sexta-feira, 28 de maio de 2021

… quase poema… ou de um rio que é de ouro

Por: Fernando Calado
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)

Ontem fui ao Douro… mas não fui ver o Douro… pois o Douro não se vê com estes olhos rasos que Deus nos deu… só se vê com a alma… com o gosto na boca a vinho fino, com as mãos calejadas de afagar as cepas, com os longos dias de suor, lágrimas e sangue e sobretudo de querer e paixão. Não vi o Douro, pois o Douro é como uma mulher que só se vê com amor…quando se espera… pacientemente… e só com amor se vê vestir e despir. Só com amor se adivinha cada suspiro… se conhece cada sinal…cada gesto… cada curva no seu corpo lânguido. Por isso, não fui ver o Douro fui contigo ao Douro e fiquei contigo… na serenidade do estar perto do remanso onde as margens afagam as águas…e ficam.
Fui ao Douro ver-te… ao encontro da Terra Prometida depois de acompanhar Moisés…por 40 anos…longos…terras bravas… lutos muitos… e encontrei-te no abraço fraterno e finalmente a arca da aliança assentou em terra firme! 
O Povo todo…errante… veio ao Douro…cabelos longos de Judia…que confundiu o Douro pela força da raça e da beleza… e os teus olhos eram as estrelas de David!
Vim ao Douro entrar na tua casa… beber do teu vinho… comer do teu pão… dançar ao serão e ser feliz! Vim ao encontro da mãe, da Senhora de todas as mães… e ouvir-te cantar como quem chora… como quem reza… e deixar a alma por inteiro no afago da Régua que se oferecia como um poema ainda por dizer… no gemido duma guitarra.
Depois regressamos… sem pressa… como romeiros que cumpriram uma promessa antiga… 
Pelo caminho ainda encontramos à beira duma lágrima um Pequeno Príncipe que amorosamente murmurava no silêncio:
“O essencial é invisível aos olhos – repetiu o principezinho, para não esquecer.
- Foi o tempo que perdeste com tua rosa que a fez tão importante.
- Foi o tempo que eu perdi com a minha rosa… repetiu ele, para não esquecer. 
Os homens esqueceram essa verdade – disse ainda a raposa. Mas tu não deves esquecer. Tu te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas. Tu és responsável pela tua rosa…”
…esse é o nosso segredo! Cumpriu-se a promessa!


Fernando Calado
nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança. 
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.

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