, como diz Águedo de Oliveira, que escolhia os dirigentes. Entre 1926 e a Segunda Guerra Mundial (1936 1945), o protagonismo político passou a ser exercido quase exclusivamente pelo Governador Civil, o qual, segundo Águedo de Oliveira, devia ter o seguinte perfil: “que viva a doutrina de Salazar”. Daí que, em obediência a tal princípio, sejam os militares nomeados como governadores civis e presidentes da Câmara de Bragança a monopolizarem o domínio da vida política, tendo como objetivo fundamental a consolidação da Ditadura. Aliás, como alguns “notáveis” referem, “o chefe político do Distrito”, “em permanente obediência” a Salazar, era Águedo de Oliveira, natural de Moncorvo, a viver em Lisboa, o qual foi o principal responsável pela nomeação para governadores civis dos militares Tomás Cardoso (1926-1931), natural de Valença, e Salvador Nunes Teixeira (1933-1940), oriundo da Sertã, os quais, em tais funções irão escolher, ou no mínimo, indicar os presidentes de Câmara do Distrito.
Em conclusão, torna-se evidente que a liderança política de Bragança, palco privilegiado das lutas políticas do seu Distrito, é assumida fundamentalmente pelos seus governadores civis que, em certas épocas, pelo menos até 1926, são também líderes partidários. Assim sendo, como explicar que as elites do Município de Bragança, pertencentes às famílias tradicionais, detentoras do poder socioeconómico, se tenham afastado do protagonismo político?
Recusa da vida política a nível regional? Aspirações limitadas unicamente ao Município, quer como presidentes, quer como seus administradores? Preferência por enviarem os seus filhos para a carreira militar? Ambição de chegarem a funções governativas, privilegiando o cargo de deputado, e portanto, a vida em Lisboa? Ou a aplicação do princípio de que “santos ao pé da porta não fazem milagres”?
Questões que ficam em aberto, a aguardar nova investigação.
Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa
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