Corria o ano de 1637, um ano de pestilência fome e pobreza em Portugal! Bragança era na altura um local de grandes bruxarias. A paisagem montanhosa , agreste e sombria bem como as rotas do contrabando que por aqui passavam, davam a cobertura perfeita para a prática de rituais sombrios nas pequenas aldeias. Martim era uma pequena localidade a poucos quilómetros de Bragança em plena serra da Nogueira. Tem marcada na sua história uma dos muitos acontecimentos macabros de Trás-os-Montes. Em 1623 nasceu nessa aldeia uma menina chamada Salma. Ela era como todas as crianças pobres da aldeia, muito infeliz. Teve que trabalhar no campo desde tenra idade para poder comer ao fim do dia. Levava uma vida sem alegrias.
Em 1635, no dia de aniversário da Salma, chegou à aldeia uma idosa envolta em vestes pretas, acompanhada de uma vaca que puxava uma carroça. A população atónita tentou falar com ela, mas esta nunca lhes respondeu. Montou a sua barraca a algumas centenas de metros da aldeia e aí se fechou. Durante o dia nunca se ouvia barulho da barraca, só de noite se podia escutar gritos e barulhos irreais bem como luzes vindos da barraca.
Desde o momento em que a velha chegou à aldeia de Martim que Salma se começou a comportar de uma forma esquisita. Era costume acordar de noite aos gritos, transpirada e a falar línguas que os seus pais não conheciam. Passaram-se certos fenómenos na pequena aldeia, árvores majestosas começavam a definhar e secavam ficando negras, alguns animais apareciam muribundos e acabavam por morrer no centro da aldeia, pássaros sobrevoavam em círculos os outrora verdes prados, agora completamente secos. A vila, em tempos solarenga estava agora constantemente mergulhada num nevoeiro denso.
A população começou a temer a velha bruxa e todos os estranhos acontecimentos que com ela chegaram e assim, após reunião os aldeões planearam matar a bruxa na noite seguinte.
Ao raiar do Sol, Salma levantou-se da cama e saiu de casa. Caminhou descalça na bruma com o seu vestido de noite branco e desapareceu pelo trilho conducente à barraca. O seu pai tentou correr atrás dela, mas foi impedido pelos aldeões. Para desespero da família, Salma não mais apareceu.
O relógio da capela bateu a meia noite quando toda a aldeia se dirigiu para a barraca da velha, munidos com archotes, forquilhas e gadanhas. A poucos metros da macabra tenda, o pai de Salma encontrou o seu pequeno pendente caido no chão. Tinha lhe sido oferecido por ele. Reluzia na escuridão.
Quando o povo chegou perto da tenda, Salma veio cá fora, estava a levitar, com os braços caidos e o olhar perdido no infinito. Abriu a boca e a sua voz era grutual:
- Vós não sois convidados a esta cerimónia! Ide agora ou para sempre ficai nas trevas!
Um aldeão tentou agarrar nela, mas as suas mãos pegaram fogo mal lhe tocaram na pele. O padre da aldeia começou a rezar ajoelhando-se. Enquanto recitava num murmúrio os olhos de Salma fixaram-se nele. Lentamente, o padre foi perdendo o fôlego. Por fim, numa agonia, o padre caiu asfixiado. Ao ver esta tragédia o povo investiu contra ela. Um a um, todos foram mortos, até que apenas restou o seu pai.
A bruxa apareceu à frente da tenda e disse ao pai numa voz fininha, quase num grito:
- A sua filha está agora nas minhas mãos, será a minha lacaia! Alimentar-se-à da agonia dos outros, será uma serva das trevas. Será uma assombração nesta montanha e ceifará a vida a quem aqui passar ao cair das noites.
Ao dizer estas palavras, a bruxa puxou de uma faca e cortou a cabeça ao pobre homem. Salma, ainda a levitar, dirigiu-se para a floresta e desapareceu no nevoeiro.
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