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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 4 de setembro de 2021

Ciclovias: dinheiro gasto "por cada 3 km dava para reabrir 1 km de via estreita"

 Está na moda transformar canais de linhas de comboio desativadas em ciclovias. Portugal é um país de modas, tendências e... invejas e "capelinhas". Não quero com isto dizer que são más modas ou boas modas, são simplesmente modas. Se o vizinho tem, então eu tenho de ter igual. "Ai tu tens um passadiço de madeira? Espera lá que vais ver o meu que vai ser muito maior que o teu..." E a moda pegou também nas ciclovias em canais em que outros tempos ouvíamos apitar comboios e automotoras, que serviam as populações. A questão de que pouco se fala (ou de que nem sequer se fala) é sobre quanto custam estas ciclovias aos municípios, entre o valor que se gasta na criação da infraestrutura, as rendas que têm de pagar à IP - Infraestruturas de Portugal. Sim, porque a IP cobra renda pela utilização do património público. E, ao que me disseram, não é barata.


(Só uma ressalva, porque a esta hora os amantes das bicicletas estão capazes de me colocar debaixo do comboio... eu adoro andar de bicicleta, adoro ciclovias e também percorrer pelos montes e vales os meus próprios caminhos. Prefiro é ciclovias criadas a partir de estações onde chegue de comboio com a minha bicicleta e não ciclovias onde já passou o comboio. Talvez porque veja isso como um sinal de que, ali, nunca mais vou ver passar comboios).

Saí do Porto, ainda pela fresca da manhã, no urbano com destino a Guimarães, estação terminal da linha com o mesmo nome, mas que ia até Fafe. A ideia é terminar a viagem de hoje em Braga, mas o desvio por Guimarães fez-se exatamente pelo motivo da extinção da ferrovia até Fafe e de ter sido esta a primeira ciclovia a aproveitar o canal ferroviário. No fundo, acho que fui à procura de explicações para este encerramento que nunca entendi muito bem, sobretudo porque a distância entre Guimarães e Fafe são 13 km e a linha desativada foram uns meros 21,2 km. Teria custado assim tanto ter estes pouco mais de 20 km? A linha seria assim tão diferente neste troço? E na altura, não houve justiça à moda de Fafe para quem tomou a decisão? Este concelho tem hoje 48502 habitantes (de acordo com censos 2021), apenas mais 600 pessoas do que tinha no ano em que a linha foi fechada. É um facto que Guimarães tem o dobro da população, mas será acertado deixar sem comboio um concelho com 50 mil habitantes, ainda por cima quando este já o tinha? Será acertado remodelar-se toda a via, retirando-lhe a bitola métrica, colocando bitola ibérica e eletrificando-a, mas, nos últimos 20 km, deixá-la de lado, para ser convertida em ciclovia? Embora tenha tentado, ao longo de toda a minha jornada, encontrar os argumentos para este encerramento, não consegui. Pois, se quem me lê o souber, estou recetivo a conhecimento.

Mesmo quando terminava em Fafe (até 1986), esta linha nunca chegou a ser executada na totalidade daquilo que eram os projetos iniciais - levá-la até Chaves, onde se encontraria com a linha do Corgo. (Ainda bem que, na altura, não se gastou dinheiro, porque agora estaria, com toda a certeza, fechada).

Outro dado curioso que fiquei a saber hoje é que a vila de Fafe foi elevada a cidade a 23 de agosto de 1986, precisamente no mesmo ano em que ficou sem comboio. Grande prenda.

Em 2018, até foi criado um movimento, "O comboio em Fafe", mas as intenções eram muito limitadas, apenas recuperar uma antiga locomotiva e colocá-la em exposição na cidade, para lembrar tempos idos com comboio. Uma boa ideia, mas que de nada serve à população do concelho.

