A Equipa de Atenção Biopsicossocial à Pessoa Idosa abrange as valências de enfermagem, assistência social, psicologia, nutrição, sociologia e psicomotrição. O grupo de técnicos desloca-se diariamente ao domicílio dos idosos para lhes prestar apoio, naquilo que é previamente identificado como prioritário. Segundo justificou a coordenadora e psicomotricista da equipa, Telma Figueiredo, tudo isto nasceu fruto de o concelho ser “extremamente envelhecido” e porque “há pessoas que não querem colocar os idosos no lar”, sendo que “com ajuda torna-se mais fácil tratá-los e tê-los em casa”. Esta é assim uma forma de apoiar os idosos e de ajudar a cuidar quem cuida, não só no trabalho que se tem com o idoso, como no próprio cuidado que devem ter consigo. “Uma pessoas que está 24 horas por dia a tomar conta de outra pessoa não tem uma vida fácil.”, assinalou Telma Figueiredo, que considera que não é visitando estas pessoas, uma vez por semana, que se fazem “milagres”, mas a verdade é que o trabalho tem sido profícuo.
22 anos de cuidados
Elvira Realista tem 70 anos e cuida do marido. É de Sendim da Serra e há 22 anos que a vida lhe trocou as voltas. O marido, aos 55 anos, teve um AVC e, “a partir daí, tudo mudou”. Na altura, ficou com o lado esquerdo completamente paralisado. “Tinha que lhe dar banho, vesti-lo e calçá-lo. Sentava-o à mesa, mas ele comia pela mão dele. Agora já não é assim”, contou a mulher que, à época, aos 48 anos adiou a vida tida por normal, deixando o café e o mini-mercado que dirigia, em prol do marido. Há cerca de 12 anos as coisas foram piorando. O marido de Elvira começou a ficar demente e, “neste momento, não conhece ninguém”. Com o marido acamado, além do apoio da equipa recém-apresentada, Elvira Realista conta ainda com a visita diária de duas profissionais do Centro Social e Paroquial de Picões, que a ajudam a levantar o marido logo de manhã.
Amor é a palavra chave para este sacrifício pessoal em prol dos outros, mas não chega. Como diz o povo, é preciso ter quem deite a mão. E mãos que não faltem porque há aqui toda uma ginástica que é preciso fazer. Depois da visita das duas profissionais do centro, Elvira conta com a filha, que almoça todos os dias em casa dos pais. Ajuda-a a pô-lo novamente na cama. Já à noite é a vez do filho ajudar, nomeadamente na muda da fralda. Para que tudo isto seja possível, envelhecer em casa já não tendo forma de tratar de si mesmo, a vida de algumas pessoas torna-se complicada. “Não há palavras. Eu olho para ele e lembro-me do que ele era e naquilo que se transformou.
É complicado ver as expressões de desgaste, olhar para ele e ver que não é aquilo que era”, contou Elvira Realista, que, além da vida, também teve que transformar a casa para que o marido não terminasse os dias num lar, nomeadamente comprar-lhe uma cama adapatada, com um colchão anti escaras, assim como fazer alterações na própria casa de banho, para que este também a pudesse usar. “Tenho muito amor e muito carinho por ele. É o pai dos meus filhos e tenho que o tratar o melhor possível”. É esta a grande motivação de Elvira Realista. No fim de contas, o que fica é sempre o amor.
“Vi que eles precisavam e não hesitei”
Judite Camelo, de 60 anos, também é um dos exemplos de altruísmo e de sacrifício. Deixou a vida em França, onde estava emigrada, para vir tomar conta dos pais para Alfândega da Fé. O pai tem 91 anos, é diabético e hipertenso, precisa que lhe administrem a insulina de manhã, que lhe dêem os comprimidos ao meio dia e que lhe meçam os diabetes à noite. Já a mãe, de 82 anos, não consegue fazer absolutamente nada, perdeu a noção de tudo. Desde vestir, a calçar, dar banho e de comer, precisa de tudo, como se de um bebé de colo se tratasse.
Além do amor, parece que, muitas vezes, é preciso ter como que cursos de medicina, de enfermagem, de nutrição e de uma série de outras coisas. Mas não. Claro que as noções de algumas coisas que não dominamos são necessárias quando se tem a vida de alguém nas mãos, mas o instinto, o carinho e a necessidade guiam quem cuida. “Eu via que a minha mãe era muito dinâmica e quando os meus dois irmãos mais novos morreram ela começou drasticamente a ir-se abaixo, a mudar. Na altura, o meu pai também começou a ficar doente. Eu ainda não estou reformada mas vi que eles precisavam de mim e não hesitei”, contou Judite Camelo, que também conta com o apoio da equipa de Alfândega da Fé. A mulher, que se assume como cozinheira, enfermeira, médica, amiga e filha, toma conta dos pais há três anos mas ficou e fica muito para trás. “Eu esqueci-me de mim. Vivo para eles. O meu marido pergunta-me, muitas vezes, pela Judite que conheceu e diz-me que também precisa de atenção, que lhe faça o pequeno almoço como faço ao meu pai. Eu só lhe digo que o faça ele que já é grande. Mas lá está, perdemos o foco no resto”, disse Judite Camelo.
Viver em casa, com qualidade
Jorge Falé também deixou a vida noutro sítio para voltar a Alfândega. Voltou para a terra há quatro anos, altura em que se reformou. A mãe já não conseguia tomar conta da tia e veio em seu auxilio. Hoje em dia é o cuidador da tia, de 97 anos. A mãe, entretanto, já morreu. “Tenho uma empregada das 8h30 às 17h30 mas a partir dessa hora e ao fim-de-semana tenho que estar com ela, não posso deixá- -la”, contou Jorge Falé, que, habitualmente, serve o jantar à idosa, faz-lhe companhia e deita-a.
A tia de Jorge Falé não anda mas não está acamada. Institucionalizá-la está fora de questão, até porque “tem uma cabeça espectacular”. “A minha tia quer acabar a vida em casa, de uma forma digna. Não quer dizer que as instituições os tratem mal, mas está provado que em casa conseguem viver mais tempo e com mais qualidade” assumiu o sobrinho da idosa, que vincou que, apesar do amor aos seus e do sacrifício, tudo isto lhe rouba tempo para outras coisas.
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