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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 19 de junho de 2021

O que procurar na Primavera: o hipericão-do-Gerês

 A primavera é a estação das cores e dos aromas. As temperaturas amenas e agradáveis favorecem os passeios ao ar livre para apreciarmos o que há de belo na natureza. Os espaços verdes estão em constante mutação e são inúmeras as fragrâncias e cores das flores que vão surgindo ao longo de toda a estação, como as do hipericão-do-Gerês (Hypericum androsaemum) que estão agora a florescer.

Hipericão-do-Gerês. Foto: Agnieszka Kwiecień/WikiCommons

O hipericão-do-Gerês 

O hipericão-do-Gerês – também conhecido como androsemo, erva-da-pedra, erva-mijadeira ou mijadeira – é uma importante espécie medicinal da família Hypericaceae, uma família cosmopolita (tem uma distribuição por quase todo o mundo), distribuindo-se pelas regiões temperadas a tropicais.

Em Portugal é representada apenas por espécies do género Hypericum. São 11 as espécies indígenas ou naturalizadas presentes em Portugal Continental, quatro no Arquipélago da Madeira e quatro nos Açores.

É uma planta vivaz, de porte arbustivo, de caules erectos, herbáceos que se tornam lenhosos com a idade e que pode crescer até 1,2 m de altura. 

Os ramos, de crescimento abundante, são densamente revestidos de folhas de verde clara, simples, decussadas (dispostas em cruz), sésseis (sem pecíolo) e em geral amplexicaules (folha cuja base envolve parcialmente o caule, sem o cercar totalmente). O limbo tem forma ovada a lanceolada e margem inteira. 

As flores são amarelas a douradas, com cerca de dois centímetros de diâmetro e surgem entre junho e setembro, agrupadas em inflorescências do tipo cimeira corimbosa. A corola é dialipétala, actinomorfa e composta por cinco pétalas. O cálice tem cinco sépalas livres, mais pequenas do que as pétalas. Os estames são amarelos e quase tão compridos como as pétalas.

O fruto é carnudo, tipo baga, quase esférico, indeiscente e monospérmico, avermelhado quando jovem e negro quando maduro. As sementes, com cerca de um milímetro, são aladas e pardo-escuras.

Origens e condições edafo-climáticas

O hipericão-do-Gerês é uma espécie de características atlânticas, nativo da região Mediterrânica, oeste e sul da Europa, norte do Irão e noroeste de África. 

Em Portugal podemos encontrar esta espécie na faixa norte e centro litoral, nas regiões do Minho, Beiras e Estremadura. No entanto também pode ocorrer esporadicamente na Serra de Sintra, Montejunto, Gardunha, São Mamede e Monchique.

Hipericão-do-Gerês. Foto: Krysztof Ziarnek/WikiCommons

O hipericão-do-Gerês é das poucas plantas portuguesas com o nome de uma região, onde ocorre de forma espontânea, em comunidades herbáceas, no sob coberto de bosques, locais húmidos e sombrios, vales profundos e na margem de linhas de água. 

Esta planta tem preferência por locais sombrios e frescos, embora se adapte a uma boa exposição solar. No entanto, locais com muita sombra diminui a produção de flores. Do ponto de vista edáfico, elege solos ácidos, preferencialmente argilosos, ricos em matéria orgânica, húmidos e bem drenados.

Tolera ventos fortes mas não exposição marítima. É resistente à seca quando já estabelecida e a temperaturas muito baixas, até -20ºc.

É uma planta sensível, particularmente afetada por pragas e doenças, que podem provocar estragos consideráveis nas plantas. Os principais problemas destas plantas são os afídios e a ferrugem.

Medicinal e ornamental

A designação científica desta espécie é bastante particular. O nome no género Hypericum deriva do grego e da combinação de duas palavras, Hyper – que significa “acima” e de – eikon =  “foto”, ou seja, referente ao que está além da imaginação, muito provavelmente devido à grande reputação como planta medicinal. O restritivo especifico androsaemum deriva das palavras gregas andro =” homem” + haima = “sangue” – “sangue de homem”, em referência à seiva da planta e ao suco avermelhado dos frutos quando esmagados (semelhante ao sangue).

Hipericão-do-Gerês. Foto: Krysztof Ziarnek/WikiCommons

O hipericão-do-Gerês é tradicionalmente cultivado pelas suas propriedades medicinais e farmacológicas, sendo uma planta rica em glândulas secretoras de resinas e óleos essenciais. É rico em hipericina (um dos principais constituintes ativos das espécies do género Hypericum e segundo alguns autores pode atuar como um antibiótico e antiviral), taninos e vitamina C.

A parte aérea florida da planta é a mais utilizada, sendo-lhe atribuída propriedades sedativas, diuréticas, digestivas, antidepressivas, hepatoprotetoras e cicatrizantes.

