Por: Fernando Calado
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)
Levantam-se cedo e vêm ao café. Trazem nos olhos a longa noite bragançana. E falam dos filhos licenciados que a França e a Alemanha acolheram amorosamente. Os filhos regressam sempre pelo natal e de novo partem e somente ficam as infindas ausências. Os da política vendem os sonhos dum país próspero onde corre leite e mel. Os idosos cismam e amaciam solidões.
— A minha mulher era tão bonita! E de novo regressa ao rio Sabor a lavar a roupa. Os filhos aprendem a nadar e a água é tão azul repleta de peixes que brilham nos remansos. Olhos largos onde não cabem todas as memórias.
A nostalgia não adoça o café do desencanto da vida, da precariedade do emprego, da rotina do funcionário público, das infindas partidas da terra que morre à beira dos montes.
Amacia-se a vida no café. Lê-se o jornal. Fala-se da desilusão do futebol sem profundidade, ou da política sem objetivos. Cheira a gel de banho, a champô para a caspa e quase se adivinham os pensamentos em cada mesa, em cada gesto, onde se calam as saudades da aldeia, do toque para a missa dominical, do jogo do fito, da ida à taberna, ou à horta onde se espreita o renovo.
Comenta-se que um velho político foi para Lisboa, no fascínio da capital, tentando agarrar a vida que lhe foge por entre os dedos. Longe, muito longe ficam os montes. O mundo mudou, mas ele, na sua provecta idade, não deu por isso. Ainda ontem na antiga Grécia os idosos eram os sábios, os homens da polis. Mas na antiga Grécia havia os escravos que trabalhavam enquanto os homens livres se dedicavam ao ócio. A filosofia é filha do ócio, da paciência e do vagar de pensar. Os jovens aprendiam com os idosos, com os pais e não havia conflito de gerações. Só era preciso ter jeito para aprender e um dia o paciente aprendiz seria igual ao seu mestre. Hoje, tudo mudou e a escola rapidamente ensina a aprender, dá competências e ferramentas para a sabedoria e com frequência o jovem que pensa e rompe os paradigmas pode ver mais longe que o seu antigo mestre. E as sociedades mudam, as tecnologias mudam e os paradigmas mudam com a rapidez duma estrela cadente. E o jovem entende muito bem que talvez aquela estrela já tenha morrido há milhares de anos e só agora a sua luz chega à Terra e esta é a novidade da flexibilidade do pensamento. Se os “velhos do Restelo” se calarem e regressarem ao aconchego da casa o mundo será mais feliz e próspero! Os idosos com a sua experiência devem ser um incentivo, um apoio sólido para os mais novos e não um entrave, no desejo mórbido de querer persistir num tempo que já passou.
Admiro-me com a inteligência e lucidez dos nossos jovens que fazem dos sonhos certezas, estudam, leem, investigam, inventam, enquanto certos conservadores que sempre foram velhos e têm medo de arriscar, se refugiam no consolo das grandes ideologias, nas inquestionáveis crenças de Lisboa. Arriscar assusta.
O café está cheio. Uma idosa entra agarrada à esperança. É dia 10, recebeu a magra reforma. Disseram-lhe que sai muito dinheiro nas “raspadinhas”.
— Talvez seja desta, talvez seja desta! Pague o café e dê-me uma “raspadinha”! Diz para o empregado.
A esperança resiste. Gastou o pouco dinheiro que se tinha. Talvez seja desta! Não foi.
A febre do jogo está a empobrecer mais os pobres e os aflitos!
Uma rapariga sorri: — Joguei um euro saíram-me dois! Já não estou a perder… Joga mais: — Não me saiu nada… paciência!
E joga-se compulsivamente, tentando a sorte. Os jogos imediatos como as “raspadinhas” são extremamente viciantes. Dinheiro fácil e rápido. E ninguém diz nada e ninguém faz nada, em nome da caridade.
— Fica para a próxima! E quase todos empobrecem mais à beira da sorte e do azar. Mais do azar do que da sorte.
