É natural que esta singela capela, situada nos subúrbios de Bragança, perto da ponte velha sobre o Sabor, pertencesse a algum antigo hospício de leprosos, gafos ou lázaros, como se expressam os documentos antigos.
«Nos principios da monarchia abundavam em Portugal os leprosos ou gafos, pelo que em muitas povoações e sempre a distancia d’ellas se fundavam gafarias ou lazaretos, pequenos hospitaes destinados para aquelles infelizes, mas com o tempo, com a mudança da alimentação e vestuario, principalmente com a substituição das roupas de lã pelas de linho e com o uso do assucar desappareceu aquella medonha e asquerosa infermidade»(602). Da antiguidade da lepra no povo judaico fala o Levítico, cap. XIV.
Brito(603) diz-nos que a lepra desapareceu no tempo do rei suevo Teodemiro, mas os Livros de Linhagens (604) deixam perceber que ela grassava fortemente nos princípios da monarquia portuguesa. Ora, se na classe da nobreza ela imperava por tal forma, o que não seria no povo, privado dos confortos da vida e sujeito a precárias condições higiénicas?! O rei D. Sancho I deixou em seu testamento dez mil maravedis ao mosteiro de Alcobaça com obrigação de fazer uma gafaria em Coimbra (605) e D. Sancho II quinhentos maravedis de esmola às casas dos lázaros que havia em Portugal (606).
O cânone XXIII do Terceiro Concílio Ecuménico de Latrão, celebrado em 1179, ocupa-se dos leprosos concedendo-lhes igrejas próprias, presbíteros que nelas sirvam e cemitérios. Daqui concluímos que a capela de S. Lázaro, de que estamos tratando, foi uma delas. Nada tem de notável: está situada num sítio ameno, mas escondido, como convinha aos fins a que era destinada. Na quarta dominga de Quaresma celebra-se nela uma festividade muito concorrida dos fiéis das circunvizinhanças de Bragança.
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(602) LEAL, Pinho – Portugal Antigo e Moderno, vol. XII, p. 120, artigo «Val do Douro» e p. 1563, artigo «Vizeu».
(603) Monarquia Lusitana, edição da Academia, livro VI, cap. XII, p. 232.
(604) Portugaliæ Monumenta Historica, p. 154, 161, 162, 167, 172, 179, 202, 204, 262, 269, 319, 321, 322, 337, 341, 352 e 366. VITERBO – Elucidário, artigos «Gafe» e «Gafaria».
(605) PINA, Rui de – Crónica d’El-rei D. Sancho I. cap. XVII.
(606) CARDOSO – Agiologio Lusitano, ao dia 4 de Janeiro.
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Em frente da capela há um tanque de granito lavrado onde se vêem as antigas armas de Bragança: escudo partido em pala; na primeira, as quinas do reino sem a orla dos castelos; e na segunda, somente um castelo com portas e janelas. Ao lado lê-se o número 1694, que indicará o ano em que esta obra se fez.
Borges (607) refere a tradição de haver perto desta capela um hospital de leprosos.
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(607) BORGES – Descrição Topográfica…, notícia 7.ª.
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MEMÓRIAS ARQUEOLÓGICO-HISTÓRICAS DO DISTRITO DE BRAGANÇA
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