Nos primeiros 15 dias de Março foram permitidas acções de correcção de densidade, com um posto fixo com o máximo de 10 caçadores e acompanhados com até 20 cães, uma espécie de mini- -montarias. São também autorizadas as esperas até final de Junho. As zonas de caça têm de pedir autorização ao ICNF para estas acções e ficam habilitados a “credenciar caçadores para procederem à realização de esperas diurnas ou nocturnas ao javali, dentro ou fora do período de lua cheia, podendo ser utilizadas fontes artificiais de iluminação sempre que se justifique”. “Isto é o que anteriormente eram considerados actos ilícitos”, sublinha Agostinho Beça, caçador e membro do Conselho Cinegético Municipal da Câmara Municipal de Mirandela.
As esperas aos javalis eram já uma modalidade de caça permitida, mas apenas no período nocturno e em cerca de 10 dias da lua cheia. Agostinho Beça explica que “oficialmente está permitido, segundo o edital que, teoricamente, um caçador possa estar numa acção de correcção de densidade, com arma, 24 horas por dia”. Para o caçador e técnico desta matéria “isto gera problemas bastante sério em zonas onde há praticantes de outras actividades ao ar livre, como praticantes de percursos pedestres, de trail, btt, desportos motorizados”.
No tempo de caça e com acções de correcção normais, apenas durante a noite e no período de lua cheia, “tudo estaria mais ou menos controlado”, mas “imaginar que no campo podem estar caçadores a qualquer hora do dia é algo desconfortável”. “Eu próprio na apanha de espargos no campo, há dias, não me senti muito tranquilo porque ouvi tiros, em Março já não se devia caçar”, afirma. “Qualquer caçador consciente, que olha para o recurso natural renovável que é a caça de forma racional e sustentada, condena o teor deste edital. Muitas entidades gestoras de zona de caça nem sequer o consideram”, acrescenta. António Neves é caçador e explora uma zona de caça turística e na última época de caça não organizou nenhuma montaria. Considera que “não faz sentido este edital, permitindo que se cace todos os dias até 30 de Junho, uma vez que já havia forma de controlar a espécie, os períodos de lua e correcções de densidade quando necessário”, até porque “de certa forma pôs os caçadores uns contra os outros”. António Neves admite que possa “haver um aumento exponencial de javalis como não houve montarias”, mas entende que isso só será visível depois desta época de reprodução.
Para Agostinho Beça o edital “devia ser simplesmente revogado” e as esperas ao javali seriam só nocturnas e apenas em noites de lua cheia. No conselho cinegético municipal de Mirandela este tema já foi debatido e mesmo no concelho municipal de segurança. “É uma coisa que nos preocupa do ponto de vista da ética e da segurança dos cidadãos e até de caçadores”, afirma. Está a ser preparado um documento por este conselho cinegético para transmitir as preocupações ao ICNF. Os caçadores acreditam também que estas actividades venatórias perturbam a fauna cinegética, já que estamos em época de nidificação e os próprios animais como os javalis estão em períodos de gestação.
Para Nelson Cadavez, do Clube de Monteiros do Norte “a situação actual que vivemos, devido à pandemia, deixa muito claro e de forma definitiva a importância que a caça tem para a regulação quer dos ecossistemas quer dos equilíbrios populacionais”, já que em resultado de “uma menor pressão venatória sobre esta espécie, há muito mais animais do que deveria haver, com um impacto prejudicial desde logo na agricultura e potenciando acidentes de viação”.
Quanto ao processo de caça correctiva possibilitado pelo ICNF, considera que “tem limitações, que não tornam nem prática nem segura esta opção, se for massificada”. Apesar de várias tentativas, não foi possível obter declarações do ICNF.
Pandemia condiciona caça
O Clube de Monteiros do Norte recomenda à comunidade de caçadores que privilegiem as esperas nocturnas aos javalis por ser um “processo de caça individual, seguro, efectivo e selectivo”. Na última época de caça ao javali entre Outubro e Fevereiro, quase não houve montarias, até porque houve grandes incertezas e dúvidas sobre se era possível realizar actividades de caça e cumprir as determinações dos estados de emergência.
As montarias não foram em si proibidas, no entanto, a interdição de circulação entre concelhos, o dever geral de recolhimento e a proibição de aglomerações condicionaram e muitas vezes inviabilizaram a actividade. “Houve poucas e com um número de participantes muito reduzido”, sublinhou. Valter Cadavez é matilheiro e tem 54 cães em Valongo das Meadas, em Mirandela, e conta que este ano os animais quase não participaram em caçadas. “Não tivemos acções de caça para pôr a matilha a trabalhar. A actividade esteve muito condicionada e as organizações não arriscaram a realizar montarias para não levar pessoas de várias zonas do país para as aldeias, eu próprio como caçador também defendi a não realização de montarias”, afirmou.
Nas primeiras duas semanas de Março largou os cães oito vezes e na época de caça outras seis vezes, duas das quais em Espanha, quando num ano normal tem 25 a 30 montarias por época.
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