Por: Fernando Calado
(colaborador do "Memórias...e outras coisas...")
Estou a envelhecer,,, já sinto mágoa do progresso. Ontem o caminho velho que ia da minha aldeia para o mundo estava perfeitamente inserido na paisagem… relicário de memórias. Hoje, uma mancha negra de alcatrão enluta o passado. Alegadamente, dizem, livraram-se das sobras de outras estradas e aqui temos a obra… o progresso. Felizmente ainda há homens magnânimos e generosos! Eu morro por dentro… de dia para dia falta-me o chão.
Os caminhos velhos povoaram o imaginário da nossa infância porque no vagar da chegada e da partida o tempo não contava e permitia o relato de acontecimentos inauditos que tinham lugar por esses caminhos de Cristo.
Os almocreves eram os negociantes de longo curso que viajavam em grupos e se encomendavam à boa sorte e à proteção dos Santos para que os livrassem do ardil matreiro das quadrilhas de ladrões que se escondiam, pela calada da noite, no enlace de incauto viajante.
Os machos carregados de tudo o que se podia comprar e vender ainda podiam com uma saca de palha que garantia ao previdente almocreve a dormida regalada em palheiro enxuto, ou no cabanal das muitas ermidas que alvejam nos cumes dos montes ermos.
Os caminhos tinham segredos da passagem dos imponentes exércitos romanos, de fadas e feiticeiras que se encontravam à meia-noite nas encruzilhadas sinistras, de pontes cheias de mistérios e poderes miraculosos que aconteciam em noites esplendorosas de lua cheia.
O pobre contador de contas bárbaras e de notícias que aconteciam nas terras longínquas de Mirandela ou de Murça fazia-se ao caminho carregado de andrajos e quando se perdia no vagar do tempo e no dobrar da última curva, o caminho ganhava a força do desconhecido conduzindo aquele mendigo de Deus a outros lugares cheios de magias e de coisas para contar.
Os caminhos velhos são o museu que nos legaram… Durante milhares de séculos, quando havia muitos viajantes o caminho resistiu… hoje que ninguém passa por essa via… modernizamos… destruímos as memórias.
… estou de luto!
Fernando Calado nasceu em 1951, em Milhão, Bragança. É licenciado em Filosofia pela Universidade do Porto e foi professor de Filosofia na Escola Secundária Abade de Baçal em Bragança. Curriculares do doutoramento na Universidade de Valladolid. Foi ainda professor na Escola Superior de Saúde de Bragança e no Instituto Jean Piaget de Macedo de Cavaleiros. Exerceu os cargos de Delegado dos Assuntos Consulares, Coordenador do Centro da Área Educativa e de Diretor do Centro de Formação Profissional do IEFP em Bragança.
Publicou com assiduidade artigos de opinião e literários em vários Jornais. Foi diretor da revista cultural e etnográfica “Amigos de Bragança”.
Número total de visualizações do Blogue
Pesquisar neste blogue
Aderir a este Blogue
Sobre o Blogue
SOBRE O BLOGUE:
Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço.
A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)
(Henrique Martins)
COLABORADORES LITERÁRIOS
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário