Um antigo juiz-presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Mirandela foi hoje condenado a dois anos e onze meses de prisão, com pena suspensa, por falsificar o estado de processos e por abuso de poder.
O arguido, demitido da magistratura há dois anos, no âmbito de um processo disciplinar, estava acusado de cinco crimes: um de falsidade informática, três de abuso de poder e um de violência doméstica, e incorria numa pena até 19 anos de prisão.
O coletivo de juízes do tribunal de Bragança que julgou o caso absolveu o arguido, de 50 anos, dos crimes de violência doméstica e de dois de abuso de poder, e condenou-o pelo restante à pena quase mínima de dois anos e onze meses, suspensa por igual período, por entender que "a simples censura do facto e a ameaça de prisão" cumpre o propósito.
A advogada de defesa, Marisa Simões, informou que vai recorrer da sentença por não concordar com a fundamentação, no caso do crime de falsidade informática, e por ter sido condenado por abuso de poder com base no testemunho de apenas uma funcionária.
O arguido confessou parte dos factos durante o julgamento, que começou há quase um ano, mas refutou que tivesse intenção de enganar o sistema informático ao dar como findos processos sem sentença ou decisão final para fins estatísticos, como concluiu o tribunal.
De acordo com a sentença, o antigo juiz aproveitou uma brecha no sistema e importava folhas em branco do "Word" apenas com a letra "s".
O Sistema de Informação dos Tribunais Administrativos e Fiscais (SITAF) assumia desta forma dezenas de processos administrativos e fiscais como findos.
Segundo ainda a sentença, entre 2010 e 2012, o então presidente do TAF de Mirandela enganou ainda os utilizadores que se queixavam de não terem sido notificados das decisões.
O tribunal concluiu, através de provas informáticas, que o juiz chegou a retirar da Internet dizeres como "falha do sistema" ou "não é possível encontrar a página" para dar aos utilizadores a falsa indicação de que havia falha de funcionamento do sistema.
Os processos ficaram nas datas findos estatisticamente, mas não havia produção de sentença, nem outra decisão final. Para o tribunal, tratou-se de o magistrado tentar obter uma vantagem indevida estatisticamente, enquanto todos os processos em causa se encontravam pendentes.
O tribunal deu também como provado que obrigou uma escrivã a elaborar um lista dos processos e a dá-los como findos no sistema, intimidando a mesma com o facto de ter poder disciplinar sobre ela.
"Ciente de que prejudicava o Estado e as partes, o arguido atuou sempre com o objetivo de alcançar uma vantagem que sabia não ser devida e sabia que a sua conduta era punida pela lei penal", concluíram os juízes.
O arguido estava ainda acusado de violência doméstica sobre a antiga companheira, mas o tribunal considerou "a prova insuficiente" e improcedentes os pedidos de indemnização civil.
O acórdão ditou a condenação a dois anos e cinco meses de prisão pelo crime de falsidade informática e um ano e quatro meses por abuso de poder.
O coletivo decidiu aplicar uma pena única próxima do limite mínimo de dois anos e onze meses de prisão, suspensa por igual período.
Apesar de ter como agravante a "clara consciência da ilicitude da atuação" que "põe em causa a confiança da comunidade nas funções judiciais", o tribunal considerou a suspensão da pena suficiente, até porque "já não exerce as funções de magistrado judicial".
O antigo juiz foi suspenso em 2012 e foi-lhe aplicada, dois anos depois, a pena de demissão no âmbito de um processo disciplinar, decisão da qual recorreu, desconhecendo-se ainda o desfecho.
HFI
Lusa/fim
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