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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 7 de agosto de 2021

Castro de São Juzenda: um tesouro engolido pelo matagal

 Fui visitar o Castro de São Juzenda de trator agrícola e, depois, segui a pé. Este castro pertence à aldeia de Vale de Prados, freguesia de Múrias, Mirandela, Bragança, Portugal.
Para começo, encontrei no sopé do castro uns buracos profundos sem ter percebido qual a sua finalidade, mas duvido que tal intervenção seja de origem legal. Subi a montanha com enorme grau de dificuldade, havendo uma rampa aberta que terá sido feita recentemente. Na zona de edificação do castro havia imenso mato que é necessário limpar para se perceber toda a construção e a grandiosidade. Fui detetando várias muralhas e aglomerados de pedras de xisto. Quando atingi o cume, notei que tinha havido nova intervenção de uma máquina retroescavadora, abrindo um caminho circundante. Mais uma vez se denota negligência neste procedimento. O acesso ao castro só é possível por trator e, ao que pude apurar, parece que há pessoas que lá vão buscar pedras de xisto. É vital que se feche o acesso ao castro, se coloque sinalização informativa a dizer que é Imóvel de Interesse Público, está protegido por lei, é proibido retirar pedras e fazer buracos. Se a população não estiver informada e sensibilizada para a preservação do seu Património, qualquer dia este castro desaparece no meio do matagal e as pedras estarão em outros lugares.

O estado de abandono a que está votado este importantíssimo Património Arqueológico, denota a insensatez da autarquia de Mirandela, que não valoriza, estuda, preserva e divulga estes tesouros.

Ter património e ignorá-lo é simplesmente falta de visão estratégica.

Texto e fotos:
© Teresa do Amparo Ferreira, 06-08-2021

Fotos: CASTRO DE SÃO JUZENDA - Vale de Prados, Múrias, Mirandela, Bragança, Portugal.


CASTRO DE SÃO JUZENDA

Imóvel de Interesse Público, classificado em 1983

É URGENTE RETOMAR OS ESTUDOS ARQUEOLÓGICOS NO CASTRO DE SÃO JUZENDA.

"S. Juzenda (Nº 625)

Vale de Prados - Múrias (040722)

Carta 1:25 000: 63

Coordenadas: 281.3; 515.3

Altitude: 342 metros

Grande povoado fortificado, implantado no cume de um relevo em esporão, situado na margem direita do rio Tuela, sobranceiro ao seu leito. O local não possui especiais condições de defesa natural. Porém o posicionamento geo-estratégico é excelente. O sistema defensivo contava cinco linhas de muralha, destacando-se um torreão a nordeste, na linha exterior. O aparelho das muralhas é de pedra partida de xisto. As sondagens de M. Hock determinaram três fases distintas de ocupação, uma primeira do Bronze Final, outra, intermédia, da Idade do Ferro, e, finalmente, níveis superiores correspondentes à época romana, revelando que o povoado subsistiu até ao fim do Império, pelo menos. No sítio da sondagem, a fundação da muralha é atribuível ao Bronze Final. Tendo em conta o posicionamento do povoado (no centro da média bacia hidrográfica do Tua), a sua dimensão, a sua complexa estrutura defensiva e ampla cronologia, admitimos a possibilidade de S. Juzenda ter sido a capital dos Interamici.

Idade do Bronze Final; Idade do Ferro; Romanização

Castro Romanizado

P. LOPO 1900, 114-115; FORTES 1908, 24; PINTO 1931, 92; ALVES 1934, 496; 1938, 278; HOCK e COELHO 1972, 221; NETO 1975, 271; HOCK 1979, 393-396; HOCK 1980, 55-70; PONTE 1984, 133; A. C. SILVA 1986, 98; P. LOPO 1987, 113; SANCHES e SANTOS 1987, 39-42."

"Na década de 70 persiste um certo vazio, apenas cortado por uma sondagem, que primeira vez aplica métodos seguros de registo, e persegue objectivos bem definidos: referimo-nos aos trabalhos levados a cabo por Martin Höck, no Castro de S.Juzenda (Vale de Prados - Múrias - Mirandela) (HÖCK e COELHO 1977, 203-208; HÖCK 1979, 393-398; 1980, 55-70). Os resultados desta intervenção, que no contexto da época surgem como inovadores, mas que passaram algo despercebidos, revelaram que a fundação daquele povoado fortificado pode ser datada do Bronze Final, registando estratos que indiciam a romanização do sítio e sua ocupação até ao Baixo Império. Infelizmente, os trabalhos de Martin Höck, que também estudou a colecção de materiais metálicos do Museu do Abade de Baçal (HÖCK e COELHO 1972, 219-250), não tiveram continuidade."

