Por: Fernando Calado
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)
Pois a noite estava fria… as candeias estavam acesas pela alma do defunto e os vizinhos entre dois Terços… duas “espirradelas” e alguns bocejos… lá iam falando das virtudes ampliadas do finado… e quando já não havia mais nada para dizer, acrescentavam, apertando o xaile, ou a samarra: - pois está frio!... mas ontem estava mais!
E assim se passou a velada… já a tia Senhorinha tinha dito todas as jaculatórias pela alma deste nosso irmão… e todos já tinham saído. Então, o vizinho mais próximo do defunto, amigo de sempre, apertou mais a samarra, assoou o nariz a um lenço tabaqueiro e aproveitou, sem grande mágoa, nem cerimónias, para enviar um recado para o Além:
- Olha, se fores para o Céu… o que duvido! Se encontrares lá o meu sogro… o que duvido!… pergunta-lhe onde deixou a chave da adega e a pedra da gadanha!
Recado dado… deitou mais uma “espargidela” de água benta… benzeu-se desajeitado e foi-se deitar em paz… como quem já tinha ganho a noite.
Fernando Calado nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança.
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.
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