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SOBRE O BLOG: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blog, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 10 de maio de 2022

A infelicidade de alguns povos

 Creio não andar muito longe da verdade ao afirmar que alguns povos poderão rever-se no exemplo que a seguir apresento, apenas e simplesmente produto da minha imaginação.
Era uma vez um povo governado por um tirano. E esse povo, como facilmente se compreenderá, vivia muito infeliz: não tinha liberdade de decidir sobre fosse o que fosse, e toda a sua vida era orientada para obedecer sem contestar. Além disso, era frequentemente sujeito a enormes sacrifícios, dos quais o menor consistia em trabalhar de manhã à noite, sob a inclemência do frio e do sol, mal vestido e a morrer de fome, pois, quando o tirano estava de mau humor, ordenava que lhe cortassem no já parco alimento.
Além desta tão grande crueldade, este tirano salientava-se também pelo seu constante mau humor. Por isso, naquele reino ninguém podia rir nem, ao menos, esboçar um pequeno sorriso, porque, quando isso acontecia, o “transgressor” era imediatamente chamado à presença deste cruel governante que, (também para seu divertimento), ordenava a um dos muitos esbirros que o chicoteasse, até que o sangue, borbotando das costas do desgraçado, tingisse o pó no qual, depois do castigo, era obrigado a prostrar-se. Há tiranos (e este era um deles) que só conseguem sustentar o trono em que se refastelam, à custa dos muitos guarda-costas e ignóbeis informadores, além da sua guarda de elite – generosamente armada e tratada com todas as benesses.
Poderíamos caraterizar esta selvática personagem de aspeto – calcule-se! – de aspeto franzino e até raquítico, cara de fuinha, nariz de agiota, de cabelo comprido e sujo, malcheiroso, cheio de caspa e de piolhos, que reluziam por entre falhas do cabelo e que, por se ter habituado a eles, não se sentia incomodado com as suas picadas e os seus dejetos…, tudo isto contrastando com uma agudeza de espírito, de manha, de falsidade e desconfiança, de ambição desmedida e, entre outros atributos, tendo sempre presente o propósito de dilatar o seu reino, à custa de reinos vizinhos, cujos povos, pelos vistos, viviam em total liberdade pelo grande cuidado e tolerância que os seus governantes tinham com eles. Era-lhes até permitido emitirem opiniões quase sempre bem acolhidas, e muitas delas aproveitadas para uma melhor orientação dos respetivos Governos.
Mas, porque o tirano, ao ter conhecimento do modo como esses povos eram tratados, ficava furioso de tal forma que não conseguia atinar com o mando; e, para se acalmar, deitava-se de barriga no chão do quarto, e aí se entretinha a contar, (irritado e em voz alta), feijões, carcaças de percevejos, dentes de alho… e só descontraía quando acabava de contar ameixas secas.
Só nessa altura permitia à sua guarda pessoal que o deitasse na cama, onde ficava de costas, a olhar atentamente o teto onde, num emaranhado de arabescos, conseguia ver um filme de amor, com o qual se desfazia em lágrimas, porque sabia que não era amado nem entendido por ninguém. Nem mesmo pela rainha consorte! Rainha consorte que ele abominava e estava com ânsias de a degolar, porque andava com as criancinhas ao colo, dava-lhes de comer, de vestir, as ensinava a amar e as guardava do perigo.
Também ela há muito detestava aquele tirano. E então, com inúmeras precauções, subornando um súbdito, fez com que este, ajudado por quem sabia do assunto, perfurasse a Terra até ao centro, e aí colocasse a bomba mais poderosa que, até ao momento, se tinha inventado. E no dia em que o enfezado do marido morreu, a bomba explodiu, reduzindo a pedacinhos o planeta em que habitavam, projetando-os para a imensidão do espaço sideral! Entretanto, o espaço sideral, incomodado, fez com que todos aqueles pedacinhos caíssem no Abismo. E este, temendo uma perpétua convulsão universal, imediatamente os juntou e refez a Terra. Mas a Terra liberta de tiranos, que morreram todos naquela grande explosão.
E agora, criada na sua pureza original, no maravilhoso conforto em que se deleita, outra Humanidade sabe louvar o sol; contemplar a lua; chorar, se a Terra se entristece; amar os rios e os mares, guardar as planícies, as serras e os montes; respeitar os animais; fazer crescer e olhar pelas plantas… e, sobretudo, que sabe compreender-se, não guerreia, e prontamente ajuda, ao ver que alguém sofre!

(Baseado no meu conto inédito “O Tirano”)

Manuel António Gouveia

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