Número total de visualizações do Blogue

Pesquisar neste blogue

Aderir a este Blogue

Sobre o Blogue

SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

sábado, 16 de janeiro de 2021

Crônica do Tempo em que Havia Futebol de Várzea; ou meu Último Jogo na Várzea

Por: Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS
São Paulo (Brasil)
(colaborador do Memórias...e outras coisas) 

Quando eu tinha vinte anos de idade, jogava num time de várzea: o «Independente» do Jardim D´Abril. Na época esse era um time de «boleiros», ou seja, ali foi reunido alguns dos melhores do bairro do Jardim D´Abril (bairro de Osasco –SP-Brasil).

Modestamente, eu, ACAS, (então chamado de Carlinhos), envergava a camisa número nove. Certa feita, num domingo de manhã, nós fomos jogar contra o «Palmeiras» de Pirituba.

Ali, a cancha era limitada de fundo e de um lado (em L) por um córrego que servia como esgoto da comunidade. Na cabeceira do campo, onde estava também o «vestiário», era a entrada possível ao campo de jogo, uma vez que do outro lado existia um barranco íngreme e cheio de pedras, onde se postava a torcida do «Palmeirinha», como era chamado. Não percebi de início; a maioria dos torcedores que se postavam no tal barranco, portavam pedaços de paus (galhos de árvores, cabos de vassouras e afins, ... .).

Embora o campo de jogo não tivesse grama, um capim ralo e um tipo de cipó de finas folhas revestiam ao menos cinquenta por cento da cancha. Uma coisa era boa; o campo era plano, sem buracos, como aqueles que sempre jogávamos. Ali, a bola rolava sem mudar de trajetória: bom para o Independente, pensei eu; e assim pensaram também meus companheiros.

O jogo teve início. Eu dei a saída para o Hélio Preto, que da meia direita recuou para o João Tucano (que havia se casado no dia anterior), este levantou a cabeça e lançou o Zé Carlos (o craque do time), por cima da zaga palmeirense e que, de chaleira, tocou por cima do goleiro: um a zero para o Independente!

Em quatro toques, fizemos um gol. Isso nos motivou e despertou a torcida e o time palmeirense, que passou a meter o pé, ao mesmo tempo em que a torcida, brandindo os paus, ameaçava o juiz da partida.

Dada nova saída, o Cabo Paulinho roubou a bola do adversário e, de canhota enfiou uma bola adocicada entre os dois beques. Eu entrei; saí do goleiro e toquei para a meta vazia: 2x0!

Nova saída: o Chicão cortou o passe do Palmeiras e tocou para o João Tucano, que de voleio meteu no barbante (3x0). Nem é preciso dizer que a torcida invadiu o campo e (praxe na várzea), fizeram a troca do juiz; por um de confiança do Palmeiras!

A partir daí, o Palmeiras começou a dar mais pontapés! E com o beneplácito do juiz da casa. E eles seguraram o placar por, pelo menos, dez minutos. Mesmo assim, o Zé Carlos tentou, e fez; do meio do campo, um gol por cobertura (4x0).

Tão logo deram a saída, nossa zaga roubou a bola e tocou na ponta direita para o Pedrinho, que chutou lá do canto da área grande e acertou o ângulo (5x0).

Nova saída e o Osvaldinho tomou a bola do Palmeiras e foi derrubado covardemente, por trás. Houve um movimento do Independente para agredir o faltoso, porém, com a torcida adversária invadindo o campo, deixamos pra lá! O juiz, covarde, ainda marcou falta para o Palmeiras, onde um truculento beque disparou um canhão; felizmente a bola passou por cima da trave do gol defendida pelo Matheus.

Na saída da bola, o Matheus lançou a bola para o Madalena, quarto beque, que driblou três jogadores adversários ao mesmo tempo e lançou na área: eu fui na bola, mas recebi um safanão nos ombros e senti um murro nas costelas: enquanto fiquei caído, tentando respirar, a bola sobrou para o Coronel, que desferiu um portentoso chute de canhota, que por pouco não joga, inclusive o goleiro, para o fundo das redes.(6x0).

Já eram passados cerca de trinta minutos de jogo e eu mal conseguia respirar: me passaram a bola, mas eu não conseguia correr. Dominei o balão e enquanto gemia de dores, dois adversários chegaram com força exagerada sobre mim: apliquei-lhes uma jogada que eu criei e batizei como «banho de cuia». Com a bola no chão, curvei o pé direito e a lancei para o alto, enquanto os dois passaram feitos touros numa tourada.

Um dos dois que receberam o “chapéu” pulou com os dois pés nas minhas costas, o outro, não satisfeito com minha contorção no chão deu-me um chute na clavícula. Nesse instante, o pior aconteceu: meu time fugiu do campo ao mesmo tempo em que a torcida, pedaços de paus em punho, batiam-me ali mesmo no chão!

Eu me levantei com muito custo e defendia com os braços às dezenas de pauladas que levava. Nesse instante o Osvaldinho pulou no meio da grei enfurecida e, nós, de costas um para o outro, enfrentamos aquele dilúvio de impropérios e pauladas; mais os chutes.

Vi então, num relance, que o Pedrinho já havia apanhado nossas roupas no vestiário e se dirigia ao pequeno caminhão de aluguel que nos levava nos eventos de jogos pela várzea de São Paulo. Eu e o Osvaldinho éramos os únicos do Independente que ainda estavam no campo, todos os outros já estavam em cima do caminhão, cerca de trezentos metros distantes do campo de jogo.

Apanhei como um cachorro; o Osvaldinho também. Jamais esqueci a coragem e a solidariedade do Osvaldinho. Isso ocorreu há quarenta e nove anos (N.A.: mais oito = 57, se considerarmos este ano pandêmico de 2021); até hoje não esqueço a bravura do Osvaldinho, nem o último jogo que fiz na várzea de São Paulo.

Foi então que abandonei o futebol; certo que um curso de desenho mecânico seria muito melhor para mim, mesmo que tivesse que ficar em casa aos domingos, para executar trabalhos do curso de desenhista.

Devo informar aos leitores que eu e o Osvaldinho só paramos de apanhar, quando o presidente do Palmeiras entrou no campo e se colocou entre nós dois e os agressores, pedindo pelo amor de Deus que parassem com aquilo, pois se o Independente fizesse uma reclamação na Liga Amadora de Futebol de Osasco, eles nunca mais poderiam marcar jogos naquele campo.

Infelizmente comecei a falar do futebol de várzea a partir do meu último jogo. Mas ainda tenho algumas histórias, mais alegres, sobre o futebol de várzea para contar aos leitores, inclusive tenho algumas fotos da época.

Esta é apenas uma de minhas lembranças do futebol da várzea; que se acabou em São Paulo. (SIC) !!!!!!!

Foto: Campo de futebol de várzea em São Paulo -Brasil. Eram 1000 em 1970, restam 20

Antônio Carlos Affonso dos Santos – ACAS. É natural de Cravinhos-SP. É Físico, poeta e contista. Tem textos publicados em 8 livros, sendo 4 “solos e entre eles, o Pequeno Dicionário de Caipirês e o livro infantil “A Sementinha” além de quatro outros publicados em antologias junto a outros escritores.

Sem comentários:

Enviar um comentário