Fiz a pé dois quilómetros da ciclovia. Bem visível assim que saímos da estação de Guimarães. É o luxo das ciclovias, disso não haja a menor dúvida. Tem sensores à entrada que conta o número de ciclistas diários (perto das 11h, eram 29 os que já tinham ali passado naquele dia, e às 13h40 eram já 45), só este ano já percorreram este canal quase 40 mil ciclistas, mas ainda faltam quase dez mil para fazer o número de fafenses que ficaram sem comboio. Está bem sinalizada, o que lhe garante segurança. Bem pintada. Tem café à beirinha, mesmo a 600 metros do início. Uma relíquia.

Trás-os-Montes, que tinha as linhas do Corgo, do Tua e do Sabor, é a região do país que mais ferrovia de via estreita perdeu. Espera... perdeu tudo, é mais correto dizer assim. E, mesmo ferrovia de bitola ibérica tem o Douro cá em baixo, longe, muito longe geograficamente e também longe de servir a região. "Bragança não está num deserto no território, pelo contrário, está mais perto de Salamanca, Zamora, Léon, Madrid, e é esta visão que continuamos a não ter. No contexto peninsular, Bragança não é periférico", dizia-me em conversa Daniel Conde, ativista pela ferrovia em Trás-os-Montes há 15 anos.

Voltando às ciclovias, Daniel acha incrível como não se equaciona primeiro a hipótese de fazer um estudo de viabilidade do regresso do comboio e apresenta-me número, justificando que os custos das obras das ciclovias são "caríssimos". A título de exemplo, a ciclovia do Sabor custou 125 mil euros por quilómetro e a do Tâmega foi ainda mais cara, chegou aos 167 mil euros por quilómetro. "É um absurdo", desabafa. Feitas as contas, "a cada 3 km de ciclovia, com o dinheiro gasto, ter-se ia reaberto 1 km de via estreita", garante Daniel Conde. Além do mais, a utilização das ciclovias em toda a sua extensão é diminuta, acabando por acontecer nos primeiros 5 a 10 km junto a grandes localidades e, depois, no restante trajeto, têm pouca utilização. Com esta estratégia, "estamos a hipotecar canal ferroviário para passeios de bicicleta e a pé. É o ridículo da situação". E esta hipoteca, garante, está a ser feita com base em preconceitos, como o caso de a via estreita não prestar e só permitir velocidades muito reduzidas.

Daniel Conde sente-se frustrado (ele não me disse, sou eu a supor depois da conversa que tivemos) com o marasmo das entidades políticas locais (transmontanas), e mesmo as nacionais, e cansado (sou eu também a dizê-lo) com os 15 anos de ativismo pela ferrovia transmontana. Percebo isso pela forma, ou o tom, com que me dá um exemplo concreto: Vila Real vai ter mais uma (tem várias) ponte pedonal sobre o rio Corgo, que vai custar 7 milhões de euros, dos quais a autarquia local tem de desembolsar 1 milhão. Fez as contas à reabertura da linha do Corgo, entre Régua e Ambrambes (acima de Vila Real) e concluiu, nos tempos em que trabalhava na administração da Metro de Mirandela e tinha contacto com todo o tipo de fornecedores, que se faria a obra por 11 milhões de euros, quando nesta altura a REFER avançava com o valor de 25 milhões. Destes 11 milhões, se pensarmos que haveria (como sempre) comparticipação de fundos comunitários, o Estado português gastaria 1 milhão e meio e até as autarquias (Vila Real, Santa Marta de Penaguião e Régua), se quisessem dividir a despesa pelas três, gastariam então meio milhão de euros cada uma, valor que poderia chegar aos 700 mil euros incluindo material circulante. Pois, mas... "a autarquia de Vila Real está-se a preparar para construir uma ponte de 7 milhões de euros, para os quais já tem um milhão de euros para dar", afirma.

Conta-me que há oito anos que tenta uma reunião com o autarca de Vila Real para apresentar este projeto de reabertura e, até agora, a porta nunca se abriu. Daniel Conde tem outras contas e dossiers completos (que me enviou para eu estudar quando tiver tempo) e calcula que cada transmontano que agora usa carro nas deslocações para o trabalho, se tivesse comboio, pouparia 500 euros ao final do ano.

