Por: Humberto Pinho da Silva
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
"Terrim, terrim, terrim..."
Toca o telefone. Corro para atender. Do outro lado, uma voz feminina, muito amável, diz:
- Estou a falar com o senhor ...
- Sim.
Estamos a fazer um inquérito sobre saúde. O senhor tem: diabetes, dores na coluna ou fungos nos pés?
- Graças a Deus não tenho nada.... Tenho plano de saúde... Não estou interessado.
- Mas, não venho vender plano de saúde! apenas conhecer, se está satisfeito com a saúde em Portugal?!
- Já lhe disse, minha senhora, que não me interessa...
Mas... sabe, que hoje já se cura o seu mal?
- Olhe: desculpe. Vou desligar...
No dia seguinte soa, novamente, o telefone:
" Terrim, terrim , terrim"...
É número desconhecido. Atendo a medo:
- Estou!
- Venho solicitar um auxílio.... Sou encarregada de infantário. Vamos levar as crianças à praia. Algumas são pobres, e não podem pagar o transporte. Não quer contribuir? É uma obra de caridade!
- Minha senhora, se fosse contribuir para todos que me pedem, não chegaria a minha modesta reforma...
- Mas, olhe: todos temos obrigação de auxiliar, principalmente as crianças necessitadas. Não vai impedir de elas irem à praia!.... Como cristão, tem obrigações!... Depois o que são dez ou vinte euros?
- Minha senhora: tenho que fazer, não posso manter a conversa, com licença...
Acabo de almoçar. Sento-me para assistir ao noticiário da uma:
" Terrim, terrim, terrim..."
Levanto-me para atender. Do outro lado, voz lânguida e doce, diz-me:
- Sou da empresa X. Venho perguntar se a Internet que tem, chega?
- Chega muito bem!...
- Mas, certamente, quer outra mais rápida?
- Para o que faço... Na minha idade, é o suficiente...
- Que idade tem?.... Certamente tem filhos e netos...
- Não, obrigado.
- Não quer mais canais?!...
- Dispenso: os portugueses e mais dois estrangeiros, basta... Para que quero eu chineses... e em línguas que não entendo?
- Certamente precisa de canais temáticos?
- Já lhe disse que não.
Deito-me para curta sesta. Dormito...
" Terrim, terrim, terrim..."
Ergo-me estonteado:
-Alô!...
- É de casa particular?
- É sim.
- A sua água é boa?
- Penso que sim...
- Qual é o seu nome?
- Que interessa o meu nome?!...
- É para fazer um inquérito...
- Onde mora?
- Desculpe, não dou informações pelo telefone.
Desligo.
São: Bombeiros, Asilos, Infantários, Casa de Caridade, e até Fundações!...
Muitas empresas, como seria natural, em lugar de darem benesses aos clientes antigos, tentam "tosquiá-los", certamente por serem fiéis...
O telefone fixo ou móvel, passaram a ser uma praga. Já não me refiro às mensagens...
É pior que as pragas do Egipto.
Humberto Pinho da Silva nasceu em Vila Nova de Gaia, Portugal, a 13 de Novembro de 1944. Frequentou o liceu Alexandre Herculano e o ICP (actual, Instituto Superior de Contabilidade e Administração). Em 1964 publicou, no semanário diocesano de Bragança, o primeiro conto, apadrinhado pelo Prof. Doutor Videira Pires. Tem colaboração espalhada pela imprensa portuguesa, brasileira, alemã, argentina, canadiana e USA. Foi redactor do jornal: “NG”. e é o coordenador do Blogue luso-brasileiro "PAZ".
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