Devido à instabilidade política que se fez sentir tanto em Portugal como em Espanha, durante grande parte do século XIX, com as sucessivas e recíprocas passagens da fronteira, solicitadas ou forçadas por parte de militares, as autoridades de Bragança e Zamora foram chamadas a intervir numerosas vezes para apoiarem ou impedirem tais movimentações.
Para além do cumprimento das diretrizes legais emanadas do Governo para combater a agitação política, o Governo Civil de Bragança preocupou-se com a apreensão de material de guerra clandestino que circulava entre Portugal e Espanha, e a retenção da correspondência suspeita e folhetos comprometedores, com o fim de obter informações sobre a identificação de possíveis agitadores e revoltosos residentes ou a circular no Distrito, nomeadamente espanhóis.
Mas não só. Conhecer o trânsito militar, dada a constante mobilidade de tropas que espontaneamente passavam a fronteira; angariar grupos de informadores credíveis; obter o apoio das populações; solicitar o aumento e o reforço dos destacamentos militares fixados em Bragança; nomear comissários especiais a enviar a Espanha para recolherem informações válidas; rever a forma de estabelecer as comunicações postais, recorrendo a correios especiais alternativos e confidenciais, eis algumas das providências mais significativas dos magistrados administrativos bragançanos ao serviço do Governo.
A correspondência do Governo Civil de Bragança reflete tais preocupações, sensível às recomendações “que lhe são feitas para evitar que no seu Distrito, e em especial na Cidade de Bragança, se conspire contra o Governo do Reino vizinho, ou que nas povoações fronteiriças permanecessem “carlistas” ou outros “indivíduos suspeitos”, desenvolvendo a maior vigilância e fiscalização sobre os espanhóis que entravam ou saíam do Reino, uma vez que eram “responsáveis pelas faltas ou omissões” que cometessem “no perturbar da ordem pública da Espanha”.
Em ordem a cumprir as instruções dadas pelo Governo português, o Governo Civil de Bragança vai estar atento à entrada e permanência de espanhóis na Cidade e seu Distrito, aos refugiados políticos e militares, aos desertores militares portugueses e espanhóis, e à circulação de negociantes, almocreves, trabalhadores rurais, mendigos, vagabundos e criminosos.
O que estava em causa, fundamentalmente, eram as entradas ilegais dos “súbditos espanhóis sem virem munidos de passaporte das autoridades competentes” do Estado espanhol, “a fim de se evitar deste modo a nociva introdução de bandidos malfeitores e criminosos evadidos à perseguição que lhes move a justiça do seu país”.
Não o direito de circulação e permanência de espanhóis em Bragança durante o período de Oitocentos, que era garantido pela ideologia liberal e salvaguardado pelas disposições legais de ambos os países.
A lei portuguesa concedia até a naturalização dos espanhóis legalmente residentes em Portugal, uma vez cumpridos os requisitos estabelecidos para o efeito, sendo a indicação do concelho e localidade em que se fixavam livremente o elemento prioritário. Com tal objetivo, foi assinada uma Convenção Peninsular, em 13 de janeiro de 1869, para regular a extradição de cidadãos de ambos os países, e uma Convenção Consular, em 21 de fevereiro de 1870, onde se consignaram os pressupostos para garantir o direito de residência de portugueses em Espanha e de espanhóis em Portugal. A mesma determinava que “os súbditos de um e outro Estado que queiram dedicar-se ao comércio ou estabelecer-se para qualquer fim, nos países respetivos, deverão prover-se de um certificado de matrícula com que justifiquem a sua qualidade de portugueses ou espanhóis, o qual lhes será passado pelos agentes diplomáticos ou consulares do seu país, à vista dos documentos que comprovem a sua nacionalidade”.
Este certificado seria visado pelas autoridades territoriais competentes e serviria de título ao que o possuir, “para justificar a sua nacionalidade e identidade da pessoa por atos que tiver de praticar, quer perante os agentes da sua nação, quer junto das autoridades do País. Sem a apresentação do referido certificado de matrícula, as autoridades portuguesas não consentirão em caso algum a residência de espanhóis em Portugal, nem as autoridades espanholas a dos portugueses em Espanha”.
CONTINUA...
Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa
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