Um acidente

 Numa terra pequena como Macedo era nesses tempos, tudo o que pudesse arranhar, ainda que de leve, a rotina era explorado até à exaustão, contado e recontado, comentado à mesa do café e nas repartições.
A foto testemunha a curiosidade — ou talvez antes avidez — com que as pessoas se apoderaram de um ‘fait divers’ a que por acaso assisti. Foi assim: ao fundo do jardim municipal, um Volkswagen Carocha meio desgovernado abalroou um Ford 100 Cavalos estacionado perto dos talhos e da vulgarmente chamada Associação, redução do nome oficial da que era a Associação de Socorros Mútuos dos Artistas Macedenses. Foi um toque muito ligeiro, que apenas causou danos nos guarda-lamas de uma e outra viatura.
Pois não queiram saber a multidão que se reuniu ali para ver os estragos que, como foi dado a perceber, não passaram de uns arranhões insignificantes. Eu andava por ali e, por casualidade, trazia comigo uma máquina fotográfica, graças à qual pude documentar a excitação que causou um tão inócuo acidente. 
Inócuo, sem dúvida, mas verdadeiramente importante para quem a mais corriqueira ocorrência é um sopro de novidade a pôr uma nota de diferença nos dias sempre iguais.

A. M. Pires Cabral