Ao contrário do que aconteceu na maior parte das regiões de Espanha, a Guerra em Zamora foi bastante curta, tendo as forças franquistas conseguido a vitória em pouco tempo. Em finais de 1936, princípios de 1937, acabou praticamente a resistência organizada ao franquismo na então província de Zamora, surgindo, em contrapartida, bolsas maiores ou menores de guerrilha, dispersas por toda aquela região, mudando rapidamente de localização para melhor se protegerem e, eventualmente, fustigarem os vencedores.
Estas constantes deslocações dos guerrilheiros levou-os, muitas vezes, a entrar pela fronteira bragançana, com o objetivo de se esconderem durante períodos de tempo mais ou menos alargados, servindo igualmente para recuperarem de ferimentos tidos em surtidas contra os que designavam como “ocupantes”.
Inicialmente, estes fluxos de refugiados entravam em Portugal exclusivamente para se protegerem, não tendo grande formação política e, como tal, não tomando posições claras a favor ou contra qualquer um dos lados beligerantes. Só a segurança pessoal e da família os levava a atravessar a fronteira, convictos de que rapidamente surgiria a paz e com ela o regresso às suas terras. Numa segunda fase, chegaram os guerrilheiros politizados, com ideias claras do que pretendiam e queriam, permanentemente em fuga, buscando em terras bragançanas o apoio, o repouso e o esconderijo temporário que lhes permitissem novas investidas, novos desafios contra os “ocupantes”. E assim, cá e lá, resistiram durante todos os anos que demorou o conflito armado, chegando alguns a manter uma espécie de guerrilha, mesmo depois de ter sido declarado como terminado.
Como é evidente, por detrás destes movimentos constantes de vaivém tinha forçosamente de estar uma rede local que os protegia, escondia, tratava, alimentava e avisava, sempre que a sua segurança parecesse estar em perigo. Estas verdadeiras redes sociais transfronteiriças constituíram o apoio e suporte de variadas estratégias de sobrevivência em pequenos locais onde toda a gente se conhecia.
É bom não esquecer que a maioria dos naturais e/ou residentes nestas localidades de acolhimento não tinham qualquer consciência política, pelo que todas as ações desenvolvidas no tocante à ajuda e ao apoio têm de ser vistas no estrito plano da vizinhança. Ajudar um vizinho, mesmo de outro país, era muito mais importante do que seguir à risca as claras e ameaçadoras ordens das autoridades locais, no sentido de denunciarem tudo aquilo que pudesse contribuir para a captura dos fugitivos espanhóis.
Não deixa de ser sintomático, na zona de fronteira, aparecer um novo “outro”: o “raiano”. Este, no dizer de Eduardo Araújo, “antes de ser português ou espanhol é vizinho. É da raia. Estão-lhe mais próximas e são-lhe mais importantes as pessoas que com ele habitam, que com ele trabalham, que com ele trocam favores, com quem ele mantém relações de facto, do que lhe são próximas e importantes as imposições dos que, aos seus olhos, não passariam de imposições de eruditos citadinos que não compreenderia, e que, na sua vida, mais do que não fazerem sentido, o prejudicavam”.
Valentina Paiva relata-nos um exemplo vivo e comovente das atrocidades vividas neste período, por parte de uma família espanhola que se havia refugiado nas cercanias de Bragança. Segundo ela, “existia em Bragança um homem que era a cara e bandeira de ideais e grupos que na clandestinidade lutavam por um País livre, mais justo, onde os portugueses fossem cidadãos de pleno direito, senhores do seu destino de Homens. Era Artur Mirandela, nascido e criado em Bragança”.
Os governantes portugueses não ficavam indiferentes a estas tentativas de apoio aos guerrilheiros, enviando para o Ministério do Interior e para a PVDE – Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (passou a designar-se por PIDE – Polícia Internacional e de Defesa do Estado, a partir de 1945), os nomes e naturalidade dos presos.
Posteriormente, eram entregues na fronteira às autoridades franquistas que, na maioria das vezes, os fuzilava de imediato.
Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa
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