(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Durante o verão, estive na casa de praia. Nas horas de lazer, que eram quase todas, entretinha-me a reorganizar a minha biblioteca de férias, que há muito não o fazia.
Deparei, entre outros livros, a colectânea de crónicas do conhecidíssimo jornalista: Agostinho Campos (“Jardim da Europa” - Edição Alaud e Bertrand - Lisboa, 1919)
Abri, a obra, ao acaso, e encontrei referencias a velho abade da Igreja de Santo Ildefonso, no Porto, o Dr. Moreira Freire.
Após tecer rasgado elogios ao insigne sacerdote, como homem e como padre, o cronista, narra curiosas anedotas, ou melhor: ditos espirituosos, do ilustre abade, que corriam, na época, pela cidade do Porto.
Para regalo do leitor portuense, amante das coisas e ocorrências de inilio tempore, vou utilizar a saborosa prosa do grande jornalista e notável linguístico, do início do século XX.:
“ Já nos últimos anos, minado pela dispepsia cujos caprichos dolorosos o faziam dizer que tinha estômaga, o abade saíra à rua pela primeira vez, emagrecido por uma longa crise. Todos o saudaram carinhosamente pela convalescença, e uma das suas ovelhas mais fiéis e mais indiscretas cumprimentou-o desta maneira:
“ Muito folgo, Sr Abade, de o ver outra vez restabelecido. De mais a mais alguém me disse que V. Revª não tinha cura.
“- Enganaram-na, minha senhora: tenho duas curas, respondeu logo o Dr. Moreira Freire.
“ De outra vez, numa sala, em conversa ligeira, certa dama queixava-se da injustiça com que os homens acusavam as mulheres de curiosidade. E, voltando-se para ele, perguntou-lhe de chofre:
“ - Não é verdade, Sr. Abade, que os homens são tanto ou mais curiosos do que as mulheres? …
“ - Os homens mais curiosos são os padres no confessionário. Mas é prudente não esquecer que são homens… vestidos de saias.”
Consta que o Dr. Moreira Freire, foi sacerdote exemplar e irrepreensível. Possuía grandes virtudes, e era bastante modesto, a ponto de recusar honras e distinções, que lhe quiseram dispensar.
Nos tempos prosaicos, que correm, nem sempre é fácil topar sacerdote de semelhante quilatar. É pena…para bem da Igreja e dos fieis.
Humberto Pinho da Silva nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA. Foi redactor do jornal: “NG”. e é o coordenador do Blogue luso-brasileiro "PAZ".
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