A informação foi avançada hoje à Lusa por Sandra Sarmento, diretora regional da Conservação da Natureza e Florestas do Norte, o organismo responsável pelo posto aquícola onde, desde 2008, é feita reprodução para repovoamento na região da conhecida truta dos rios de águas frias como o Baceiro.
Este rio serve de captação de água para o posto, mas a seca causou uma redução do caudal e uma subida de temperatura que obrigou, em julho, a esvaziar os tanques com capacidade para fazer criação de 400 mil trutas por ano.
“Foi um processo complicado porque efetivamente a subida de temperatura foi muito significativa e isso trouxe as consequências associadas e obviamente tivemos que retirar os peixes”, afirmou à Lusa a diretora, à margem das comemorações dos 43 anos do Parque Natural de Montesinho, onde se encontra o posto aquícola.
A diretora regional do ICNF explicou que as equipas levaram “o máximo de progenitores” que conseguiram para o outro posto aquícola do instituto localizado no Marão e colocaram “os juniores em meio hídrico para garantir a sua sobrevivência”.
“Neste contexto, houve naturalmente alguns peixes que acabaram por morrer”, declarou, sustentando que “a temperatura [da água] subiu porque as disponibilidades hídricas do rio desceram muito, desceu o teor de oxigénio, e isso fez com que os peixes sofressem”.
Sandra Sarmento indicou que esta ocorrência obrigará a fazer algumas adaptações no posto aquícola para prevenir situações como estas que podem vir a ser “cada vez mais frequentes” devido às alterações climáticas.
Obrigará ainda a refazer o trabalho de recolha de progenitores em cada um dos rios da região para voltar a haver condições para a continuidade do projeto de repovoamento e preservação deste património que, alem do valor para biodiversidade, é também um ativo económico ao nível da pesca e da gastronomia.
O trabalho realizado neste posto é feito em colaboração com o Instituto Politécnico de Bragança (IPB) e o investigador Amílcar Teixeira garantiu à Lusa que o que aconteceu neste verão no Baceiro é inédito em rios de montanha do Norte de Portugal.
“É uma situação que era típica dos rios do sul, os rios temporários que normalmente secam durante o verão. O que estamos a assistir agora paulatinamente é haver, com esta sondas de calor, com as alterações climáticas, uma sucessão de eventos que leva a uma perda de biodiversidade”, afirmou.
O investigador concretizou que se registaram em rios de águas frias como o Baceiro, Rabaçal ou Tuela, nesta região, temperaturas na ordem dos 25 graus, que estão no limite da tolerância da espécie”.
“Significa isto que se continuarmos a ter muitos eventos destes, a espécie pode ser que não encontre condições, quem diz a truta diz outras espécies muito sensíveis a variações da temperatura, que vão desaparecer deste ecossistemas”, considerou.
Outro problema que tem constatado prende-se com a vegetação ribeirinha, nomeadamente os amieiros, que estão a morrer, e que “são fundamentais para a preservação do regime térmico das águas, a manutenção de águas mais frias”.
Acrescem ainda as consequências dos incêndios, como o que aconteceu há alguns meses no alto Baceiro, com cinzas e sedimentos arrastados para o rio apôs trovoadas com precipitação intensa e que provocam a perda de habitat e consequente diminuição da biodiversidade, como disse.
O investigador que se tem dedicado ao estudo dos rios, defende a urgência em adotar medidas de prevenção a começar por equipas multidisciplinares que abordem esta temática.
Antes de se começar a fazer novas barragens e furos artesianos, entende preconiza medidas como aposta em culturas que resistam com menos água na agricultura, assim como a substituição de jardins e relvados por plantas que não consumam tanta água e a utilização de águas residuais na rega dos mesmos.
Lembrou que há também um problema antigo para resolver, a substituição de condutas de transporte da água para abastecimento onde “há imensas perdas de água”.
O investigar aponta ainda a dessalinização da água do mar para fazer face a desafios futuros e alerta para “o comportamento das pessoas na forma como usamos a água”.
“Há países como Israel ou a Austrália que vivem com a seca e que não têm problemas porque sabem governar a água devidamente”, afirmou.
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