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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sexta-feira, 24 de junho de 2022

Muita tradição, arte e boa comida em Bragança

A maior cidade da Terra Fria transmontana é um postal com um castelo dentro, que merece que se entre por ele para sentir na pele a boa energia desta terra mimosa. Bragança dá-nos o que esperamos de Trás-os-Montes: o consolo de bem comer e bem estar. Em tempo de Entrudo, que aqui é celebrado com tradições milenares, vale a pena redescobrir o canto mais a nordeste de Portugal.


Por Bragança, toda a gente vai dizendo o mesmo, e escolhemos citar Ana Luísa Pereira, coordenadora do Serviço Educativo no Museu Abade de Baçal, para resumir a voz coletiva: «Não há muita gente nesta cidade, mas é um lugar muito bom para viver». É que parece isso mesmo, de facto, quando se começa a passear pelo centro histórico, percorrendo as margens do rio Fervença transformadas em sala de estar, ou se dá uma volta pelo Largo da Sé, e se vai daí ao castelo, passando por um belo corredor de museus.

Igreja de São Vicente

No centro histórico, há mercearias tradicionais onde se pode comprar vinho e azeite, alguns produtos transmontanos em versão gourmet e ainda as famosas navalhas do Palaçoulo. Ou as robustas botas transmontanas feitas à mão, penduradas à porta dos sapateiros. Ao mesmo tempo, encontram-se novidades como a Galeria História e Arte, com obras de artistas locais, incluindo as inquietantes esculturas de ferro do próprio dono, o escultor João Ferreira.

Centro de Fotografia George Dussaud

E em geral apreende‑ se a energia boa que emana desses brigantinos como Ana Luísa, que se têm amparado nas boas velhas tradições da sua terra para criar uma oferta de experiências e cultura de travo mais contemporâneo. A cidade parece empenhada em regenerar‑se para uma versão melhorada de si mesma, com muitas das velhas casas solarengas em recuperação, sendo que uma delas estreou recentemente um novo uso, albergando o novo Centro de Interpretação Sefardita do Nordeste Transmontano.

Igreja de São Vicente

Fica na Rua Abílio Beça, percurso incontornável para quem quer conhecer esta Bragança inquieta e parte da escalada que liga a Sé ao castelo. «Esta vai ser a rua cultural de Bragança», diz Jorge Costa, diretor do Centro de Arte Contemporânea Graça Morais (CAC), que fica logo no início da Abílio Beça. Esse futuro, contudo, parece estar já a acontecer. O CAC abriu portas em 2008, depois de anos de para‑arranca, com um projeto de Souto de Moura para a recuperação daquele palacete é, ela mesma, uma obra a apreciar.

Loja História e Arte

O Centro de Arte Contemporânea Graça Morais é dedicado a esta pintora transmontana, mas não só

O centro é primordialmente dedicado à pintora transmontana, mas não só, já que ali estacionam, por exemplo, exposições do Museu de Serralves, no Porto. A obra de Graça Morais é rainha, mas há ainda trabalhos de João Jacinto, Paula Rego, António Carneiro e Julião Sarmento, entre outras, e, a abracá‑las todas, o traço do arquiteto que também se deve seguir para ter a surpresa de, nas traseiras do edifício, sentir que ele invade a rua através de uma caixa de betão e vidro.

Igreja da Misericórdia

Uns metros abaixo, no número 75, entra‑se numa casa recuperada que acolhe um lugar expositivo nascido do encantamento de um fotógrafo francês por Trás-os-Montes. Trata‑se do Centro de Fotografia Georges Dussaud, ele que foi amigo de Miguel Torga, e muitas das fotografias em exibição evocam também essa amizade. Dussaud doou a Bragança o seu espólio de cerca de trezentas fotografias, tiradas entre 1983 e 2014.

Edifício do Museu Abade Baçal e Castelo ao fundo

Na mesma rua, encontra‑se o Museu Abade de Baçal e em poucos lugares haverá tanto e tão variado para ver, mercê das coleções próprias e de parcerias com entidades como o Museu da Presidência. Lá dentro, além de mais um magnífico palacete recuperado para conhecer a partir das entranhas, há coleções de arte sacra, porcelana e arte contemporânea, com obras de Abel Salazar e Almada Negreiros.

O Museu Ibérico da Máscara e do Traje exibe dezenas de máscaras tradicionais de Bragança e da região.

Dali, é seguir até chegar ao castelo, admiravelmente preservado, valendo bem a pena uma visita ao Museu Militar situado numa das torres, que se vai subindo à laia de viagem no tempo através das armas e outras peças da vida defensiva da nação, desde a constituição do reino até à II Guerra Mundial. E ainda, dentro da cidadela, sair‑se encantado do pequenino Museu Ibérico da Máscara e do Traje, que exibe dezenas de máscaras tradicionais de Bragança e da região.

E visto o que há que ver, outras lides prazerosas levam-nos à outra banda da cidade, passando por um novo lugar onde comer pratos feitos de cogumelos da região, em ambiente de simplicidade, criado por dois amigos e um cozinheiro suíço inspirado – o Batoque. E subir a encosta para a pousada, onde outros brigantinos dão asas à sua inquietação criativa, com os pés bem assentes na sua terra.

António e Óscar Gonçalves, filhos do casal fundador d’O Geadas, um dos restaurantes mais antigos e bem referenciados. Os dois filhos – o mais velho, chefe de cozinha, o outro, gestor hoteleiro – decidiram catapultar a marca de família para outro patamar. Em parceria com o grupo Pestana, assumiram há dois anos a gestão da Pousada de São Bartolomeu, um edifício de 1959, projetado pelo arquiteto João Loureiro numa encosta de Bragança de onde se avista, com privilégio, o castelo e o centro histórico de todos os quartos, tal como das janelas do Restaurante G – onde fizeram o investimento de algum risco de criar cozinha de autor, apenas assente em produtos regionais de alta qualidade.

A Pousada de São Bartolomeu está num edifício de 1959, projetado pelo arquiteto João Loureiro

Restaurante G na Pousada de S. Bartolomeu

É uma viagem sensorial à terra que produz pão e azeite – os básicos por onde começa a degustação –, cogumelos, carnes autóctones, frutos secos, ervas aromáticas e vegetais, alguns deles recuperados de usos passados, todos escolhidos a dedo, matéria-prima para as composições de Óscar. António, por seu turno, faz as honras da sala, sendo um prazer escuta-lo contar a história e a origem de cada ingrediente.

Circulando pela pousada, dá igual gosto ouvi-lo contar pormenores sobre cada objeto, incluindo o mural de azulejos de Júlio Resende, antes tapado pela decoração, agora posto em evidência. Se ali, na parte hoteleira, a ideia é preservar o conforto, o estilo e o acolhimento «do início das pousadas», já no G, o que se pretendeu foi uma rutura, passar do «conceito de regionalidade para o conceito de contemporaneidade», como diz António. E o que parece é que fala, afinal, de toda a cidade de Bragança.

Texto Dora Mota - Fotografias de Pedro Granadeiro/GI
26/02/2017
Revista EVASÕES

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