O Largo das Sereias, no Centro Histórico de Carrazeda de Ansiães, esteve ontem à noite a abarrotar de pessoas que quiseram assistir ao Julgamento do Pai da Fartura. A iniciativa, promovida pela Câmara Municipal em parceria com a Associação Zíngaros, insere-se nas comemorações tradicionais do Entrudo nesta localidade duriense.
Depois de dois anos de interregno, a tradição noturna voltou às ruas de Carrazeda, tendo nela participado centenas de pessoas, que num alarido de berros atribuíram, mais uma vez, ao “Pai da Fartura” a responsabilidade dos males e das desgraças que enfermam a localidade e o mundo.
Trata-se de um ritual pagão de declarada sátira social, dita em verso, por um “juiz” que proclama no final da declamação o rebentamento de um boneco que segue em cortejo funerário até ser despedaçado e queimado em ato público.
O povo arrasta o “Pai da Fartura”, o responsável pelos excessos, pelas mentiras e enganos, para um julgamento, junto ao Pelourinho da vila. Primeiro ouvem-se as lamúrias de uma figura que de antemão se sabe vai ser condenada. Depois a sentença, extensa e encenada pelos Zíngaros de Carrazeda de Ansiães. Versos satíricos são lidos a alta voz, provocando riso e aplausos na comunidade que neste ano de 2023 acorreu em massa para assistir ao evento.
A sentença já está antecipadamente decidida: pena de morte. O método também: rebentamento do “Pai da Fartura”.
Não há recurso possível, as “esposas” do “pai da fartura”, que em breve serão viúvas, choram aos gritos, e vão carpindo durante todo o cortejo fúnebre, ao som dos tambores que marcam o compasso da marcha e das sirenes dos carros dos bombeiros.
Literalmente o “pai da fartura” é explodido, desfeito em pó. Os festejos seguintes já são comedidos, até porque o “pai da fartura” já se foi.
Apesar de se tratar de uma festa pagã, este momento representa o fim de um ciclo, de fartura e de folia, e o início do período de Quaresma que, seguindo a religião católica, representa sacrifícios, jejum, abstinência, recolhimento e oração.
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