Por: Paula Freire
(colaboradora do Memórias...e outras coisas...)
Alfred Adler, o conhecido psicólogo austríaco, referia que as únicas pessoas normais são aquelas que não conhecemos bem. Porque a verdade é, muitas vezes, uma terrível arma de agressão…
A loucura causou-nos sempre enorme pavor. Parece-nos destruidora da nossa identidade. Por conseguinte, torna-se-nos urgente justificar essa loucura da qual sabemos não conseguir fugir, com a reinvenção de uma total e completa normalidade (e tantas vezes, paranormalidade) que em nós permaneça porto seguro. Porque será sempre mais fácil apontar a loucura dos outros do que ter coragem suficiente para ir ao encontro da nossa.
Recordo parte da letra de uma canção dos Fréro Delavega, extinto duo musical francófono: “Quando vêm as tristezas/ Os maus tempos/ Os medos tomam-me de novo/ E à distância eu ouço/ O canto das sereias” (“Quand viennent les peines/ Les mauvais temps/ Les peurs me reprennent/ Et au loin j'entends/ Le chant des sirènes”).
As sereias. A ilusão da beleza e do canto que enfeitiça os homens até que se percam no fundo… de si próprios. Diria eu que é tarefa de valentia para muito poucos, demorarmo-nos pelos espaços do tempo num toque imprevisto com o reflexo das trevas que nos compõem. Há sempre, escondidas, figuras com quem preferimos não nos encontrar. Lugares de escuridão súbita onde habitam os fantasmas que nos conhecem por dentro.
Viver numa realidade de luz construída por nós mesmos, à nossa medida, que se nos encaixa como um perfume perfeito, é inebriante. É bonito. Faz-nos socialmente elegantes e poderosos. E exigirá com toda a certeza um dispêndio de energias muito inferior, quando comparado com o esforço hercúleo necessário para ficar cara a cara com os demónios que vemos com um rosto igualzinho ao nosso, quando ao espelho nos descobrimos pelo avesso desses sentidos que julgamos como sendo os mais nobres e corretos.
Parece que nos basta o alarido dos sentimentos vazios com que tantas vezes nos vamos vestindo. E nele resistimos de olhos fechados. Até quando?
Queremos viver à boleia de uma utópica saúde mental que esconda o nosso verdadeiro ‘eu’ e nos permita fugir do caos interior em que diariamente nos rebolamos quase até à exaustão. Questiono-me se não será esse o caminho exatamente oposto àquele que deveríamos seguir. É que, enquanto nos inventamos nesse mar de distâncias que nos consolam, mais visível me parece que nos vamos afogando nas ondas da vida, como os marinheiros que seguiam o canto das sereias. Paradoxalmente, crentes de nos encontrarmos inseridos, em pleno, nesta realidade que, aos quatro ventos, pregamos como irreal.
Mais um outono avança por nós e enquanto nos afundamos nas areias movediças a virar as folhas para enganar o tempo, será sempre mais suportável rasgar as páginas do nosso próprio livro e acreditar que, passado o inverno, novos tempos surgirão debruçados sobre uma primavera de cor que nos iluda os infortúnios.
Em prol de uma verdadeira saúde mental e de um efetivo sentido de humanidade, para quando terão as sombras hora marcada na nossa agenda demasiado distraída?
A loucura causou-nos sempre enorme pavor. Parece-nos destruidora da nossa identidade. Por conseguinte, torna-se-nos urgente justificar essa loucura da qual sabemos não conseguir fugir, com a reinvenção de uma total e completa normalidade (e tantas vezes, paranormalidade) que em nós permaneça porto seguro. Porque será sempre mais fácil apontar a loucura dos outros do que ter coragem suficiente para ir ao encontro da nossa.
Recordo parte da letra de uma canção dos Fréro Delavega, extinto duo musical francófono: “Quando vêm as tristezas/ Os maus tempos/ Os medos tomam-me de novo/ E à distância eu ouço/ O canto das sereias” (“Quand viennent les peines/ Les mauvais temps/ Les peurs me reprennent/ Et au loin j'entends/ Le chant des sirènes”).
As sereias. A ilusão da beleza e do canto que enfeitiça os homens até que se percam no fundo… de si próprios. Diria eu que é tarefa de valentia para muito poucos, demorarmo-nos pelos espaços do tempo num toque imprevisto com o reflexo das trevas que nos compõem. Há sempre, escondidas, figuras com quem preferimos não nos encontrar. Lugares de escuridão súbita onde habitam os fantasmas que nos conhecem por dentro.
Viver numa realidade de luz construída por nós mesmos, à nossa medida, que se nos encaixa como um perfume perfeito, é inebriante. É bonito. Faz-nos socialmente elegantes e poderosos. E exigirá com toda a certeza um dispêndio de energias muito inferior, quando comparado com o esforço hercúleo necessário para ficar cara a cara com os demónios que vemos com um rosto igualzinho ao nosso, quando ao espelho nos descobrimos pelo avesso desses sentidos que julgamos como sendo os mais nobres e corretos.
Parece que nos basta o alarido dos sentimentos vazios com que tantas vezes nos vamos vestindo. E nele resistimos de olhos fechados. Até quando?
Queremos viver à boleia de uma utópica saúde mental que esconda o nosso verdadeiro ‘eu’ e nos permita fugir do caos interior em que diariamente nos rebolamos quase até à exaustão. Questiono-me se não será esse o caminho exatamente oposto àquele que deveríamos seguir. É que, enquanto nos inventamos nesse mar de distâncias que nos consolam, mais visível me parece que nos vamos afogando nas ondas da vida, como os marinheiros que seguiam o canto das sereias. Paradoxalmente, crentes de nos encontrarmos inseridos, em pleno, nesta realidade que, aos quatro ventos, pregamos como irreal.
Mais um outono avança por nós e enquanto nos afundamos nas areias movediças a virar as folhas para enganar o tempo, será sempre mais suportável rasgar as páginas do nosso próprio livro e acreditar que, passado o inverno, novos tempos surgirão debruçados sobre uma primavera de cor que nos iluda os infortúnios.
Em prol de uma verdadeira saúde mental e de um efetivo sentido de humanidade, para quando terão as sombras hora marcada na nossa agenda demasiado distraída?
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