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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

terça-feira, 26 de maio de 2020

Os refugiados políticos espanhóis em Bragança no séc. XIX

Desde cedo, o Estado português regulamentou a presença de espanhóis que por razões de natureza política se refugiavam no nosso território. Os espanhóis que por tal razão se recolhiam a Portugal eram tratados com a hospitalidade que correspondia aos amigos e aliados, guardando as leis do País. A autoridade pública procurava manter toda a imparcialidade para com os grupos de emigrados políticos, sem darem mostras nem indícios de maior favor e proteção a qualquer um deles. Aos espanhóis militares retiravam se todos os armamentos, apetrechos e qualquer material de guerra, sendo postos em depósito seguro e com guarda. Todos os militares e civis que porventura fossem autorizados a fixar a sua residência nas terras portuguesas próximas da fronteira, não podiam atentar contra o sossego e a tranquilidade das populações limítrofes.
Em 1841, chegaram ao Distrito de Bragança 253 homens de um regimento espanhol, facto comunicado ao chefe político de Salamanca que, anteriormente, tinha comunicado a conveniência de “serem desarmados e tratados como exigem os pactos internacionais, os súbditos de sua majestade católica que se refugiaram nesse Reino em consequência das dissensões políticas que por desventura afligem o País”. Os mesmos foram desarmados na povoação mirandesa de Malhadas, fazendo-os dirigir à Cidade de Bragança, onde ficaram a aguardar determinações superiores do Governo espanhol, referindo que se iria observar “a mais rigorosa neutralidade neste assunto, não menos que seguir os incontestáveis princípios do direito das gentes, observados pelas duas Nações Peninsulares nos tratados celebrados”.
Quando por motivos de dissensões políticas ou conflitos militares se verificava a entrada de militares espanhóis, em território português, eram tomadas providências para o internamento e trânsito dos mesmos. Em tais casos, eram elaboradas relações nominais de emigrados espanhóis, os quais, munidos de guias de marcha passadas pelo Governo Civil de Bragança, seguiam para os depósitos oficiais. Todavia, como aconteceu em 1842, sempre que havia uma solicitação expressa do Governo espanhol, ordenava-se “que se procedesse à entrega de todos os emigrados que do Reino vizinho vieram procurar a proteção deste Reino, cumprindo por isso que, sem perda de tempo, se faça intimar a todos e quaisquer refugiados espanhóis militares ou paisanos que existam na Cidade de Bragança para, imediatamente, se apresentarem os primeiros ao comandante desta subdivisão militar, e os últimos nessa Administração de Concelho, a fim de lhe serem passadas as respetivas guias”.
Com efeito, a estadia dos espanhóis refugiados em Bragança nem sempre era pacífica. Em janeiro de 1844, na sequência de uma “desordem” que ocorreu na feira de Chãos, na qual morreram alguns guardas alfandegários e foram presos numerosos indivíduos que recolheram à cadeia de Bragança, houve uma tentativa de “perturbadores” soltarem os presos, boa parte dos quais eram espanhóis, o que levou o Governador Civil a “fazer imediatamente sair e internar os espanhóis que por motivos políticos” se achavam aí  residindo.
Acontecia, por vezes, que os emigrados se evadiam dos depósitos oficiais, e que alguns deles não eram realmente militares, outrossim, civis que demandavam o nosso território com este falso estatuto, e que, por tal, eram detidos.
Os governadores civis de Bragança davam com regularidade instruções aos regedores das freguesias confinantes com a fronteira, para que vigiassem os espanhóis que não fossem os que habitualmente se ocupavam em negócios próprios ou vinham empregar-se nos trabalhos agrícolas, detendo os que levantassem suspeitas ou se apresentassem para entrar ou sair do Reino sem estarem munidos de passaporte nem dos documentos legais emitidos em Espanha. Os fiscais da alfândega destacados nos postos de fronteira deveriam igualmente estar atentos a espanhóis desconhecidos localmente, assim como os elementos dos destacamentos militares que guarneciam os pontos da raia mais sensíveis, de forma a anularem qualquer eventual plano que atentasse contra a tranquilidade pública e a ordem estabelecida nos dois países peninsulares.
Os espanhóis que por motivos políticos se refugiavam na povoação da raia eram obrigados a instalar-se em povoações portuguesas distantes, no mínimo a doze léguas da fronteira, concedendo-se-lhes para tal fim as respetivas guias de trânsito.
Torna-se evidente que o número de emigrados em Bragança era diretamente proporcional à instabilidade política que por vezes se vivia em Espanha, como aconteceu durante a República espanhola de 1873-1874. Nesse ano, o Governador Civil de Bragança alertava os administradores concelhios que, “não sendo verdadeiramente emigrados os espanhóis que se refugiarem no nosso território com receio da anarquia da sua terra, e não havendo suspeitas que atentem contra o Governo do seu país, pode consentir-se a residência nesse Concelho, mas exerça sempre sobre todos eles uma ativa vigilância. Se porém os refugiados forem em grande número, é provável que não possam permanecer ali por falta de comodidades, podem vir para esta Cidade ou para outro ponto do Reino que mais lhe convenha”.
E, paralelamente, informou o Governador Civil de Zamora de que, pela sua parte, tomara já “todas as providências para que as povoações portuguesas da fronteira sejam cuidadosamente vigiadas, a fim de evitar que nelas permaneçam quaisquer emigrados espanhóis ou indivíduos suspeitos de quererem entrar naquele reino para perturbar a ordem e tranquilidade públicas”. Em Bragança e no seu Distrito – informava Tomás Ribeiro, Governador Civil em 6 de setembro de 1873 – viviam muitos espanhóis, cujo número crescera “notavelmente” com os refugiados que vinham abrigar-se “à sombra da nossa paz”.
Tal não impediu que, em agosto de 1873, várias centenas de espanhóis, “regularmente armados”, entrassem pelo Concelho de Vinhais com a intenção de se dirigirem para Bragança, instalando o pânico na Cidade, uma vez que – dizia-se –, aqueles tinham cometido os maiores excessos em território espanhol. A verdade é que os emigrados espanhóis entregaram as armas a forças militares de Bragança, tendo sido conduzidos à Cidade, de onde mais tarde marcharam para o Porto, enquadrados por uma força portuguesa .
As despesas com estes emigrados – alimentação, alojamento e transportes dos dias em que se efetuava a deslocação dos concelhos raianos por onde tinham entrado até à Cidade de Bragança e daqui para os depósitos oficiais –, eram asseguradas pelas autoridades locais e remetidas para o Ministério do Reino.

Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa

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