A caminho do "Reino Maravilhoso"…
Já não vim ao colo! Tinha quase 4 anos. Estava a caminhar para velho.
Contrastes que eu não senti e, agora compreendo, que marcam a nossa vida e cimentam a nossa personalidade.
Outras gentes, outra cultura, outros saberes e outros sabores também, outro clima…outros afectos…mais pedras e menos alcatrão, mais natureza e menos betão, mais humanidade e menos pressão e tudo em tão poucos quilómetros de distância dentro de um País tão pequeno que “pensou”, um dia, que era GRANDE e que assim seria ad eternun.
Em Bragança surgiu a Liberdade. Em Bragança todas as crianças eram felizes. Espaço, confiança e acima de tudo Paz e Solidariedade. E amigos, amigos, muitos amigos. Tanta coisa para descobrir em liberdade. Tanta ribanceira, tantas grutas, tantos cantos e recantos, os rios, os arvoredos, os calhaus, os cheiros, as árvores de fruto em todo o lado, os pássaros…a aventura em cada passo. Os “galos” na cabeça consequência quase certa de uma saraivada de pedradas que curavam sem ser necessário mercúrio e muito menos sem recorrer às urgências (que não havia). Se a coisa, desse mesmo para o “torto” o Dr. Conceição ou o Dr. Jota davam um jeito. Mais ponto menos ponto…mais dente menos dente. Será que alguém tomava medicamentos para controlar a tensão arterial? Provavelmente nem se sabia que o ser humano tinha tensão arterial e provavelmente isso não era problema.
Em Bragança podia-se fazer escalada…e até as muralhas do castelo, que afastavam em tempos idos, perigosos inimigos, eram pequenas para a nossa vontade de descobrir e viver. O mundo era pequeno, muito pequeno para tanta ambição. Não precisávamos de televisão para sonhar…o sonho era realidade todos os dias e éramos nós os realizadores sem recorrer a subsídios.
Confunde-me um pouco saber que agora se tem a pretensão de saber tudo e não temos capacidade de ser felizes. Há pouco tempo atrás, nada se sabia e sabíamos RIR a bandeiras despregadas.
Lisboa tinha luz, barulho movimento e confusão e ruas iluminadas no Natal. Lisboa tinha música e carros…mas não tinha musgo nas avenidas, para fazer o presépio…
Tinha outro cheiro o presépio feito com musgo onde pastavam os rebanhos, sabiamente guardados pelo pastor e pelo cão e a areia fina a marcar o caminho por onde passavam, na nossa imaginação, os três Reis Magos, a mulher do cântaro com água a tiracolo…e a ponte de barro, a encimar o rio, feito da prata dos maços de cigarros. Os, agora malfadados, cigarros que estão ao lado do Bin Laden como os maiores culpados das misérias humanas. Nunca gostei dos cintos, que chegaram a estar na moda, feitos com os maços de cigarros depois de vazios. Ficavam bem mais finas umas calças seguradas com um baraço e com uma pirulita das águas de Carvalhelhos (as da bruxa), a servir de fivela. Mas, gostos não se discutem. Ou discutem?
O melhor musgo era o das ribanceiras das margens do Fervença mas não era para todos conseguir subir as escarpas com meia dúzia de metros em altura.
Éramos crianças. Era uma grande aventura ir ao musgo. Combinávamos a ida com dias de antecedência...
Ora aqui está um belo discurso!
ResponderEliminarQuando vieste para Bragança, "A caminhar para velho", eu não era ainda, sequer um projecto, aliás, acho que nunca cheguei a ser um projecto. Fui mais um acidente num dia de trovoada. Mas lamechices à parte, o cheiro do musgo! Sim!!! O cheiro do musgo! o Ritual, a marcação do dia, tantas lembranças e tão boas, que essa memória olfactiva me traz! O meu Pai, Lisboeta de gema, adorava o ritual, não era no Fervença, mas na ribeira do ginço, em Macedo... Marcava-se o dia e lá ía a vizinhança toda, o frio passava ao lado, ninguém dava por ele... Que bom miúdo, espelhares assim as tuas memórias, que avivam pequenos grandes promenores nas nossas vidas.
Abraço no teu coração
Uma história de uma vida e de um homem que a sabe apreciar.
ResponderEliminarAqui encontrou o que falta nas grandes cidades, aqui se fez homem e aprendeu a dar valor à amizade, às pequenas coisas que a natureza nos dá e que aqui temos há mão.
A felicidade não se encontra na monstruosidade do cimento, mas na realidade de um viver que tem um sentido que nos marca.
Irmão, acabas de me trazer á memória o enorme presépio que fazíamos todos os anos pelo Natal.
ResponderEliminarAs figuras começaram a ser compradas em Lisboa quando eu nasci.
Todos os anos se compravam mais e as figuras eram muitas.
As ovelhas eram um rebanho enorme. Umas boas dezenas espalhadas pelos montes com os pastores.
Era feito no chão da sala que se cobria de plástico.
Todos íamos apanhar o musgo ao campo...uma alegria.
Sim Ana Maria.
ResponderEliminarLembra-me bem das figuras que ainda trouxemos de Lisboa. A que tenho mais presente, na memória, era um boneco com capacete azul, um músico...que "tocáva" um instrumento de sopro.
MEMÓRIAS.
Um beijo Grande.