O ano de 1974 nasceu sob o signo da mudança. Durante meses, o país viveu entre a dúvida e a esperança, sem imaginar que, em abril, a liberdade desceria finalmente às ruas, carregada no som de uma canção. A música de intervenção, essa arma feita de palavras e melodias, explodiu nas rádios, nas praças, nas vozes de um povo que começava a acordar.
Canções do Zeca Afonso, Adriano Correia de Oliveira e tantos outros poetas da resistência ouviam-se por todo o lado, depois de anos silenciadas pela censura. De repente, “Grândola, Vila Morena” tornou-se símbolo da liberdade, senha de um novo tempo. A música deixou de ser refúgio e passou a ser bandeira, uma bandeira sem cor única, mas feita de vozes, sonhos e coragem.
As praças encheram-se de guitarras e de esperança. Os primeiros festivais e concertos ao ar livre surgiram espontaneamente, sem medo nem repressão. Onde antes se calava, agora cantava-se. Onde antes se marchava em silêncio, agora dançava-se ao som da revolução. As palavras “povo”, “igualdade” e “mudança” deixaram de ser perigosas e transformaram-se em versos, refrões e aplausos.
Era a juventude quem mais sentia o pulsar deste novo país. Os jovens organizaram-se em debates, assembleias populares, associações de bairro e os estudantes em RGA´s, discutiam o futuro, a política, o trabalho, a educação. Falava-se de democracia com entusiasmo e ingenuidade, mas também com uma profunda sede de justiça. As ruas eram escolas improvisadas, os cafés, parlamentos informais. A juventude acreditava, pela primeira vez, que a sua voz tinha peso, e que todas as palavras podiam ajudar a construir uma nação diferente.
Até o corpo e a roupa passaram a ser formas de expressão. O “look” informal invadiu as cidades. Calças de ganga gastas, camisolas com mensagens políticas, cabelos compridos e barbas que desafiavam os velhos padrões de ordem e moralidade. A liberdade não se vestia de uniforme, mas de autenticidade. O espelho de cada jovem refletia uma revolução íntima, a rutura com a rigidez do passado e a celebração de uma identidade livre, crítica e sonhadora.
Nas ruas, o país redescobria-se. As pessoas falavam umas com as outras, sorriam sem medo, partilhavam o pão e a palavra. A esperança corria solta como um vento morno de primavera, e tudo parecia possível. O que antes era proibido agora florescia. Jornais independentes, murais pintados, canções em cada esquina, poesia escrita à pressa nos muros e nos cadernos.
Em 1974, a música deu voz à revolução, os jovens deram-lhe rosto, e o povo deu-lhe alma. Foi o início de uma nova forma de viver, feita de sonhos, liberdade e dignidade.
Entre guitarras e cravos, entre canções e abraços, Portugal reencontrou o som da sua própria humanidade.
É urgente levar ao dia-a-dia das pessoas o que falta cumprir de Abril. Até relembrar-lhes que “é preciso acreditar”, que é possível um País mais solidário e humano e um mundo melhor para todos… SEM GUERRAS e com "pão" nas mesas de todos!
"Paz, pão, educação, saúde, habitação"...
Obs: A minha solidariedade para todos aqueles que sofreram, e muito, com esta "mudança" inevitável num país que se tinha isolado de todo o mundo civilizado.

Sem comentários:
Enviar um comentário