Na nossa Escola Primária, havia muita disciplina mas também muito espaço para o divertimento para as artes e para o desporto, talvez não muito organizado, mas acima de tudo tínhamos tempo para brincar. A escola era governada internamente pela Professora, sem ver “estranhos” a intrometerem-se sem saberem do que estavam a falar e sem conhecerem as realidades locais, como hoje em dia fazem os iluminados sentados nas poltronas dos gabinetes na capital, convencidos de que sabem do que estão a falar.
Na sala de aula e aparentemente, não se distinguiam as crianças mais abastadas das que tinham no seio dos seus agregados familiares mais dificuldades económicas. Todos vestiam a bata branca. Na escola só havia rapazes. As raparigas iam para a escola do Loreto…
As diferenças verificavam-se nos pormenores.
Afinal o que me faltava e que eu efectivamente precisasse? Nada, não me faltava nada. Talvez umas sapatilhas mas…com que dinheiro se compravam?
Na escola havia os “meninos bonitos” e os outros.
Lembra-me de uma camisola de lã azul escura que a minha mãe costurou e que estava sempre impecavelmente lavada. Só me lembra daquela e, provavelmente, não teria outra. As unhas cortadas para não se ver o negro da terra entre elas, as orelhas lavadas. A minha Mãe lavava a camisola à noite para eu vestir de manhã. A camisola estava sempre lavada. A Senhora Professora inspeccionava as orelhas dos alunos todos os dias.
Mas será que algum dos meus colegas mais humildes tinha corta unhas? Claro que não. As famílias individualmente não tinham nem apoios de ordem económica nem de ordem psicológica e muito menos acesso à informação. A escola era um “bunker” para professores e alunos. A escola era um mundo à parte, mas respeitado.
As "carteiras" em madeira com o tampo que levantava, para em baixo se colocarem os livros que não estavam a ser utilizados e com o tinteiro de porcelana embutido, eram para um aluno. Ai do aluno que fosse visto a riscar ou a escrever no tampo da secretária. Ninguém escrevia, mas lá que os hieróglifos apareciam, lá isso apareciam. Os coraçõezinhos com as respectivas setas, as caricaturas da professora, mas sempre feitas nas secretárias dos outros colegas para defendermos o nosso território e nos ilibarmos de culpa. Faltava era a cor. Só havia lápis de carvão, giz e a caneta de tinta, mas já era uma evolução comparando com a pena de ganso do Fernando Pessoa.
Quando apareceram as primeiras esferográficas e passaram a ser permitidas na escola…aí sim…foi um apelo à actividade criativa nos tampos das secretárias e no interior das portas das casas de banho.
Na sala de aula, por cima do quadro negro de lousa e a ladear a cruz de Cristo crucificado, estavam sempre omnipresentes os quadros com as fotografias do Presidente da República e do Presidente do Conselho de Ministros.
A sala estava bem apetrechada. Mapas do mundo, mapas de Portugal Continental Insular e Ultramarino, com os rios bem marcados, os caminhos-de-ferro, os montes e as serras. Tínhamos de saber tudo de cor e salteado.
Só não tínhamos o Magalhães…
Eu era um bom aluno. Uma vez, na terceira classe errei uma conta. A Profª Lurdes não esteve “pelos ajustes” e o puxão de orelhas foi tão forte, que me deixou as ditas cujas negras. Lembra-me de ter chorado com as dores. Quando cheguei a casa ouvi o inevitável “bem feita”, devias ter levado mais.
Os “papás” não tinham, ao tempo, a pretensão de substituir os Professores na sua missão e muito menos consideravam a escola um depósito onde podiam deixar os filhos para poderem “andar a laurear o queijo”.
As diferenças verificavam-se nos pormenores.
Afinal o que me faltava e que eu efectivamente precisasse? Nada, não me faltava nada. Talvez umas sapatilhas mas…com que dinheiro se compravam?
Na escola havia os “meninos bonitos” e os outros.
Lembra-me de uma camisola de lã azul escura que a minha mãe costurou e que estava sempre impecavelmente lavada. Só me lembra daquela e, provavelmente, não teria outra. As unhas cortadas para não se ver o negro da terra entre elas, as orelhas lavadas. A minha Mãe lavava a camisola à noite para eu vestir de manhã. A camisola estava sempre lavada. A Senhora Professora inspeccionava as orelhas dos alunos todos os dias.
Mas será que algum dos meus colegas mais humildes tinha corta unhas? Claro que não. As famílias individualmente não tinham nem apoios de ordem económica nem de ordem psicológica e muito menos acesso à informação. A escola era um “bunker” para professores e alunos. A escola era um mundo à parte, mas respeitado.