A febre do jogo arruína, a febre do jogo empobrece, a febre do jogo mata os sonhos. Haja misericórdia! Mas todos se calam.
— A minha mulher era tão bonita! E de novo regressa ao rio Sabor a lavar a roupa. Os filhos aprendem a nadar e a água é tão azul repleta de peixes que brilham nos remansos. Olhos largos onde não cabem todas as memórias.
A nostalgia não adoça o café do desencanto da vida, da precariedade do emprego, da rotina do funcionário público, das infindas partidas da terra que morre à beira dos montes.
Amacia-se a vida no café. Lê-se o jornal. Fala-se da desilusão do futebol sem profundidade, ou da política sem objetivos. Cheira a gel de banho, a champô para a caspa e quase se adivinham os pensamentos em cada mesa, em cada gesto, onde se calam as saudades da aldeia, do toque para a missa dominical, do jogo do fito, da ida à taberna, ou à horta onde se espreita o renovo.
Comenta-se que um velho político foi para Lisboa, no fascínio da capital, tentando agarrar a vida que lhe foge por entre os dedos. Longe, muito longe ficam os montes. O mundo mudou, mas ele, na sua provecta idade, não deu por isso. Ainda ontem na antiga Grécia os idosos eram os sábios, os homens da polis. Mas na antiga Grécia havia os escravos que trabalhavam enquanto os homens livres se dedicavam ao ócio. A filosofia é filha do ócio, da paciência e do vagar de pensar. Os jovens aprendiam com os idosos, com os pais e não havia conflito de gerações. Só era preciso ter jeito para aprender e um dia o paciente aprendiz seria igual ao seu mestre. Hoje, tudo mudou e a escola rapidamente ensina a aprender, dá competências e ferramentas para a sabedoria e com frequência o jovem que pensa e rompe os paradigmas pode ver mais longe que o seu antigo mestre. E as sociedades mudam, as tecnologias mudam e os paradigmas mudam com a rapidez duma estrela cadente. E o jovem entende muito bem que talvez aquela estrela já tenha morrido há milhares de anos e só agora a sua luz chega à Terra e esta é a novidade da flexibilidade do pensamento. Se os “velhos do Restelo” se calarem e regressarem ao aconchego da casa o mundo será mais feliz e próspero! Os idosos com a sua experiência devem ser um incentivo, um apoio sólido para os mais novos e não um entrave, no desejo mórbido de querer persistir num tempo que já passou.
Admiro-me com a inteligência e lucidez dos nossos jovens que fazem dos sonhos certezas, estudam, leem, investigam, inventam, enquanto certos conservadores que sempre foram velhos e têm medo de arriscar, se refugiam no consolo das grandes ideologias, nas inquestionáveis crenças de Lisboa. Arriscar assusta.
O café está cheio. Uma idosa entra agarrada à esperança. É dia 10, recebeu a magra reforma. Disseram-lhe que sai muito dinheiro nas “raspadinhas”.
— Talvez seja desta, talvez seja desta! Pague o café e dê-me uma “raspadinha”! Diz para o empregado.
A esperança resiste. Gastou o pouco dinheiro que se tinha. Talvez seja desta! Não foi.
A febre do jogo está a empobrecer mais os pobres e os aflitos!
Uma rapariga sorri: — Joguei um euro saíram-me dois! Já não estou a perder… Joga mais: — Não me saiu nada… paciência!
E joga-se compulsivamente, tentando a sorte. Os jogos imediatos como as “raspadinhas” são extremamente viciantes. Dinheiro fácil e rápido. E ninguém diz nada e ninguém faz nada, em nome da caridade.
— Fica para a próxima! E quase todos empobrecem mais à beira da sorte e do azar. Mais do azar do que da sorte.
A febre do jogo arruína, a febre do jogo empobrece, a febre do jogo mata os sonhos. Haja misericórdia! Mas todos se calam.
Fernando Calado nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança.
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.
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