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SOBRE O BLOGUE: Bragança, o seu Distrito e o Nordeste Transmontano são o mote para este espaço. A Bragança dos nossos Pais, a Nossa Bragança, a dos Nossos Filhos e a dos Nossos Netos..., a Nossa Memória, as Nossas Tertúlias, as Nossas Brincadeiras, os Nossos Anseios, os Nossos Sonhos, as Nossas Realidades... As Saudades aumentam com o passar do tempo e o que não é partilhado, morre só... Traz Outro Amigo Também...
(Henrique Martins)

COLABORADORES LITERÁRIOS

COLABORADORES LITERÁRIOS
COLABORADORES LITERÁRIOS: Paula Freire, Amaro Mendonça, António Carlos Santos, António Torrão, Fernando Calado, Conceição Marques, Humberto Silva, Silvino Potêncio, António Orlando dos Santos, José Mário Leite. Maria dos Reis Gomes, Manuel Eduardo Pires, António Pires, Luís Abel Carvalho, Carlos Pires, Ernesto Rodrigues, César Urbino Rodrigues e João Cameira.
N.B. As opiniões expressas nos artigos de opinião dos Colaboradores do Blogue, apenas vinculam os respetivos autores.

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

Uma Cadeira Vazia!

Por: José Mário Leite
(colaborador do Memórias...e outras coisas...)

No passado dia 25 deste mês de outubro, no auditório da Sociedade Portuguesa de Autores foram apresentados publicamente os vencedores dos prémios PEN relativos às obras publicadas no ano de 2021.
Junto à mesa de presidência da cerimónia estava, como habitualmente, uma cadeira vazia, simbologia que o PEN instituiu e mantém para homenagear os escritores que, por esse mundo fora, são vítimas de discriminação, coacção, repressão e outros abusos intoleráveis que lhes são infligidos pelo facto singelo e humano de, sendo escritores, escreverem de forma livre e responsável. Neste ano de 2022, o homenageado foi Salman Rushdie, cuja fotografia foi colocada em lugar de destaque.
Curiosamente, por uma qualquer coincidência (in)explicável, na parede em frente ao escritor britânico de origem indiana, estava, integrada numa exposição fotográfica sobre a guerra na Ucrânia, uma das imagens retratava a retirada, por vários populares, de um de Cristo pregado na cruz. A porta por onde saía a ser retirada a escultura era de uma igreja atingida pelas bombas russas que, segundo relatos recentes, teriam a bênção do chefe máximo da Igreja Ortodoxa. Em nome de Deus (há quem lhe chame “guerra santa”) uns bombardeiam os lugares de culto desse mesmo Deus e outros, desafiando os supostos desígnios divinos, arriscam a vida para salvarem, dos escombros desses lugares a imagem venerada desse Deus, em nome de quem são bombardeados, feridos, mortos, destroçados e irremediavelmente perturbados para o resto da sua vida. Que mundo louco e de difícil entendimento.
Fui assaltado, instintiva e imediatamente, por uma imagem que me impressionou muito, numa pequena igreja, dedicada a S. Bonifácio e a Santo Anselmo, em Cogne, no cimo do Vale de Aosta, em Itália. Nas traseiras do templo, dando expressão à arte tradicional daquelas paragens, uma árvore foi esculpida, mantendo-lhe o perfil e contorno, e apresenta uma imagem humana, com uma expressão angustiada, saltando de um tronco direito cravado numa base de pedra. Será Cristo a abandonar a Cruz?
E, como os pensamentos são como as cerejas, a propósito das esculturas feitas em madeira, num único tronco, como se existissem lá, desde sempre e o artista se “limitasse” a libertar os excessos de lenho que lhes impediam de tomar forma e que abundam por todas as praças dos povoados sendo magnífico o gigantesco e secular toro de castanheiro de onde surgiram seis divertidos tocadores de acordeão, numa praça central de Aosta, lembrei-me, igualmente de seis pinheiros bravos na base das montanhas geladas do vale. São seis árvores nascidas e desenvolvidas a partir do mesmo tronco comum. Um pinheiro original foi cortado rente ao solo, na beira de um regato. Do seu toro nasceram meia dúzia de rebentos que, de forma autónoma cresceram e desenvolveram. A partir dos vinte centímetros acima do solo, são seis árvores independentes que, precisamente por estarem muito próximas, se “digladiam” e lutam entre si, competindo por espaço e luz solar, entrelaçando ramos, “importunando” os próximos e combatendo o desenvolvimento de cada um dos restantes. É a lei da selva. Neste caso, da floresta. É assim com todas as outras árvores, ao redor, que lhe calhou, por sorte, terem de partilhar o espaço com as suas congéneres. Porém estas, seja qual for o resultado da sua luta pela existência autónoma… partilham a mesma raiz. A seiva que os alimenta é. Em primeiro lugar, comum e igualmente preciosa para todos que, em comum terão de. Em primeiro lugar preservar porque, de nada lhes valerá serem bem sucedidos no espaço aéreo se a raiz lhes faltar.
Mero acaso, curiosidade apenas ou, porque não?, alegoria vegetal para lembrar a necessária boa convivência de todos os seres vivos, sobretudo os da mesma espécie.

José Mário Leite
, Nasceu na Junqueira da Vilariça, Torre de Moncorvo, estudou em Bragança e no Porto e casou em Brunhoso, Mogadouro.
Colaborador regular de jornais e revistas do nordeste, (Voz do Nordeste, Mensageiro de Bragança, MAS, Nordeste e CEPIHS) publicou Cravo na Boca (Teatro), Pedra Flor (Poesia) e A Morte de Germano Trancoso (Romance), Canto d'Encantos (Contos) tendo sido coautor nas seguintes antologias; Terra de Duas Línguas I e II; 40 Poetas Transmontanos de Hoje; Liderança, Desenvolvimento Empresarial; Gestão de Talentos (a editar brevemente).
Foi Administrador Delegado da Associação de Municípios da Terra Quente Transmontana, vereador na Câmara e Presidente da Assembleia Municipal de Torre de Moncorvo.
Foi vice-presidente da Academia de Letras de Trás-os-Montes.
É Diretor-Adjunto na Fundação Calouste Gulbenkian, Gestor de Ciência e Consultor do Conselho de Administração na Fundação Champalimaud.
É membro da Direção do PEN Clube Português.

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