A ciclovia do Tua, de acordo com o previsto, terá 80 km, mas ainda não avançou porque não houve empresas interessadas, nos concursos públicos que foram lançados. Fazem-se as ciclovias e depois "os idosos vão ao médico a Macedo de Cavaleiros de trotineta?"

Outro dos argumentos que me apresenta é o das mercadorias: em Trás-os-Montes, região refém da rodovia, "estamos a pagar três vezes mais pelas mercadorias".

Também no Douro, Luís Almeida, da Associação Vale d"Ouro me tinha mostrado que o encerramento das linhas do Tua, Corgo e Sabor foi "devastador" para a região. No Tua, contava-me assim: "Vamos ali olhar para aquela barragem e as promessas de que iria trazer impacto económico positivo. Hoje já podemos avaliar: onde é que está esse impacto positivo? Foi criado aquele lago, foi impedido o acesso a um conjunto de aldeias que ainda hoje, mesmo com o IC5, continuam isoladas. Onde está o impacto positivo?" Uma questão que ainda não tem reposta. Os carris da linha do Tua mantiveram-se (e ainda bem). A jeito de brincadeira, alguns comerciantes no Tua diziam-me que os carris estão à espera de "um comboio de brincar como aqueles dos parques de diversões". Antes esses que nenhum... já seria qualquer coisita, desde que possa levar a preço normal quem dele precisa para se deslocar de aldeia em aldeia e não apenas turistas.

"Este comboio do Tua, do Tâmega e do Corgo fazia serviço público e essa é também a função do comboio. A ligação demorava 1h30, mas isso devia-se à falta de investimento na via, porque vamos à Suíça ou até aqui na vizinha Espanha e temos linhas de bitola métrica a funcionar e que até fazem serviços de mercadorias", acrescenta Luís Almeida.

No vale do Tua "amputaram" qualquer ligação do Tua ao Nordeste e fizeram o mesmo com o Corgo e com o Sabor.

Linha Transversal Transmontana: dos que têm fé aos que não acreditam

"Possível é, vontade há, possibilidade técnica também", é a visão de Luís Almeida. "Não acredito na construção desta linha transversal transmontana, que, mesmo que aconteça, será sempre a muito longo prazo", atira Daniel Conde. Posições diferentes quanto à linha, que até já foi projeto apresentado em 1920.

A verdade é que Vila Real e Bragança, como capitais de distrito, e de acordo com os argumentos da apresentação do plano nacional ferroviário, têm de ter comboio. "Foi um compromisso assumido pelo Governo e pelo ministro Pedro Nuno Santos", lembra-me Luís Almeida, que acredita que "vão cumprir e honrar" esse compromisso.

Daniel Conde fala imediatamente da dificuldade que seria em atravessar a Serra do Marão e que, na melhor das hipóteses, estes 200 km de ferrovia custariam mil milhões de euros. Imenso para os movimentos que iria gerar e que "talvez não justifiquem este investimento". Já Luís Almeida recorda o tempo que demorou a fazer-se o túnel do Marão para a A4. "Nós não podemos esperar tanto tempo", até porque esta nova linha seria uma "excelente solução para escoar mercadorias do porto de Leixões. "Não vejo que seja impossível, acho que é bem possível e real que possa surgir uma nova linha em Trás-os-Montes, que possa servir a região do Porto, que vá pelo aeroporto Sá Carneiro, Paços de Ferreira, Amarante, Vila Real, Mirandela, Macedo de Cavaleiros e Bragança. Assim, ficava o Douro como um complemento, pois são coisas diferentes."

Sobre o regresso das linhas métricas, tal como as conhecíamos, considera que "infelizmente será difícil, até porque os parâmetros de mobilidade mudaram e são linhas, algumas delas, construídas em sítios muito difíceis". Visão diferente tem Daniel Conde, que considera que a alternativa passa por esta reativação, colocando-as a velocidades superiores, a rondar os 70 a 80km/hora. Dá o exemplo dos milhões de euros que Vila Real está a perder por ano, ao nível da hotelaria e restauração, com os turistas que chegam à Régua e que não podem subir o Corgo.