"4.3. Recursos mineiros

Tal como na Terra Fria, os recursos mineiros são abundantes nesta zona.

Mineralizações de cassiterite ocorrem no vale do rio Tuela (COTELO NEIVA 1943), numa área onde se localizam importantes povoados pré-históricos, nomeadamente os castros de S. Juzenda (Vale de Prados-Múrias) e de S. Brás (Torre de D. Chama), ambos com materiais da Idade do Bronze Final."

"Martin Höck (1980, 65), ao apresentar os resultados das sondagens do castro de S. Juzenda (Cat. 626, p. 260), publica dois fragmentos de cerâmica calcolítica, um dos quais (SJ150), foi recolhido num nível subjacente à construção da muralha que é datada do Bronze Final 130. Mas esta circunstância não implica, por si mesmo, uma linha de continuidade entre as duas épocas."

"Em zonas de subestrato xistoso regista-se o assentamento em pequenos esporões sobranceiros a cursos de água, no geral com boas condições defensivas: Castro de Sacóias, S. Juzenda, S. João das Arribas, Cachão da Rapa, Lorga de Dine 137."

"4.1.3. Sítios com cerâmicas de tipo Baiões e brunida.

Das sondagens efectuadas no castro de S. Juzenda, concluíu Martin Hock que, pelo menos uma das muralhas do povoado tinha sido construída na Idade do Bronze Final. De facto, o correspondente nível de ocupação proporcionou um conjunto de cerâmicas típicas, entre as quais se incluía pelo menos um fragmento com decoração brunida (SJ 114) e outros ornamentados com ungulações na extremidade do bordo (SJ 352; SJ 319-III) (HOCK 1980, 55-70)"

"Mas, na verdade, e em definitivo, este aspecto só poderá ser esclarecido através de escavações alargadas em sítios como a Penha Mourisca de Bouzende, por exemplo. Retomar as escavações de S. Juzenda seria um outro objectivo a cumprir, para esclarecer as questões relacionadas com a fundação dos povoados fortificados nos alvores do I milénio."

"4.2.4. S. Juzenda.

Para a Terra Quente dispomos das sondagens do castro de S. Juzenda (Cat. 625, p. 260) e dos dados proporcionados pelo salvamento efectuado no Castelo Velho de Mirandela (Cat. 620, p. 257). Na bacia do Tua, as sondagens do castro de S. Juzenda, dirigidas por Martin Höck (HOCK 1980), permitiram entrever uma estatigrafia reveladora de um longo espectro de ocupação, pelo que se lamenta que os trabalhos não tenham prosseguido.

Foram abertos dois cortes. A sequência mais significativa foi detectada no corte 1. Sobre um nível de aterro, foi erguida uma muralha de aparelho de xisto de pedra partida sobreposta, que terá tido uma longa pervivência, com eventuais reconstruções. Adossados a esta muralha foram registados três horizontes, cada um deles agrupando vários níveis de ocupação. O mais antigo seria coevo da construção da muralha e continha materiais do Bronze Final, incluindo cerâmica brunida do tipo Baiões. Sobre este acumulava-se um grupo de estratos com materiais da Idade do Ferro. Finalmente, a fechar a sequência, um conjunto de níveis romanizados, com materiais típicos, designadamente numismas do século IV.

Esta sequência cronológica revela uma dilatada continuidade de ocupação, ao longo de mais de um milénio, que também parece ter ocorrido noutros povoados da Terra Quente, pois está documentada através de recolhas de superfície.

Julgamos útil, no entanto, colocar algumas questões de cronologia. Para datar do Bronze Final o nível coevo da construção da muralha, Martin Höck baseou-se, sobretudo, na ocorrência de bordos decorados com ungulações. Ora bordos deste tipo surgem nos níveis da I Idade do Ferro na Meseta Norte e em Zamora Ocidental, como já vimos. Sendo assim, na ausência de outro tipo de datações, pode atribuir-se a construção da muralha ao Bronze Final, mas como mera hipótese, interrogada.

Por outro lado, a filiação da olaria dos estratos inseridos na Idade do Ferro, recolhida em S. Juzenda, permanece nebulosa. Os desenhos publicados são pouco esclarecedores. Martin Höck destaca um fragmento de vaso com paralelos nas cerâmicas estampilhadas do litoral. Já em Lubián, A. Esparza Arroyo (1987, 342) assinalou a ténue influência da chamada Cultura Castreja, evidenciada, entre material integrável no horizonte Soto, por um fragmento de cerâmica estampilhada e com motivos lineares incisos. Torna-se, pois, imprescindível rever os materiais de S. Juzenda, ou abrir novas sondagens, para esclarecer este aspecto, tanto mais que a olaria proto-histórica do Castelo Velho de Mirandela, igualmente situado na bacia do Tua, não apresenta analogias com os materiais do litoral, antes pelo contrário possui similitudes com o horizonte ceramológico de Soto de Medinilla."

