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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 28 de novembro de 2020

Sebastião Alba - Poeta insubmisso

 Quem é este poeta que tanto me apaixona?
Poderia começar por debitar o que, facilmente, ireis encontrar vertido por todo o lado em páginas públicas na Internet. Deixo-vos esse gozo da descoberta.
Resta-me, então, falar do que não está escrito, da emoção que sinto quando toco neste nome maior: Sebastião Alba, pseudónimo do Dinis Albano Carneiro Gonçalves (Braga 1940-2000).
Estareis neste momento a questionar - o que é que me liga a ele?
Quando há dias escrevi o poema NASCI EM TERRA DE POETAS estava a pensar no Nuno Nozelos, no Sebastião Alba, no Ernesto Rodrigues e na Ana Bárbara de Santo António e, no aconchego de berço que Torre de Dona Chama tem.
Para quando um Parque dos Poetas na nossa Torre?
Dir-me-eis: mas o Nuno Nozelos e o Sebastião Alba não nasceram, propriamente, em Torre de Dona Chama.
E estais cobertos de razão. Ser da Torre não advém da condição de nascimento, mas do amor que se tem pela terra. É preciso sentir o fervor crescente do encanto quando se chega à Torre, o cheiro que a natureza emana, o colorido da paisagem, o silêncio, o sossego, a ausência do bulício da cidade. É o reflorescer de emoções despoletadas a cada regresso. É a magia de sentir tudo fresco e novo como se fosse candura divina. É o impensável e indescritível a percorrer as veias mantendo a alma em resplendor. É ser-se genuíno e simples abraçando os seus com clamor.
Tanto o Nuno como o Sebastião, a seu pedido, jazem no cemitério da Torre. Quereis prova maior!?
Hoje, quero centrar-me no Sebastião Alba, o nosso Dinis, filho de gente da Torre.
Quanto mais procuro saber sobre ele, mais cresce a vontade de abraçar a alma deste Grande Poeta e Homem. Não é apenas a obra que nos deixou e que me traz em desassossego, é o facto de eu sentir que tenho de ir ao encontro do Homem, conhecê-lo nas diversas faces e camadas para o compreender, para me aproximar, para saber a cada dia um pouco mais, para lhe tocar na aura e descer à essência.
Descobri um homem sensível, inteligente, cultíssimo, de uma memória extraordinária, um ser inebriante, um nómada que tinha por casa a mortalha, insubmisso aos homens, às leis, às regras, à sociedade, um anarca.
Estareis por esta altura a levantar a ponta do dedo para me lembrar de que este homem vivia como um sem-abrigo, era um ser errante despojado de bens, quando até tinha família; dormia ao relento; andava sempre acompanhado de um rádio sintonizado na Antena 2; trazia no bolso a harmónica de beiços que tocava divinamente; uma garrafa de vinho escondida dentro de um saco de plástico; trazia a roupa do corpo e nada mais; passava fome e algumas pessoas davam-lhe de comer; escrevia divinamente, o que a mente lhe ditava, em qualquer pedaço de papel; deixava pequenos escritos como bilhetes, aqui e acolá, pelas pessoas a quem queria bem. Alguns que se aproximavam, sentiam repulsa pelo cheiro e o modo rude como ele às vezes os tratava. Só os verdadeiros amigos ficavam. Então, o que há nisto tudo de fascinante e arrebatador?
Ah, se pudesse voltar no tempo, ao tempo em que ele deambulava por Torre de Dona Chama, aquando das visitas à terra, à família e aos amigos! Tentaria aproximar-me dele, pouco a pouco, para o ir conhecendo, matando a minha sede na sua imensa sapiência, humanismo e sensibilidade. Quem sabe, não nos entenderíamos e trocaríamos papeizinhos escritos com algum poema, quem sabe!?
Descobri alguns pontos comuns que nos teriam aproximado, julgo eu. Ambos amamos a liberdade, os pássaros e seu canto, o voo livre, o ser humano enquanto frágil, por exemplo: as crianças e os idosos, a música, a literatura, a poesia, o amor romântico, o mar.
Estudei sempre fora e por longe fiquei a trabalhar. No pouco tempo que passei na Torre, nunca tive a sorte de me cruzar com ele.
Dinis viveu além do limite humano e excedeu-se na poesia. Poeta de extraordinária qualidade; Ser Humano a estudar no seu todo.

Deixo-vos, para deleite, com uma poesia sua...

Na sua primordial existência…

Na sua primordial existência
a poesia deixar-me-á da ternura
só o que é defensável

e à margem do papel em que escrevi
as cidades e os campos
através dos quais me acenou

apartará do meu paladar
o sabor do sagrado
com que ainda a nomeie

já não buscarei nos ensaios que cerco lhe moviam!
e nos ideais por que alheada
roçagou
que da janela eu não deslinde
de um cão em paz
a visagem ancestral
e a minha emoção seja enfim sedentária

e recém-chegada a noite finde
sem dar acordo de si.

Sebastião Alba
 
Teresa A. Ferreira, 28-11-2020

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