As "carteiras" em madeira com o tampo que levantava, para em baixo se colocarem os livros que não estavam a ser utilizados e com o tinteiro de porcelana embutido, eram para um aluno. Ai do aluno que fosse visto a riscar ou a escrever no tampo da secretária. Ninguém escrevia, mas lá que os hieróglifos apareciam, lá isso apareciam. Os coraçõezinhos com as respectivas setas, as caricaturas da professora, mas sempre feitas nas secretárias dos outros colegas para defendermos o nosso território e nos ilibarmos de culpa. Faltava era a cor. Só havia lápis de carvão, giz e a caneta de tinta, mas já era uma evolução comparando com a pena de ganso do Fernando Pessoa.
Quando apareceram as primeiras esferográficas e passaram a ser permitidas na escola…aí sim…foi um apelo à actividade criativa nos tampos das secretárias e no interior das portas das casas de banho.
Na sala de aula, por cima do quadro negro de lousa e a ladear a cruz de Cristo crucificado, estavam sempre omnipresentes os quadros com as fotografias do Presidente da República e do Presidente do Conselho de Ministros.
A sala estava bem apetrechada. Mapas do mundo, mapas de Portugal Continental Insular e Ultramarino, com os rios bem marcados, os caminhos-de-ferro, os montes e as serras. Tínhamos de saber tudo de cor e salteado.
Só não tínhamos o Magalhães…
Eu era um bom aluno. Uma vez, na terceira classe errei uma conta. A Profª Lurdes não esteve “pelos ajustes” e o puxão de orelhas foi tão forte, que me deixou as ditas cujas negras. Lembra-me de ter chorado com as dores. Quando cheguei a casa ouvi o inevitável “bem feita”, devias ter levado mais.
Os “papás” não tinham, ao tempo, a pretensão de substituir os Professores na sua missão e muito menos consideravam a escola um depósito onde podiam deixar os filhos para poderem “andar a laurear o queijo”.
A escola era considerada e respeitada por toda a sociedade.
Foi na escola primária que em mim despertou o gosto pela representação, pelo teatro e que ainda hoje me acompanha. A escola não vivia na penumbra e não era tão macabra como alguns ainda hoje pensam. Apesar de vivermos num regime ditatorial que se quis, por puro egoísmo e falta de visão, isolar do mundo e passar cinco décadas a olhar para o próprio umbigo, os intervenientes no terreno iam fazendo os possíveis com a imaginação que tão bem caracteriza o povo português.Não me lembra de ter passado fome dia nenhum. No almoço de Domingo, tínhamos quase sempre bife ou frango assado com batatas fritas. O bife era pequenino, é certo, mas era um bife. Se as finanças familiares estavam mais em baixo, umas batatas fritas e uns ovos estrelados sabiam pela vida.
Foi na escola primária que em mim despertou o gosto pela representação, pelo teatro e que ainda hoje me acompanha. A escola não vivia na penumbra e não era tão macabra como alguns ainda hoje pensam. Apesar de vivermos num regime ditatorial que se quis, por puro egoísmo e falta de visão, isolar do mundo e passar cinco décadas a olhar para o próprio umbigo, os intervenientes no terreno iam fazendo os possíveis com a imaginação que tão bem caracteriza o povo português.Não me lembra de ter passado fome dia nenhum. No almoço de Domingo, tínhamos quase sempre bife ou frango assado com batatas fritas. O bife era pequenino, é certo, mas era um bife. Se as finanças familiares estavam mais em baixo, umas batatas fritas e uns ovos estrelados sabiam pela vida.
Mas eu compreendia que não podia ter “coisas” que uma minoria de colegas ao tempo possuía. Os meus Pais sempre me deram o que puderam e eu tinha a noção perfeita disso e nada pedia...
HM
(...) -Sim meu caro Senhor e, digno titular deste óptimo blog, também me lembro como era a minha, praticamente idêntica a todas as outras que há muito estão encerradas e bem, pois sem crianças nas aldeias como não fecharem?... No entanto como sabemos, os responsáveis políticos não desenvolveram a região com infraestruturas de produção, nem antes nem depois do 25 de Abril,
ResponderEliminaras vagas de emigração e, migração para o litoral etc. sucederam-se echegámos a esta era sem retorno, pelo menos até que apareça outro "rei povoador". Voltando às escolas lembro-me que, em muitas das freguesias, compostas quase todas por duas/três/quatro aldeias só uma tinha edifício escolar, alimentação só em casa e a merendinha que as mães ou outros familiares preparavam e os alunos transportavam a pé, não havia transportes as distâncias eram dois/três ou mais quilómetros para cada lado, as aldeias e as escolas não tinham água canalizada nem energia....Fico-me por aqui, as novas gerações...podem imaginar o sofrimento que passamos...
-Aceite Senhor, um abraço amigo deste antigo Soldado de Abril, obrigado pelo seu trabalho.