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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Do Clube de Caçadores e do Centro Republicano de Bragança

O Clube de Caçadores, importante associação local, com significado social e cultural, passa por diversas vicissitudes. Perceber-se-á porque lhe damos mais atenção. Em abril de 1908, era notícia no jornal O Nordeste: "Marcha de vento em popa esta simpática agremiação há pouco fundada e admiravelmente instalada no belo edifício onde esteve por longos anos o extinto Clube Brigantino. Acresce de dia para dia o número de sócios, e projetam-se para breve algumas diversões que, pela sua novidade entre nós, hão de certamente agradar imenso".


O Clube instala-se na Casa do Arco e vai desenvolver, para além de atividades ligadas à cinegética e ao tiro, outras iniciativas e manifestações lúdicas.
Visava a defesa das espécies cinegéticas e piscícolas, pugnando pela repressão de atividades furtivas durante o defeso – que, pelos vistos, pouco se respeitava na região. Pretendia-se fazer da caça e da pesca atividades "desportivas" e lúdicas.
As festas de inauguração – com torneio de tiro aos pombos e outras diversões desportivas (de "sport") como tiro à bala na carreira de tiro e a realização de um concerto musical no salão do Clube – aconteceram a 28 de junho.
São frequentes as notícias sobre as atividades festivas do Clube. A diversão passava por iniciativas que, refletindo a ambiência civilizacional da época, visavam proporcionar encontros sentimentais: a direção convidava, com uma estranha mensagem, para a festa de inauguração, as senhoras que "não tivessem representante varão na família" e os "cavalheiros" que, porventura, "ao tempo se achassem de passagem por Bragança". No dia de Ano Novo de 1910 realizou-se uma concorrida soirée, dançando-se animadamente até às quatro horas da manhã Os torneios de tiro aos pombos – o "desporto" para o qual o clube estava mais vocacionado – proporcionavam animados convívios. Com as atividades lúdicas a crescerem, a direção manda fazer a instalação da luz de acetileno e projeta arrendar um campo para jogos de sport. Pelas notícias da época, conclui-se que a atividade do Clube de Caçadores seria mais significativa do que a do Grémio de Bragança, fundado no mesmo ano.
Mas esta instituição tinha os seus dias contados. Vai ser absorvida, por razões de ordem política, já depois do 5 de Outubro, pelo Centro Republicano. Raul Teixeira, em 5 de março de 1911, reporta a morte do Clube, com algum pesar, até porque parece não estar muito de acordo com as verdadeiras razões que levaram à sua extinção “Adeus Clube!... Lá ficou resolvido anteontem a dissolução do próspero Clube dos Caçadores. Nele se vai instalar o Centro Republicano Emídio Garcia". Faz pena ver acabar uma "casa fundada com tanto amor… e que agora entrava numa fase de acentuada prosperidade". Confessa não ter intervindo "pró ou contra" na dissolução, apesar de ser sócio fundador, "para não criar dificuldades à República… como agora é de uso dizer-se”.
A absorção pelo Centro Republicano – que era necessário criar em Bragança – teria resultado de uma manobra política das forças e autoridades republicanas. O recém-criado Centro herdava as instalações e recebia muitos dos sócios do Clube; além disso, integrava nos seus programas as atividades culturais e lúdicas que vinham sendo realizadas pela extinta instituição. A "jogada política", fruto de um plano estratégico bem gizado, ter-se-ia realizado com êxito. Para não "criar dificuldades" e para apoiar a causa da República, a direção do Clube anuiu.
Fez o "jogo" dos republicanos e muitos dos seus sócios passaram a integrar a nova associação. De um dia para o outro, a agremiação republicana absorvia uma coletividade com créditos firmados e bem implantada.