"7.2.3. Povoados de tipo G.

Um dos elementos comuns à estrutura territorial dos povoados deste tipo é a presença de um curso de água com caudal permanente ou no limite da meia-hora de marcha, ou entre esta curva e a curva de uma hora. No caso do castro de S. Juzenda (Cat. 625, p. 260) em menos de meia-hora alcança-se o leito do rio Tuela. Aliás, a extensão do curso do rio abrangido pelo território de uma hora é de cinco quilómetros, um valor significativo."

"Voltemos ao caso de S. Juzenda, para registarmos que no interior da isócrona de meia-hora se incluem fluvisolos quer do rio Tuela, quer de uma ribeira que se dispõe a sul do povoado. Actualmente estes fluvisolos encontram-se ocupados com hortas ou pomares. A par de uma horticultura, praticável nas referidas manchas de fluvisolos, culturas ceralíferos de sequeiro eram possíveis nos litosolos das vertentes e cumes das colinas envolventes. No entanto, os tempos de regeneração seriam prolongados, por certo, como já sublinhámos. Ora, verifica-se no quadro global do desenho dos territórios um aspecto assaz importante. Enquanto que, no alinhamento dos principais cursos de água, os territórios de uma hora já se sobrepõem, no sentido transversal aos rios, as distâncias entre povoados são muito maiores, podendo atingir duas horas, ou mesmo mais. No sentido oposto à faixa onde se concentravam as manchas de fluvisolos, os territórios alargam-se de forma notável, antes de se confrontarem com os limites de outros castros. Dispunham pois de amplo espaço, para a rotatividade das roças e para alimentar rebanhos de gado ovino e caprino, sem criar fenómenos de degradação excessiva do coberto vegetal. Tais fenómenos, a serem ciclicos, provocariam a destruição das pequenas manchas de fluvisolos que existem nos territórios de meia hora dos castros de tipo G. Por outro lado, a disponibilidade de amplos espaços para culturas de sequeiro e para pastoreio explica, provavelmente, a dimensão de povoados como S. Juzenda."

"Apesar das sondagens realizadas em S. Juzenda e no Castelo Velho de Mirandela, pouco se sabe sobre as comunidades que ocuparam esta unidade geográfica, sendo, no entanto, evidente, que possuem uma identidade própria, baseada numa matriz de ocupação específica e em modelos de assentamento distintos. Apresentam em comum com os castella, que ficam a ocidente, uma marcada continuidade. Mas, no caso da média bacia fluvial do Tua, a escassez de recursos hidrícos pode ter influenciado tal continuidade, de que o caso do castro de S. Juzenda é um exemplo significativo (ocupação da Idade do Bronze Final até ao Baixo Império), tal como S. Brás, que sobreviveu até à Baixa Idade Média 238."

"Nos anos 70 Martin Höck realizou sondagens no castro de S. Juzenda (Múrias). No entanto, mal grado a importância dos resultados, estes não foram explorados de maneira exaustiva, nem acompanhados por um estudo sistemático da área envolvente (bacia inferior do Tuela). Em 1984, efectuámos o inventário dos sítios arqueológicos de Mirandela, baseados na bibliografia disponível e com colaboração local, que nos proporcionou diversos dados inéditos. Posteriormente, Maria de Jesus Sanches, da Universidade do Porto, dedicou-se ao estudo da ocupação pré-histórica dos abrigos da serra de Passos. Em colaboração com Branca dos Santos, utilizando as fichas que elaborámos, visitaram ambas os sítios conhecidos e publicaram o levantamento arqueológico do concelho, que poucos dados acrescentou ao nosso trabalho, no capítulo dos sítios proto-históricos, romanos e medievais. Trabalhos mais recentes, destinados a organizar o catálogo, permitiram-nos desfazer alguns erros e equívocos, descobrindo novos sítios, como é o caso do povoado romano-medieval de S. Martinho. Uma carta arqueológica de um espaço tão vasto e tão favorável ao assentamento de habitats, como é o concelho de Mirandela, exige novas prospecções. Na verdade, a distribuição dos povoados, sejam castros sejam sítios de fundação romana, revela toda uma série de vazios que importa examinar em novos projectos.

"... S. Juzenda, devido à sua extensão, à sua posição central na média bacia do Tua, ao seu elaborado sistema defensivo e sua ampla cronologia (Idade do Bronze Final-Baixo Império)."

Fonte: Tese de Doutoramento de Francisco de Sande Lemos, Povoamento Romano de Trás-os-Montes Oriental, 1993

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