A infusão de folhas e flores secas de hipericão-do-Gerês funciona como um tranquilizante natural e é utilizada no tratamento de perturbações nervosas, insónias, depressões, doenças hepáticas e digestivas. Externamente ajuda a cicatrizar feridas, a tratar queimaduras e contusões e a evitar a inflamação destas.

Porque todas as plantas têm contraindicações e efeitos colaterais, aconselha-se a supervisão médica na toma desta infusão, uma vez que esta pode interagir com a ingestão de outro tipo de medicação, causando maior ou menor ação dos mesmos, podendo mesmo inibir a sua total eficácia, com consequências negativas para o organismo.

A importância medicinal desta planta tem levado a uma procura e colheita intensiva e desordenada no seu habitat natural o que, se não for rapidamente controlado, poderá colocar a planta em risco de conservação. As populações nativas, silvestres e espontâneas estão a desaparecer de ano para ano.

Além do grande interesse medicinal, a beleza e profusão das suas flores amarelas no final da primavera, tornam esta espécie muito ornamental, sendo muito utilizada em jardins e espaços verdes, em vasos e floreiras, em maciços, como espécie isolada ou em combinação com outras plantas, em taludes, zonas sombrias e húmidas e junto a cursos de água.

Esta planta tem um papel importante para a vida selvagem, sendo uma excelente fonte de alimento para os pássaros, que são atraídos pelos seus frutos e ajudam a dispersar as suas sementes para outros locais.

O hipericão-comum

O hipericão-do-Gerês não deve ser confundido com uma outra espécie do género Hypericum, a erva-de-São-João (Hypericum perforatum), uma das plantas mais divulgadas e estudadas nos últimos tempos, também conhecida como hipericão-comum ou milfurada. 

A erva-de-São-João é uma planta herbácea perene, fácil de distinguir pela presença de grandes glândulas translúcidas nas folhas. 

De grande plasticidade ecológica, desenvolvendo-se em diferentes condições. Surge espontaneamente em orlas de bosques, campos e prados, margens de caminhos, entre outros locais. 

Devido ao consumo generalizado de antidepressivos sintéticos, cada vez mais, se têm procurado alternativas mais naturais. O uso tradicional da erva-de-São-João, como remédio caseiro para combater a depressão leve a moderada, assim como os sintomas associados de ansiedade e tensão muscular, levou a que fosse mais estudada, acabando por confirmar-se que a sua utilização tinha fundamento. 

Esta planta possui diversos compostos bioativos como hiperforina, hipericina, flavonoides, taninos, entre outros.

Histórias e lenda do Hypericum

Na era pré-cristã, o Hypericum foi escolhido pelo Deus Sol nos sacrifícios em sua honra e era visto como a “erva do destino”. Estas crenças estavam associadas às flores e folhas, pois as pontuações translúcidas que se formam nas folhas (glândulas), ao deixar trespassar a luz do sol, formavam pequenos sóis e a cor e forma das flores pareciam simbolizar o Sol. Atribuíram-lhe a capacidade de proteção contra os espíritos malignos, demónios, bruxas e trovões.

Hipericão-do-Gerês. Foto: Salicyna/WikiCommons

Já na era Cristã, numa tentativa de enfraquecer as crenças e tradições pagãs, esta planta foi consagrada a São João Baptista, que terá nascido no dia do Solstício de verão. Segundo a lenda, esta planta terá sido abençoada por São João, tendo-lhe conferido poderes curativos, passando a ser um símbolo cristão. Pendurada em portas e janelas e servindo de marcadores de livros de orações, uma vez mais era vista como planta protetora. 

Outras crenças sugerem que a seiva, quando em contacto com o ar ganha uma tonalidade avermelhada, simbolizando o sangue derramado por São João Baptista.

Lendas à parte, as espécies do género Hypericum são importantes e devemos continuar a preservar os seus habitats naturais para garantir a sustentabilidade das espécies.

Dicionário informal do mundo vegetal:

Decussadas – as folhas surgem com disposição cruzada ao longo dos ramos.
Sésseis – as folhas não possuem pecíolo (haste de suporte), inserindo-se diretamente no caule.
Amplexicaules – folhas cuja base envolve parcialmente o caule, sem o cercar totalmente.
Ovada – folha com a forma de um ovo mais larga perto da base.
Lanceolada – folha com forma de lança. 
Cimeira corimbosa – inflorescência com crescimento limitado, terminando numa flor, cujas hastes florais partem de pontos diversos, mas que alcançam altura semelhante.
Dialipétala – flor cuja corola é constituída por pétalas inteiramente livres, não ligadas entre si.
Actinomorfa – flor com simetria radial, ou seja a flor pode ser dividida em várias partes iguais. 
Indeiscente – fruto que não se abre naturalmente quando maduro, não libertando as sementes.
Monospérmico – fruto que possui apenas uma semente.
Sementes aladas – são sementes que apresentam uma estrutura específica “asa”, para auxiliar a suadispersão pelo vento.

Carine Azevedo

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