Termino esta secção dedicada à ferrovia transmontana com dois alertas deixados por estes ativistas, amigos da ferrovia, interessados no bem comum, sonhadores (no fundo aquilo que lhe queiramos chamar): Luís Almeida - "A região precisa e a urgência que o país tem em resolver as necessidades de um dos seus principais portos acho que vai ter de acontecer de uma maneira ou de outra e tornar isso inevitável". Daniel Conde - "A ferrovia está a ser, na Europa e no mundo, uma aposta mais forte do que nunca. E o que andamos nós aqui a fazer?"

Por falar em novas linhas, vamos a uma possibilidade que me surgiu na viagem de hoje por Guimarães e Braga.

Ligação ferroviária Guimarães-Braga? Porque não?

Mantemos a nossa rede ferroviária, "mais coisa menos coisa" (até dói esta expressão... temos de cerrar os olhos com muita força para esquecer a perseguição e devastação de ferrovia de bitola métrica que fizemos... mas pronto), tal como era em meados do século XX. E nunca mais pensámos na mobilidade das populações que não fosse (lamentavelmente) a partir de Lisboa e do Porto. Assim, continuamos a ignorar os novos aglomerados urbanos, outros movimentos de pessoas e outros corredores que não nasçam ou desaguem nas duas principais áreas metropolitanas. Parece-me limitado (estou a ser meiguinho com este termo. Aqui para o Norte diriam outra coisa...). Vamos aos números: o concelho de Guimarães tem 156.852 habitantes e o concelho de Braga tem 193.333 pessoas. Não seria inteligente ligar estas duas metrópoles por comboio? Aliás, estando ambas já ligadas a partir do Porto (em espinha) e criando uma ligação entre elas, teríamos uma espécie de linha circular em que o urbano viria por um lado e sairia pelo outro. Parece de bom senso e completamente aceitável para servir um universo de 350.875 pessoas que estão apenas nestes dois concelhos, já para não falar nos limítrofes. Haverá alguém que não ache que entre estes mais de 300 mil não existem uns largos milhares que se deslocam diariamente entre estas duas cidades? Esta ligação ferroviária, a criar de raiz, não me parece descabida. É preciso é pensá-la estrategicamente, mas a partir de Lisboa... hum... não vai ser fácil.

Qual é a solução atual? Faço a pergunta e dou a resposta. Não a mais óbvia que é: o carro. Optando pelo comboio, um vimaranense que esteja a trabalhar em Braga, a uns meros 24 km (de automóvel, e de acordo com o Google Maps, são 23 minutos sem trânsito) o melhor que consegue na ligação entre as duas cidades é 37 minutos até à Trofa e depois 25 minutos até Braga. No final, foi 1h02 minutos. É muito. Aliás, é demais para um país que quer incentivar os seus habitantes a usarem formas de mobilidade mais sustentáveis.

A viagem Porto-Guimarães fez-se muito bem. Estes comboios urbanos são silenciosos, "deslizam bem" e as paragens para o berço da nação são diminutas para um urbano, mais parece um comboio regional ou até mesmo inter-regional, parando (aquele que apanhei, porque há outros que param mais) nas principais localidades: Rio Tinto, Ermesinde, Trofa, Santo Tirso, Vila das Aves, Lordelo, Vizela e Guimarães.

Miguel Midões

1 comentário:

  1. -As ciclovias fazem sentido em municípios de grande densidade populacional, mas na "ganância a todo o preço" de serem eleitos ou reeleitos os autarcas (por todo o país!) estão desperdiçar "mundos & fundos" nestas ciclovias e outros desastrosos investimentos cujo o retorno económico é próximo de zero. Não vêem nem querem saber de mais nada, a pobreza ( mais que franciscana!) da economia nacional,que nos transforma em subsídio-dependestes, cada vez mais dos outros povos europeus, que investem em obras com (pelo menos algum!) retorno económico garantido. Tenham juízo e, vergonha, na forma mais que leviana como gastam os fundos (com que outros nos ajudam!), talvez na espectativa de que não os vamos desperdiçar.

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