Não se pode ser escravo do conservadorismo e mediocridade dos outros. Mas é precisamente isso que se está a passar há doze anos no vale e na Linha do Tua.
Ponto prévio: já passa da hora de se largarem chavões parvos. Chamar a Linha do Tua de “antiga” faz menos sentido que chamar o Mosteiro dos Jerónimos de “antigo”: é anterior à Linha do Tua, e já não tem as funções de mosteiro. Carimbar à força de anacrónico o que só o tem sido por desleixo do Estado é algo que não consigo de todo aceitar.
A aplicação do infame Plano de Mobilidade do Vale do Tua demora tanto que quando for concluída já nem a messiânica barragem do Tua será propriedade da EDP, incluída que está no lote de barragens vendidas recentemente – a “Mãe de todas as Barragens” incluída, dizendo muito do “Interesse do Estado” com que foram impostas. Que fique claro o absurdo da sua situação actual: o processo legal de construção desta barragem, que veio destruir parte da Linha do Tua por argumentos sobejamente falaciosos, já foi concluído em 2009. Desde então todas as entidades envolvidas, da EDP aos Governos e autarcas locais, sabem que o troço Brunheda – Cachão, com exploração ferroviária suspensa desde Agosto de 2008 devido a um acidente mas a jusante deste, não seria inundado pela albufeira.
Contudo, chegámos a 2016, e a exploração deste Plano – já então com 7 anos de atraso – foi entregue à Douro Azul, e entrámos num novo capítulo da História Trágico-Ferroviária da Linha do Tua. Em poucas semanas avançaram-se com obras de recuperação no troço Brunheda – Cachão, que o agora ultra zeloso Estado deixou chegar ao ponto de se roubarem dezenas de metros de carris e centenas invadidos por mato. Desde então, o mesmo Estado que lavara as mãos da quase mais elementar conservação da via e estações, tem vindo a exigir, aos bochechos, obras atrás de obras, inspecções atrás de inspecções. Cinco anos depois, vinte milhões de euros depois, várias intervenções e obras depois, vários adiamentos da reabertura da Linha do Tua depois, e ainda falta mais uma enésima inspecção depois das enésimas intervenções, não sendo claro se a via sequer ficou preparada para voltar à sua velocidade máxima de projecto – a da sua construção no século XIX – de 50 km/h, a qual desde a década de 1980 baixou para 45 km/h ou menos. E a discussão sobre a utilização da albufeira só agora vai arrancar também…
Mas não fica por aí. As automotoras do Metro de Mirandela ainda nem sequer foram intervencionadas para voltar a um serviço que prestam à região desde 1995, e interrompido desde Dezembro de 2018, precisamente para se terminarem as obras na via. E ainda está em discussão a construção de novas oficinais de manutenção de material circulante, quando estas já existem em Carvalhais desde 1995, a apenas 4 km de Mirandela, num troço de carácter urbano que querem encerrar para transformar em ecopista. Doze anos, caros concidadãos. Doze anos para o Plano de Mobilidade continuar parado, cheio de pontos de interrogação, e intervenções por terminar. O termo “Portugueses de Segunda” não poderia ser melhor materializado, no que ao Nordeste Trasmontano diz respeito, através desta barafunda sem fim, justificada por uma burocracia absurda e um empurrar e protelar de responsabilidades infindável. Vergonhoso, é dizer muito pouco disto tudo.
Sem comentários:
Enviar um comentário