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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

Memórias da escola - Histórias com final feliz…

Por: Maria dos Reis Gomes
(colaboradora do Memórias...e outras coisas...)

Famosos com dislexia
Recentemente assisti a um concerto de músicos jovens onde atuava um baterista que foi meu aluno. O convite foi-me feito por ele e fui assistir com todo o gosto e entusiasmo.
Na sequência deste episódio, escrevi as histórias que hoje publico.
São histórias de crianças, hoje adultos bem-sucedidos. Na altura com sete, oito e dez anos.  Foram-me encaminhados com diagnóstico de dislexia. Sempre gostei de trabalhar com estas singularidades porque quando diagnosticadas e bem orientadas, não se tornam pesadelos.
Apesar do uso da expressão “pareces disléxico/a” se ter banalizado e repetido muitas vezes para ridicularizar o outro, convém que se “olhe” a condição com atenção e sobretudo que não se deixe transformar num complexo de inferioridade que prejudica o desenvolvimento saudável do seu portador e angustia as famílias.
Para nos situarmos convém recordar o conceito de dislexia que, segundo a Federação Mundial de Neurologia define como:
 “uma perturbação que se manifesta pela dificuldade na aprendizagem da leitura e da escrita apesar de uma adequada inteligência, educação convencional e oportunidades sócio culturais”
Estamos assim perante uma dificuldade em descodificar e perceber a informação escrita, que atinge todas as classes sociais. 
Como se manifesta através de algum embaraço na leitura e na escrita, é por isso normalmente detetada no início da escolaridade obrigatória. Entre outros sinais, aparecem as inversões e troca de letras quer na leitura quer na escrita das palavras.
Partindo do pressuposto que esta característica no indivíduo se mantém ao longo da vida, é fundamental que a reeducação preveja aceitação e o desenvolvimento de estratégias de controlo eficaz. 
Passemos então às histórias do João, do Filipe e do Pedro.
O João foi diagnosticado com dislexia depois de apresentar os sinais já referenciados. Estava em risco de ser retido no 2º ano de escolaridade.
Tratava-se de uma criança amável, tranquila, com competências a nível motricidade global e fina, com uma mãe atenta mas não stressada. Desde pequeno manifestou o gosto pela música e improvisava uma bateria a partir de objetos que ia encontrando em casa da avó.  Nas aprendizagens académicas formais eram evidentes, a troca de letras, a leitura hesitante e um desinteresse total por esta tarefa. 
Foi desenvolvido um trabalho durante dois anos com a participação da professora, dos pais e um empenho enorme do João que fez um percurso académico focado essencialmente nas notas musicais, mas também no essencial das aprendizagens académicas formais que o levaram à ESMAE no Porto onde se formou. Hoje é professor de Educação Musical e é baterista numa banda.
O Filipe, hoje informático e designer, foi sinalizado já a frequentar o 4º ano de escolaridade num colégio privado. Bonacheirão, bem disposto com duas frentes de combate… a necessidade de se preparar para o 5ºano de escolaridade e a necessidade de perder peso. Revelava já uma habilidade enorme para lidar com os computadores e desenhava maravilhosamente. Houve necessidade de trabalhar a motricidade global, a leitura e a escrita e valorizar a suas aptidões já pré existentes. A família colaborou na estimulação da leitura e da escrita pois, impunha-se alargar o vocabulário por forma a ultrapassar as hesitações na escrita. Investiu-se na leitura recorrendo às gravações de textos lidos em voz alta com e sem preparação prévia. Decidiu-se, com a sua anuência, repetir o 4º ano de escolaridade com as vantagens que esta medida podia trazer para a segurança do aluno. 
O Pedro foi sinalizado já com 10 anos e a frequentar o 5ºano de escolaridade. Foi uma tia, professora e a frequentar uma acção de formação sobre esta temática, que me pediu para observar o sobrinho. Foram os primeiros testes escritos que começaram a aparecer no 5ºano que fizeram soar os alarmes. O Pedro usava uma letra ilegível nos testes escritos que levava os professores a riscar de alto a baixo por não conseguirem ler. Era pacato mas ágil a nível de pensamento e “craque” na equipa de futebol com os seus colegas. Não foi fácil chegar a ele. Mas com o trabalho dedicado da tia e com apoio de retaguarda foram potenciadas todas as aprendizagens que o aluno já  tinha feito ao longo dos 4 anos de escola. O Pedro não era disgráfico. O Pedro fazia uma letra ilegível por opção, pois convivia melhor com a atitude dos professores riscarem o teste de alto a baixo do que se lhe “contassem os erros”. Foi necessário ainda evocar a legislação que protege estes casos, facto a que a escola aderiu e colaborou. 
O Pedro fez o 9º ano, continuou a jogar futebol na equipa local e é operário numa fábrica de calçado de uma marca internacional.
Estes exemplos são paradigmáticos da tríade funcional “Aluno-Escola-Família”. Para que a mudança de comportamentos e atitudes seja uma realidade será necessário que todos os intervenientes estejam disponíveis para esse efeito.
Nestes 3 casos, houve um interesse mutuo e uma entreajuda capaz de promover essa transformação e sobretudo uma atitude de valorização das conquistas que cada aluno foi realizando.

Maria dos Reis Gomes
14 de Novembro de 2021

Maria dos Reis Gomes, nascida e criada em Bragança. Estudou na Escola do Magistério em Bragança, no Instituto António Aurélio da Costa Ferreira em Lisboa e na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação no Porto, onde reside.
Sempre focada no ensino e na aprendizagem de crianças com NEE (Necessidades Educativas Específicas) deu aulas no CEE (Centro de Educação Especial em Bragança). Já no Porto integrou o Departamento de Educação Especial da DREN trabalhando numa perspetiva de “ escola para todos, com todos na escola). Deu aulas na ESE Jean Piaget e ESE Paula Frassinetti. No Porto. A escola, a educação e a qualidade destas realidades, são os mundos que me fazem gravitar. 
Acredito que, tal como afirmou Epicteto “ Só a educação liberta”. Os meus escritos procuram reflectir esta ideia filosófica.

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