Para a reunião de 3 de março de 1911, convocada pelo Centro Republicano Emídio Garcia, fez-se constar que os sócios do Clube de Caçadores desejavam propor uma fusão com o Centro. No dia 7, juntavam-se os representantes das duas associações para lançarem as bases organizativas da nova sociedade. A Assembleia Geral do Centro reuniu no dia seguinte, "tendo votado a fusão do Centro com o antigo Clube de Caçadores". Nos finais de abril, reúne novamente a Assembleia Geral dos sócios, para eleger a Comissão Republicana distrital que deveria dar "unidade e direção aos trabalhos da política republicana do Distrito, em harmonia com a lei orgânica do Partido Republicano". Inequívocos, os intuitos políticos e propagandísticos.
O Centro Republicano "aparece na sua plenitude" em fevereiro de 1911. A Pátria Nova de 10 desse mês transcreve o "primoroso" jornal dirigido pelo exmo. ministro do Interior, a República: "Segundo resolveu a Comissão Municipal de Bragança, na sua reunião de 23 de janeiro último, o centro de propaganda eleitoral, que a mesma está organizando, denominar-se-á Centro Republicano Emídio Garcia. Assim, perpetuará o nome glorioso do ilustre filho de Bragança, que tão denodadamente trabalhou em Portugal pela ideia democrática, ora na sua cátedra de professor da Universidade, ora na imprensa e nos comícios".
A inauguração, na Casa do Arco, acontece a 18 de fevereiro. Presidiu à sessão inaugural o Governador Civil.
Intervenções do Governador, dos drs. Eduardo Faria e Martins Morgado e do tenente Honorato Morais. “Ato muito concorrido. A banda de Infantaria 10 tocou no pátio… Inaugurado o retrato de Emídio Garcia, sábio lente que tanto vulgarizou a filosofia comtista em Portugal" (Jornal de Bragança de 20 de fevereiro). Pelas informações de A Pátria Nova do dia 24, as salas da Casa do Arco estavam cheias: funcionários, oficiais da guarnição, professores, comerciantes, industriais, senhoras. O tenente Honorato de Morais leu uma biografia de Emídio Garcia.
A banda regimental executou a Portuguesa e o Hino da Maria da Fonte, na ocasião em que era descerrado o retrato. No fim da sessão, pelas 11 horas da noite, foram dadas vivas à Pátria, à República e ao Governo Provisório.
Já O Concelho de Bragança, órgão do designado “Partido Republicano Conservador Local” – dirigidos um e outro por António Cagigal –, de inspiração religiosa e que se constitui para combater os desvios dos republicanos no poder e do Governador Civil, relata no número de 5 de março de 1911, com ironia e desconfiança crítica, as festividades de inauguração. Manifestações gradas de republicanismo, salas apinhadas, mas se Emídio Garcia aparecesse ali – como Cristo a azorragar os vendilhões – poucas pessoas ficariam.
Os propósitos visados pelo Centro eram hegemónicos. Na reunião, já referida, para discutir a fusão, ficou assente que esta só se concretizaria se a agremiação republicana conservasse uma posição dominante, o que veio a acontecer. A nova sociedade, fruto da reunião dos sócios das duas casas, conservaria o nome de Centro Republicano Emídio Garcia. O Centro nasce para “coadjuvar a Comissão Republicana deste Distrito na árdua missão de auxiliar o Governo Provisório da República na consolidação do regime”.
Nos meses de abril e maio, o Centro – já com a sede na Praça Almeida Garrett – serve de palco a jornadas de grande brilho, aquando das visitas dos ministros da Guerra e do Interior. Alguma ânsia na constituição e instalação desta agremiação poder-se-ia explicar, também, pela necessidade de receber os membros do Governo, que se anunciavam, num Centro Republicano.
Vai ser grande a atividade política e associativa do Centro: cidadãos de prestígio integram a associação, que se constitui como um importante núcleo dinamizador “da vida cultural, social e artística da Cidade”. No campo das atividades lúdicas, contam-se os “saraus dramáticos”, promovidos pela boa vontade e “arte” de alguns sócios, bailes de carnaval e de fim de ano e outras festividades. Sinal dos tempos, a dinâmica instituição, com a revolução de 1926, passou a viver um período de manifesta apatia.

Título: Bragança na Época Contemporânea (1820-2012)
Edição: Câmara Municipal de Bragança
Investigação: CEPESE – Centro de Estudos da População, Economia e Sociedade
Coordenação: Fernando de Sousa

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