Mensageiro de Bragança- Como é que surge o Santiago Belacqua?
Santiago Belacqua - Em 2010 sofri uma rutura no tendão de Aquiles, fui mal diagnosticado duas vezes, fui operado em Lisboa, contraí uma infeção no bloco operatório, estive dez meses de cama... hoje quase dez anos mais tarde é uma infeção ativa. Ao fim de um ano desatei a pintar porque estava não cansado, foi muito tempo de cama, era televisão e livros... então dediquei-me à pintura porque eu sempre tive o devido equipamento, sempre tive telas, pincéis e tintas, mas não queria ser artista plástico, não queria ser pintor, não queria fazer absolutamente nada, a não ser por carolice.
MDB.: Era uma espécie de terapia?
SB.: Também, mas acima de tudo porque não podia trabalhar, não podia sair de casa. Até para tomar café era um amigo que me ia buscar a casa.
MDB- Antes disso tinha uma vida profissional dedicada ao mundo empresarial?
SB.: Era funcionário de uma multinacional alemã, era gestor, aqui em Portugal. Também fiz algumas coisas sempre na área comercial, porque estudei gestão.
MDB- Depois da operação, quando decidiu que afinal queria dedicar-se mesmo a isto?
Santiago- Aconteceu em março/abril de 2013. Publicava uma ou outra pintura nas redes sociais, os meus amigos perguntavam o que era aquilo, não sabiam que eu tinha esta tendência para a pintura e então fui convidado para fazer uma exposição em Braga. Ali começou a desenhar-se o artista. Perguntavam, admirados, se eu fazia isto. No mês seguinte decidi dar-lhes um artista.
Comecei a fotografar o nosso património arquitetónico à volta de Braga e criei aquele conceito de Portugal Monumental, o cruzamento da fotografia com a pintura, com a arte plástica.
Fiz primeiro uma exposição, por livre iniciativa, na Torre de Menagem de Braga. Dali recebi o convite para expor na Assembleia da República, onde estive em 2014.
Em dezembro de 2013 fui convidado para criar duas peças para oferecer ao Papa Francisco e, em dezembro, o Papa Francisco exibia precisamente um quadro meu e a imagem começou a circular. Acho que foi aí que verdadeiramente surgiu o artista. Realizei duas exposições em Lisboa, na Assembleia da República numa galeria privada, expus logo de seguida no Teatro Circo de Braga, a convite da Câmara Municipal e parei dois anos, de 2014 a 2016. Parei porque lá vem outra vez a dúvida, “mas isto é que é o artista?” Parei e pensei, comecei a sentir o que é que as pessoas realmente gostam e descobri o sentimento comum a muita gente, que é a fé, e desatei a pintar Jesus Cristo e Nossa Senhora, acima de tudo Jesus Cristo, logo a seguir vem a coleção da Pietá.
Em 2016, no Museu Pio XII, em Braga, apresentei o ‘Cristo suspenso’ e fui convidado para expor no ano seguinte, também na Quaresma.
MDB- Naqueles dois anos continuou a pintar?
Santiago- Sempre a pintar, claro.
MDB- Foi quando pintou as 108 Pietás?
Santiago- Sim, entre 2015/2016 comecei já com a Nossa Senhora da Piedade, portanto Pietá, que só foi apresentada em 2017, sendo que em 2016 quando apresentei ‘Cristo suspenso’ já levei três Pietás da nova coleção, daí vem o convite para no ano seguinte, também na quaresma de Braga e no ano seguinte expus também no Museu Pio XII a Pietá e desde então tenho-me dedicado exclusivamente à Arte Sacra.
MDB- Existe alguma história por detrás do nome Santiago Belacqua?
Santiago- Auto batizei-me
MDB- Mas só a partir do momento que começou a pintura?
Santiago- Não, eu pintava e não assinava, porque não me identificava e pensava que tinha que haver um nome, tinha que haver qualquer coisa que tivesse a ver comigo. Então o nome Belacqua surgiu numa situação que poderá parecer surpreendente e eu parei, pensei, Belacqua é boa água, não bela mas boa água que é o que eu pretendo ser. Acho que nascemos por um de dois motivos: ou deixamos obra para a humanidade ou tentamos ser boas pessoas. Eu estou na segunda.
MDB- A partir de que momento se dedicou a 100% à pintura?
Santiago- Desde que me levantei da cama, desde que estive aqueles meses todos a recuperar da cirurgia.
MDB- Mas sempre com aquelas reticências sabendo que era uma vida mais difícil em termos do dia a dia?
Santiago- Também não tinha grandes opções, não era um dado adquirido para mim fazer isso a tempo inteiro. Trabalhei muito a recuperação física, naturalmente, a minha intenção era regressar ao mercado de trabalho.
Mas também se torna difícil entrar de novo e tendo, na altura como hoje, a dificuldade de não poder trabalhar 8/10 horas por dia sem ter a liberdade de poder parar. Então dediquei-me à pintura cada vez mais, criou-se o artista.
MDB- Entretanto surgiu o convite para expor no Vaticano como primeiro artista português convidado a expor no Vaticano. Já há previsão para quando se vai realizar a exposição?
Santiago- Isso não devia ter vindo a público, porque o convite poderá ser, e é seguramente, gratificante, não há sequer qualquer expressão ou adjetivo para exprimir o sentimento, porque expor no Vaticano, para mim, enquanto católico, será o expoente máximo.
Agora, claro que, ao mesmo tempo, o convite desta envergadura acarreta custos elevados que eu não consigo suportar. A dada altura foi difícil captar o interesse público para apoiar esta exposição. O tempo foi passando e o que aconteceu foi que a minha coleção foi aumentando, foi crescendo e hoje estou na Catedral de Bragança porque tenho uma coleção que, aparentemente, se pode mostrar. Se tudo correr bem, brevemente acho que vou ter aí o tal momento feliz.
MDB- Sente necessidade todos os dias de se exprimir na pintura? Ou há uma disciplina de trabalho?
Santiago- Todos os dias! Há uma disciplina de trabalho, seguramente, tal como noutras profissões. Às 6:30 horas tenho o mundo a funcionar no meu cérebro e não há outra maneira, não consigo corrigir isto, nem quero.
MDB- O Santiago mostra uma relação especial com as suas obras, ao ponto de não as vender. Porquê?
Santiago- Tenho uma relação especial porque há um objetivo por detrás disto tudo. Seria para mim fácil - e conseguirei com certeza recuperar um bocadinho o meu nível de vida vendendo - mas ainda não é a altura, e provavelmente nunca.
MDB- Nunca vendeu nenhuma obra das suas?
Santiago- Pequenas, aos mais próximos, que sentem que o artista também tem de pagar faturas. A maior parte das pessoas nem pergunta pelo preço. Confesso que, de certa forma, isto também me deixa um bocado, não diria orgulhoso... Não perguntam porque acham que é intangível, as pessoas só gostam de ver. Então comecei a reproduzir as obras mais acarinhadas em formato tangível, que é o azulejo português, com as minhas cores, numa técnica que não é do azulejo português. Produzo as minhas pinturas em azulejos que passam dos 5cm e vai entretanto até aos 60x60cm e estou a criar um painel de 1,20m por 1,60m também cerâmico.
António G. Rodrigues
Sem comentários:
Enviar um comentário